A bola de espelhos está de volta à cena e nem precisa ser nas pistas de dança

Ícone das festas disco na década de 1970, vista como brega nos últimos anos, a peça retorna a seus tempos mais brilhantes

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Por Lia Picard
4 min de leitura

Um salão de cabeleireiro ambientado em uma antiga igreja é inesperado. Acrescentemos a ele um lustre feito com pelo menos 20 bolas de discoteca e estamos prontos para a festa, disse Yoshi Burke, de 32 anos, que abriu o Disco Salon no bairro de Grant Park, em Atlanta, em março deste ano. Embora o espaço esteja cercado por vitrais, é impossível não olhar para a enorme escultura de bolas de vidro unidas com uma corrente industrial e amarras de metal. “Amo isso. O sol nasce de lado e, à medida que se move, ilumina esses dois vitrais lindamente, atinge essa estrutura e a luz se espalha por todo lugar.”

Nestes tempos inquietantes, uma festa rodopiante do teto pode ser um efetivo "pick me up". Foto: Lexey Swall/The New York TimesLexey Swall/The New York Times

A bola de discoteca está de volta. Depois de ser relegada à decoração de festas brega e bares retrô, ela agora pode ser encontrada adornando casamentos, vídeos de decoração no TikTok e lojas de artigos domésticos tanto no alto (como esculturas derretidas para Kelly Wearstler) quanto embaixo (como vasos de planta no Etsy). E, onde há tendência, há emoji: a bola de discoteca foi lançada pela Apple em março.

Libby Rasmussen, diretora de mídia social e marketing que vive em Washington, D.C., sempre teve uma afinidade com a bola de discoteca. Fotos de bolas de espelho no parapeito de uma janela de sua casa chamavam a atenção de seus seguidores no Instagram, e, quando estes lhe perguntavam onde também poderiam comprar bolas de discoteca, ela lhes respondia.

“Um dia, durante a pandemia, pensei que deveria começar a vendê-las”, contou Rasmussen, de 31 anos. Ela firmou um contrato com um atacadista e montou a loja LivingColorfully no Etsy, em que oferece cinco tamanhos de bolas de discoteca (a maior delas se chama “the Grace” e tem 60 centímetros de diâmetro). “No dia em que abri a loja, recebi 40 pedidos. Em pouco tempo, já eram 400 pedidos. E então alguns milhares. Realmente, saiu do controle. Acho que eu estava no lugar certo, na hora certa.” Ela informou ter vendido cerca de cinco mil bolas de discoteca em um ano, e os negócios ainda estão crescendo.

O interesse não parece estar desacelerando. De acordo com o Etsy, as pesquisas relacionadas a “bolas de espelho” aumentaram quase 400 por cento nos últimos três meses, em comparação com o mesmo período do ano passado.

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Embora a bola de discoteca esteja associada à década de 1970, é bem mais antiga que isso. De acordo com Matthew Yokobosky, curador sênior de moda no Museu do Brooklyn, a bola de espelho já era usada nas boates da década de 1920. “Foi uma maneira barata de criar muita atmosfera. Basta uma bola de espelhos iluminada para cobrir a sala inteira com pontos de luz que se movem. Uma pequena bola de discoteca tem um grande efeito”, comentou Yokobosky, curador da exposição “Studio 54: Night Magic”, que esteve em cartaz em 2020.

Na década de 1970, a bola de discoteca foi usada por clubes subterrâneos negros e gays que nem sempre tinham dinheiro para iluminação de alta tecnologia, explicou Yokobosky. A bola lhes permitiu decorar o ambiente com um orçamento apertado e, à medida que a disco music se tornou mais popular, o mesmo aconteceu com a bola.

Algumas pessoas acreditam que esta é um elemento inseparável da vida noturna gay. “A bola de discoteca sempre fez parte dessa cultura da comunidade queer, da vida noturna, escondida em nosso apartamento, pendurada na janela, ou ao lado de nossas plantas. Muitas vezes, pessoas queer e trans abrem os caminhos criativos das novas tendências, e leva um pouco mais de tempo para que as outras pessoas corram atrás”, disse Sophie Peoples, de 30 anos, artista de Oakland, na Califórnia, que usa pronomes neutros, é designer e estilista, e começou a vender a bola de discoteca em forma de frutas em sua loja na Etsy, chamada GoodDoggie, no ano passado. “O que acho tão especial nelas é que têm uma vida própria, difícil de recriar de outra maneira.”

A vontade de trazer mais alegria para casa levou Christine Obiamalu, profissional de comunicações durante o dia e artista durante a noite, a comprar duas bolas de discoteca para seu apartamento no Brooklyn. Ela trabalha em casa e suas bolas geralmente recebem luz solar por volta das 16h, quando o dia de trabalho está terminando. “Definitivamente, sinto uma explosão de energia que me faz pensar que o sol está brilhando lá fora e que tudo vai bem. Isso me deixa um pouco eufórica”, afirmou Obiamalu, de 24 anos.

Os fãs da bola de discoteca também suspeitam que um ressurgimento da cultura pop, da moda e da música dos anos 1970 levaram a esse momento. “Acho que está havendo outras mudanças culturais no retorno do design da década de 1970″, comentou Kate Reggev, arquiteta e historiadora da Zubatkin Owner Representation, em Nova York, acrescentando: “Há uma riqueza e uma exuberância em formas e materiais - metais brilhantes como latão e cromo, padrões brilhantes e tons ousados como laranja e verde-abacate - que se comunicam com o desejo das pessoas de se afastar dos espaços acolhedores e caseiros que tanto queríamos durante a pandemia.”

“Acho que as pessoas estão procurando maneiras de comemorar de novo. Estão em busca de momentos de alegria”, disse Yokobosky. E, muitas vezes, basta jogar luz sobre uma esfera coberta de espelhos para encontrar essa alegria.

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