Oito dias depois do início do processo de legalização de imigrantes em Portugal, somente 276 dos 20 mil brasileiros que vivem no país regularizaram sua situação. Pela nova lei, para obter autorização para trabalhar em Portugal, o estrangeiro deve apresentar passaporte, não pode ter antecedentes criminais nem ter sido rejeitado por qualquer país do sistema europeu e ter contrato de trabalho. E é aí que começam os problemas. A maioria dos brasileiros trabalha clandestinamente ou como autônomo. A nacionalidade com maior número de pessoas com direito de permanecer em Portugal foi a brasileira. "A partir de segunda-feira, vamos simplificar a vida dos brasileiros", afirma Inácio Mota da Silva, o responsável pela Inspeção Geral do Trabalho. "Eles não precisam apresentar o contrato de trabalho, basta que o empregador informe que a pessoa é contratada." O que, na prática, dá na mesma. Mais despesas Os patrões não assinam contrato porque suas despesas com sistema de seguridade e imposto de renda aumentam entre 35% e 40%. "Além disso, por lei, o empregador fica obrigado a pagar aos brasileiros os mesmos salários que aos portugueses. "Existem pisos salariais por categoria profissional", conta Maria da Graça Lavor, advogada da Casa do Brasil, uma associação de brasileiros em Portugal. A nova lei, que foi publicada no dia 29, é a mais liberal da Europa. Segundo o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, até terça-feira das 976 pessoas que tinham recebido a autorização de trabalho em Portugal, 276 eram brasileiras. A autorização é válida por um ano, ao fim do qual é necessário comprovar que está trabalhando. Depois de cinco anos, é possível obter autorização de residência. As associações de imigrantes calculam que o número de clandestinos no país chegue a 100 mil, entre as quais 20 mil brasileiros. Há também um grande número de imigrantes da Europa Oriental - ucranianos, moldavos e russos -, a maior parte sob o controle de máfias, que ficam com seus documentos. Os portugueses pretendem legalizar todos. "Até agora só houve um caso rejeitado, porque a pessoa estava na lista de pessoas rejeitadas por outros países europeus", contou Manuel Jamela Paulus, diretor-adjunto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Ao contrário de Portugal, outros países europeus estão dificultando a entrada de imigrantes. Segundo Silva, dos cerca de 5 mil contratos de trabalho já aprovados, 789 são de brasileiros. O primeiro passo para a legalização é dar uma cópia do contrato para a Inspeção Geral de Trabalho, que verifica se a empresa existe, se contribui para a seguridade social e se pode contratar pessoas na função prevista no contrato. Para facilitar, toda a burocracia foi unificada. Nos postos da legalização há representantes da Inspeção Geral do Trabalho, da Segurança Social e do Serviço de Estrangeiros. "O objetivo é que as pessoas possam regularizar sua situação em menos de meio dia", diz Paulus. Restrições Passada essa fase de legalização de quem já está em Portugal, as facilidades deverão acabar. "A lei prevê que só poderão vir para Portugal profissionais de setores que realmente precisem", explica Silva. Para garantir que não haja trabalhadores clandestinos, quando diminuírem as filas da legalização o Serviços de Estrangeiros e a Inspeção do Trabalho vão começar a fiscalizar os locais de trabalho. "A multa é pesada. Pode ir até os US$ 20 mil", conta Graça. Para driblar a dificuldade de conseguir contrato, muitas vezes só um dos membros do casal pede a legalização, enquanto o outro permanece no país graças à lei que garante o reagrupamento familiar. "Meu marido trabalha como eletricista em construção e não tem contrato", conta Nykllayny Franklin, de 22 anos, que estava com seu contrato de trabalho na fila para obter os papéis. Nykllayny trocou Central de Minas por Lisboa há oito meses e pretende ficar no país. "O Brasil agora é só para férias." Também na fila, o ex-produtor artístico Givanildo Alves, de Pernambuco, largou tudo há dois anos e começou uma nova carreira. "Cheguei a fazer a produção da Sinfônica de Berlim e da Hebe Camargo em Recife", conta. Em Lisboa, Gil Alves trabalha na área de segurança de bagagens do aeroporto. De acordo com ele, Portugal é bem diferente do que imaginam os brasileiros. "Aqui não tem moleza. Muitos brasileiros são explorados em termos de horário de trabalho e salários." Para alguns brasileiros, a vida em Portugal é a oportunidade de mudar de estatuto social. "Quero ver se estudo aqui", conta o paranaense Jailton Francisco dos Santos, de Assaí, que está trabalhando num McDonald´s. No Brasil, Jaílton, de 22 anos, trabalhava num mercado.
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