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É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais. Escreve uma vez por semana.

Opinião | Democracia versus autocracia

Um novo mundo emerge da guerra na Ucrânia e ele não sorri para Vladimir Putin

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"Há semanas em que nada acontece; e há semanas em que décadas acontecem". O presidente Vladimir Putin culpou o autor dessa frase, o líder revolucionário Vladimir Lenin, pela inclusão de territórios russos à então república soviética da Ucrânia, em seu furioso discurso para justificar a invasão. Uma semana depois, Putin vivencia o sentido profundo dessa frase: um mundo novo emerge da guerra, e ele não sorri para o autocrata russo.

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As sanções econômicas, a fuga de empresas dos negócios com os russos, as restrições por parte das redes sociais e as retaliações contra elas adotadas pelo Kremlin, o rompimento do mundo das artes e dos esportes representam um isolamento abrupto e brutal da Rússia.

Diferentemente da China, que censura sistematicamente a internet, a Rússia tinha um ecossistema digital livre. O controle estava concentrado nos meios de comunicação, nos quais, aliás, o cerco se fechou para os poucos que restavam com relativa independência.

O presidente russo, Vladimir Putin, participa de exercício em simulador de voo após defender invasão da Ucrânia em reunião com aviadoras Foto: Sputnik/Kremlin Pool Photo via AP

Alguns analistas diziam que as sanções financeiras teriam um impacto limitado, porque Rússia e China vêm há anos se esforçando para fechar suas transações externas no câmbio local, reduzindo assim a dependência do dólar e do euro, as duas grandes moedas globais conversíveis. 

A decisão de dois dos maiores bancos estatais chineses, o Banco Industrial & Comercial da China e o Banco da China, de restringir suas operações com a Rússia, mostra o quanto esse movimento está longe de se completar. A China depende do mercado europeu, muito maior do que o russo, e do acesso ao sistema financeiro internacional denominado em dólares.

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O isolamento econômico ocorre em paralelo com o endurecimento político. Duas novas leis punem, com até 20 anos de prisão, os russos acusados de “apoiar o inimigo”, e até 15 anos, os que espalhem “informações falsas sobre as Forças Armadas”. Putin controla o Judiciário e essas leis bastam para castigar duramente críticas ou protestos contra a carnificina de ucranianos e russos. 

O presidente russo não gosta de ser visto burlando as leis. Ele muda as leis para fazer o que quer. Como tem, por lei, o poder de veto sobre as candidaturas, domina as duas Casas do Parlamento.

Putin imaginou uma resposta muito mais tímida do Ocidente. Antes de invadir, reduziu o fornecimento de gás, para pressionar a inflação pós-pandemia. Os EUA têm eleição em novembro e a França, no mês que vem. Esperou a conclusão do gasoduto Nord Stream 2, que liga a Rússia e a Alemanha, e custou US$ 11 bilhões. O Reino Unido saiu da União Europeia e o primeiro-ministro Boris Johnson balançava no cargo. 

Entretanto, a invasão da Ucrânia deu novo significado à existência da Otan e à percepção de que a democracia trava uma luta existencial contra a autocracia.

* É COLUNISTA DO ‘ESTADÃO’ E ANALISTA DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS

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Opinião por Lourival Sant'Anna

É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais

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