Na Cisjordânia, Biden cobra responsabilização por morte de jornalista e anuncia auxílios à Palestina

Presidente encerrou viagem por Israel em encontro com o líder da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, e disse apoiar um plano de paz com a independência palestina, mas que não há condições para isso no momento

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Por Steve Hendrix

THE WASHINGTON POST, JERUSALEM — O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, dedicou as últimas horas de sua viagem oficial a Israel para restaurar os laços com os palestinos - interrompidos durante o governo Donald Trump - ao visitar um hospital em Jerusalém Oriental e cruzar um posto de controle militar israelense para se encontrar com o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, em Belém, nesta sexta-feira, 15.

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Biden pediu uma responsabilização total pelo assassinato da jornalista palestino-americana Shireen Abu Akleh, morta em maio durante uma operação israelense na Cisjordânia, na primeira vez que ele mencionou publicamente o incidente durante a visita.

Os dois eventos de Biden não produziram nenhum progresso em direção à renovação das negociações do processo de paz israelense-palestino, mas a Casa Branca anunciou uma série de medidas destinadas a melhorar a situação em um momento “em que os palestinos estão sofrendo”, como disse Biden após seu encontro com Abbas.

O presidente americano, Joe Biden, e o líder da autoridade palestina, Mahmoud Abbas, encontraram-se em Belém nesta sexta-feira, 15. Foto: Thaer Granaim/ AFP

Biden afirmou seu apoio a um acordo de paz que acabaria com a ocupação israelense e criaria uma Palestina independente, mas também deixou claro que não existem condições para o progresso em direção a esses objetivos no momento. Certa vez, ele indicou sua intenção de reabrir o consulado dos EUA em Jerusalém Oriental, mas até agora não o fez diante das objeções israelenses.

O governo aprovou um novo pacote de ajuda aos palestinos de US$ 316 milhões (R$ 1,713 bilhão), incluindo US$ 100 milhões (R$ 542 milhões) para uma rede hospitalar que atende pacientes na Cisjordânia e em Gaza. Outros US$ 200 milhões (R$ 1,084 bilhão) irão para a agência das Nações Unidas que apoia refugiados palestinos, financiamento que foi amplamente eliminado no governo Trump. Biden, que prometeu renovar o apoio aos palestinos, começou a restaurar a contribuição de Washington logo após assumir o cargo.

O governo também anunciou US$ 15 milhões (R$ 81 milhões) em ajuda emergencial para auxiliar os territórios durante a escassez de grãos causada pela invasão russa da Ucrânia, bem como uma iniciativa para acelerar a implantação da tecnologia 4G na Cisjordânia e em Gaza. A Casa Branca disse que está pressionando Israel a aliviar as restrições de viagem aos palestinos, simplificando a travessia entre a Cisjordânia e a Jordânia.

“É uma honra ver em primeira mão a qualidade do atendimento que vocês prestam ao povo palestino”, disse Biden após visitar o Hospital Augusta Victoria, o principal centro de atendimento avançado disponível para residentes de Jerusalém Oriental, Cisjordânia e Gaza - a maioria dos quais precisam de permissão israelense para viajar até lá.

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“Palestinos e israelenses merecem medidas iguais de liberdade, segurança, prosperidade e dignidade”, disse o presidente, anunciando o novo financiamento ao hospital. “E o acesso aos cuidados de saúde, quando você precisa, é essencial para levar uma vida digna.”

Biden viajou para Jerusalém Oriental sem nenhuma autoridade israelense para acompanhá-lo, levando alguns políticos de direita a reclamar que o presidente estava minando a soberania de Israel sobre toda a cidade, incluindo seus bairros palestinos. Biden, que se recusou a reverter a mudança de Trump da embaixada dos EUA para Jerusalém, disse que sua viagem ao hospital não sinalizou uma mudança na política.

Manifestantes carregam cartaz contra assentamentos israelenses na Cisjordânia durante passagem de Joe Biden pela Oriente Médio. Foto: Abbas Momani/ AFP

As reuniões do presidente com os palestinos seguem dois dias de calorosos abraços de autoridades israelenses, durante os quais Biden deixou claro seu apoio ao Estado judeu e reivindicou o rótulo de “sionista”.

Sua recepção do outro lado do muro de segurança foi menos entusiasmada, refletindo a decepção por Biden não ter feito mais para pressionar Israel a retomar as negociações de paz e melhorar seu tratamento aos palestinos sob ocupação.

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Alguns manifestantes em Ramallah ergueram cartazes “Biden, volte para casa” durante uma manifestação na quinta-feira, 14. Um grupo de defesa israelense, B’Tselem, montou outdoors perto do muro de separação de quase 8 metros de altura em Belém, que dizia “Sr. presidente, isso é apartheid”, uma caracterização que Biden rejeitou.

Em Israel, o presidente condenou uma série de ataques terroristas que mataram 15 pessoas na primavera passada, mas ele não mencionou publicamente dois palestinos americanos que morreram durante encontros com militares israelenses na Cisjordânia nos últimos meses: um homem idoso, que morreu após ser deixado no frio em um bloqueio na estrada, e Shireen Abu Akleh, a jornalista da Al Jazeera baleada durante um ataque israelense. Os EUA aceitaram as conclusões de que o tiro provavelmente foi disparado por um soldado israelense, mas o caso e o pedido de responsabilização só foi feito por Biden em Belém.

Homem segura uma foto da jornalista palestino-americana Shireen Abu Akleh durante um protesto na passagem do presidente dos EUA, Joe Biden, em Belém. Foto: Abed al Hashlamoun/ EFE - 15/07/2022

Os palestinos não veem Biden como seu aliado, de acordo com pesquisas.

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“Os palestinos veem como positivo que este presidente tenha restaurado parte do financiamento e das conversas com os líderes palestinos, mas no geral o sentimento sobre esta viagem e o último ano e meio é de decepção”, disse Khalil Shikaki, pesquisador e diretor do Centro Palestino de Política e Pesquisa de Opinião. “A esperança de que ele seria muito diferente de Trump desapareceu. Agora eles o veem apenas um pouco diferente”.

Os palestinos estão esperando que Biden pressione tanto Israel - para reduzir os assentamentos, aliviar o bloqueio a Gaza e outras reformas - quanto o próprio Abbas, que se recusou a realizar eleições desde que assumiu o cargo em 2005. Com a ala progressista do Partido Democrata cada vez mais alinhando-se com as causas palestinas, muitos aqui esperavam que Biden se envolvesse mais com o conflito do que ele se envolveu.

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“Ele nem está fazendo tanto quanto Obama”, disse Shikaki. “O fato de eles não poderem fazer algo tão pequeno e simbólico quanto abrir o consulado é visto como uma verdadeira falta de coragem, vontade ou habilidade”.

Alguns palestinos veem os eventos de Biden na Cisjordânia, entre seus dias em Israel e sua partida para a Arábia Saudita, como uma nota de rodapé para sua real prioridade: aprofundar os laços de Israel com outras nações árabes da região. Os vizinhos sauditas do Golfo, Bahrein e Emirados Árabes Unidos, estão entre os países que recentemente entraram em relações formais com Israel, apesar de sua promessa de longa data de não fazê-lo sem uma resolução para o conflito palestino.

O governo saudita anunciou na sexta-feira que estava abrindo seu espaço aéreo para voos comerciais israelenses, encerrando um bloqueio tradicional que economizará horas em voos entre Israel e partes da Ásia. Biden e autoridades israelenses saudaram a mudança como um passo em direção a relações mais calorosas entre os dois países.

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