Muito tempo de tela? Telefones fixos oferecem uma salvação

Como toca-discos e fitas VHS, telefones fixos estão sendo adotados por fãs nostálgicos como um antídoto para um modo de vida cada vez mais digital.

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Por Hilary Reid
5 min de leitura

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Primeiro veio o telefone rotativo incrustado de strass. Em seguida, em formato de lábios vermelho-cereja. Depois o de cheeseburger.

No verão passado, Chanell Karr havia acumulado uma coleção de seis telefones fixos. Seu mais recente, um modelo com cordão laranja feito como item promocional para o filme de 1986 A Garota de Rosa-Shocking, foi comprado em junho. Embora ela tenha apenas um deles - um telefone VTech mais modesto - conectado, todos estão em condição de funcionamento.

Telefones fixos se tornaram desejados entre pessoas que querem se distanciar dos seus smartphones. Foto: Jessica Ebelhar/The New York Times

“Durante a pandemia, eu queria me desconectar de todas as coisas que te distraem em um smartphone”, disse Karr, 30, que trabalha na área de marketing e bilheteria em uma casa de shows perto de sua casa em Alexandria, Kentucky. “Eu só queria voltar às formas analógicas originais de ter um telefone.”

Outrora um item básico da cozinha, companheiro de cabeceira e recurso de enredo em seriados como Sex and the City e Seinfeld, o telefone fixo foi praticamente substituído por sua contraparte sem fio mais nova e mais inteligente.

Em 2003, mais de 90% dos entrevistados em uma pesquisa realizada pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças disseram ter um telefone fixo operacional em suas casas. Em junho de 2021, esse número - que inclui telefones conectados à Internet e aqueles com fio à moda antiga (por meio de linhas de cobre que ligam de uma casa a uma caixa de junção local) - caiu para pouco mais de 30%.

Mas, como toca-discos e fitas VHS, telefones fixos estão sendo adotados por fãs nostálgicos que dizem que o fato de não rolar a tela é um antídoto para a fadiga da mesma e o excesso de multitarefas. A forma semicircular dos receptores de muitos telefones, dizem os usuários, também é mais natural e confortável na bochecha do que o corpo plano de um smartphone. E com um dispositivo sem fio, deve-se comprometer mais com o ato de conversar; o telefonema torna-se mais intencional.

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Em janeiro, Emily Kennedy, gerente de comunicação do serviço público canadense, começou a usar um antigo telefone rotativo rosa do escritório de seu pai como forma de se desapegar de seu trabalho nas mídias sociais.

Ironicamente, foi no Twitter que Kennedy teve a ideia. Quando Rachel Syme, redatora da New Yorker, tuitou em janeiro sobre um telefone fixo que ela havia conectado via Bluetooth, Kennedy foi um dos muitos que responderam dizendo que Syme os havia inspirado a montar seus próprios telefones.

“Ter meu telefone antigo como objeto em minha casa é um sinal identitário de que gosto de um ritmo mais lento”, disse Kennedy, 38 anos, que mora em Ottawa, Ontário.

Chanell Karr segura seu telefone laranja, item promocional do filme 'A Garota de Rosa-Shocking'. Foto: Jessica Ebelhar/The New York Times

Como Syme e muitos outros usuários modernos de telefones analógicos, Kennedy não tem seu telefone fixo conectado às linhas de cobre - portanto, não tem seu próprio número -, mas usa um acessório Bluetooth para conectá-lo ao serviço de celular de seu smartphone. (Em outras palavras, quando ela está conectada, ela pode atender uma chamada de celular no telefone fixo.)

Matt Jennings trabalha na Old Phone Works, uma empresa em Kingston, Ontário, que reforma e vende telefones fixos, desde 2011. Agora seu gerente geral, Jennings, 35, disse que nos últimos dois anos, a demanda dos clientes por telefones rotativos das décadas de 1950 e 1960 disparou.

“Cerca de um ano e meio atrás, absolutamente disparou”, disse Jennings. “Nos últimos seis ou sete anos, recebíamos um ou dois pedidos, e agora é provavelmente uma de nossas principais fontes de receita.”

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Sobre o que motivou o recente desejo por telefones fixos, Jennings disse: “É um retorno ao básico”. Ele acrescentou: “Você realmente não pode ir a lugar nenhum com um telefone com fio, você está basicamente preso a um raio de mais ou menos um metro da base. Você pode ter uma conversa real sem se distrair.”

Rachel Lahbabi, 37, notou um aumento semelhante no interesse depois que começou a vender telefones fixos on-line por meio de sua loja Etsy, a Robert Joyce Vintage, no início de 2021. Em outubro, eles se tornaram alguns dos produtos mais vistos que ela oferecia, disse Lahbabi, que mora em Charlotte, Carolina do Norte.

“Os que eu estava mostrando vendiam tão rápido”, ela disse. “Eu pensei: ‘OK, as pessoas estão claramente procurando por isso, então eu realmente deveria focar nessa tendência.’”

Telefones cor-de-rosa em forma de lábios têm sido particularmente populares entre seus clientes, disse Lahbabi, assim como modelos transparentes ou neon. Também em alta: telefones do Garfield.

Todos esses estilos, ela acrescentou, “provavelmente são semelhantes a um telefone que eles tinham quando eram mais jovens”.

Em todo o Etsy, houve um aumento de 45% nas buscas por telefones Y2K e dos anos 1990 e um aumento de 26% nas buscas por telefones rotativos em 2021 em comparação com 2020, disse Dayna Isom Johnson, especialista em tendências da empresa.

Seis telefones fixos que são propriedade de Chanell Karr, incluindo um modelo com fio laranja e telefones projetados para parecerem lábios e um cheeseburger. Foto: Jessica Ebelhar/The New York Times

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Enquanto muitos que adquiriram telefones fixos recentemente os estão usando com tecnologia mais recente, alguns preferem uma abordagem mais tradicional.

Janelle Remlinger, 37, conseguiu um telefone fixo para sua casa em Plymouth, Massachusetts, em dezembro de 2020, depois que uma tempestade interrompeu o serviço de celular em sua área. Ela o conectou ao seu modem, mas quando Remlinger ficou sem energia por oito dias durante outra tempestade em outubro, ela começou a procurar uma conexão mais confiável.

“Estou trabalhando para conseguir um telefone fixo autêntico, real e antigo canalizado através dos fios”, disse Remlinger.

Por mais atraentes que os telefones fixos possam ser, até mesmo seus fãs mais fervorosos reconhecem que é basicamente impossível usá-los exclusivamente.

Alex McConnell, 30, banqueiro pessoal do KeyBank em Fort Collins, Colorado, tem um telefone rotativo Western Electric conectado a linhas de cobre em sua casa. Em 14 de fevereiro, ele não comemorou o Dia dos Namorados (nos Estados Unidos), mas o 146º aniversário do pedido de patente para o telefone por Alexander Graham Bell.

“Preparei uma refeição com pimentões ‘Bell’ e bolachas ‘Graham’”, disse McConnell. “Então fiz um bolo redondo em que usei glacê azul para colocar o logotipo da Bell e o número original da patente do telefone.”

Seu telefone fixo não é apenas mais confiável do que um celular, ele disse, mas também o incentiva a memorizar os números de telefone dos amigos, o que ele considera uma forma de intimidade.

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“Como eu realmente tenho que discar os números de telefone dos meus amigos, acho que isso realmente me ajuda a conectá-los à memória”, disse McConnell.

Mas ele também não pode evitar o chamado da vida moderna.

“Minha tristeza secreta é que eu tenho um celular.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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