CAIRO - O gigantesco navio de carga que bloqueava o Canal de Suez foi finalmente desencalhado nesta segunda-feira, 29, liberando uma das rotas marítimas mais importantes do mundo, após causar um prejuízo diário de US$ 9,6 bilhões, segundo estimativas. Equipes de salvamento, trabalhando em terra e água por seis dias, foram finalmente ajudadas por uma força mais poderosa do que qualquer máquina: a maré.
Em poucas horas, os 425 navios que esperavam para cruzar a hidrovia de 193 quilômetros de comprimento que conecta o Mediterrâneo ao Mar Vermelho ligaram seus motores e começaram a se mover novamente. Os efeitos indiretos do bloqueio de uma semana de uma rota por onde passa 12% do comércio global ainda não estão claros.
Mohab Mamish, conselheiro do presidente egípcio, Abdel Fattah al-Sisi, disse que levará cerca de uma semana para que os navios na entrada do canal passem. Segundo ele, para acabar com o engarrafamento de navios levará mais do que o dobro do tempo.
Além das transportadoras, o Egito também sofreu danos econômicos com o bloqueio. O país perdeu cerca de US $ 15 milhões em taxas por dia em que o canal não esteve operacional. As perdas causadas pelos atrasos nas entregas também devem provocar uma enxurrada de sinistros de seguros, o que pode levantar questões sobre quem deve ser responsabilizado pelo incidente.
O Ever Given foi liberado por volta das 15 horas (10 horas em Brasília) e as buzinas dos reboques e das outras embarcações soaram em comemoração, enquanto surgiam nas redes sociais imagens do porta-contêineres mais uma vez em movimento. Os rebocadores puxaram a embarcação até um grande lago, no meio da hidrovia, onde passará por inspeções.
Na madrugada de hoje, a popa do Ever Given estava claramente livre da terra, mas se passaram algumas horas até que a proa do navio fosse puxada com sucesso da lama e sujeira nas margens do canal, onde a embarcação ficou encalhada.
As equipes de salvamento agiram em torno de um cronograma ditado em grande parte pelas marés: trabalhar rapidamente durante as seis horas que levaria para a água ir do ponto baixo ao mais alto.
A lua cheia deu às empresas holandesa e japonesa contratadas para desencalhar o Ever Given uma janela de 24 horas promissora para trabalhar. Durante toda a noite de domingo, e até esta segunda-feira, os rebocadores trabalharam em coordenação com as dragas para devolver o navio de 219 mil toneladas à água.
Resgate
Então, pouco antes do amanhecer, o navio lentamente começou a flutuar. Foi uma grande vitória em uma das maiores e mais intensas operações de salvamento da história moderna da navegação. As equipes dragaram 30 mil metros cúbicos de areia e mobilizaram 13 rebocadores.
Operadores de máquinas, engenheiros, capitães de rebocadores e outros funcionários das equipes de salvamento sabiam que estavam em uma corrida contra o tempo. Cada dia de bloqueio colocava as cadeias de abastecimento globais mais perto de uma crise total.
Vários navios carregados com mercadorias para o mundo todo – incluindo carros, petróleo, gado e laptops –, decidiram esperar a liberação do canal, que é o caminho mais rápido da Ásia e Oriente Médio para a Europa e a Costa Leste dos EUA. Mas, temendo que a operação de salvamento pudesse levar semanas, alguns navios optaram por fazer o caminho mais longo pelo extremo sul da África, uma viagem que pode adicionar semanas à viagem e mais de US$ 26 mil por dia em custos de combustível.
Com o Ever Given liberado, os holofotes agora devem se voltar para a investigação sobre como o navio encalhou, provocando perdas de bilhões de dólares em todo o mundo. Embora os fortes ventos e uma tempestade de areia sejam considerados um fator importante, o general Osama Rabie, da Autoridade do Canal de Suez, que administra a passagem, disse que a investigação não se concentrará apenas no clima e afirmou que a possibilidade de erros humanos e técnicos não pode ser descartada.
Os investigadores provavelmente examinarão o desempenho dos dois pilotos do canal egípcio a bordo do Ever Given e sua relação com o capitão do navio. Houve algum problema de comunicação? Quão experientes foram os pilotos e o capitão na navegação do canal? E quais desafios eles enfrentaram para mover um meganavio – ele tem a altura do edifício Empire State, em Nova York, e está perto do tamanho máximo permitido no canal – ao longo de uma artéria de faixa única da hidrovia?
Um funcionário de alto escalão da Autoridade do Canal de Suez afirmou que os dois pilotos egípcios que estavam a bordo do Ever Given têm mais de 30 anos de experiência e qualificação para guiar o navio. “O capitão é o único responsável pelo comando do navio”, afirmou. “Os pilotos (do canal) podem oferecer suas orientações e opiniões, mas o capitão pode recusar, se quiser.” / NYT, AP, WP e AFP