Pode até parecer, mas o turismo espacial não é apenas diversão

Ter pessoas ricas como Jeff Bezos em órbita pode tornar as viagens espaciais rotineiras e ajudar-nos a sonhar grande

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Por Shira Ovide
4 min de leitura

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Assim como eu, talvez você tenha se perguntado: existe algum sentido em mandar caras ricos como Jeff Bezos e o ator de Jornada nas Estrelas, William Shatner, para o espaço?

Wendy Whitman Cobb, cientista política da Força Aérea Americana para questões espaciais, diz que sim. Nossa conversa desafiou meu pensamento sobre projetos espaciais, como os de Bezos e Elon Musk, que imaginam um futuro longe da Terra.

Se você gritou “CRISE DE MEIA IDADE” quando Bezos tocou no espaço no ano passado ou perguntou por que a empresa SpaceX de Musk atraiu tanta atenção, isso é para você.

Whitman Cobb, que tem um Ph.D. em ciência política, disse que os passeios turísticos eram o primeiro passo para transformar as viagens espaciais em rotineiras ao invés de bizarras. E ela acredita que os amadores em órbita são um teste para ambições dignas - incluindo colonizar Marte, como imagina Musk, ou colonizar o espaço para apoiar mais pessoas e indústrias do que é possível na Terra, como Bezos aspira.

Para mim, isso soa como fantasias escapistas de bilionários. Mas o otimismo de Whitman Cobb é um contraponto útil aos avisos regulares deste escritor de que a tecnologia não é uma solução mágica para nossos problemas. Whitman Cobb concorda, mas também disse que a tecnologia às vezes fez coisas mágicas na exploração espacial.

Para rebobinar a última década, corporações como a SpaceX, a Blue Origin de Bezos, a Northrop Grumman e a startup Rocket Lab, sediada na Nova Zelândia, tentaram se tornar players maiores em voos espaciais. As empresas sempre trabalharam com governos em viagens espaciais, mas agora estão mais envolvidas no transporte de astronautas, entusiastas, satélites e cargas para o espaço.

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Há um debate sobre o papel apropriado dos governos versus as corporações no espaço, mas Whitman Cobb acredita que essas empresas tornaram as tarefas espaciais rotineiras mais baratas e fáceis. Isso libera a NASA para sonhar alto em projetos como buscar colônias lunares e explorar o espaço profundo.

A SpaceX, a Blue Origin e a Virgin Galactic também lideraram cruzeiros espaciais. Esses são passeios para poucos, mas Whitman Cobb disse que eles ajudaram a aprimorar a segurança das viagens espaciais e geraram entusiasmo para pesquisar além do nosso planeta.

“Quanto mais pessoas ‘normais’ vemos voar para o espaço, mais pessoas verão isso como possível e ficarão animadas”, ela me disse. “Essa opinião pública é fundamental para muitas coisas que essas empresas e o governo dos EUA estão fazendo no espaço.”

(Whitman Cobb disse que essas opiniões eram dela, e não do governo dos EUA, que a emprega. Ela também disse que não recebeu financiamento de empresas espaciais comerciais.)

O objetivo final, porém, vai muito além do turismo. Musk e Bezos imaginam transportar pessoas ou indústrias poluidoras para o espaço ou criar uma civilização marciana. Eu me preocupo que isso seja um pretexto para ignorar os problemas na Terra.

Whitman Cobb entendeu por que perguntei se estes eram delírios imprudentes, mas ela também não quer que percamos de vista os benefícios potenciais de sonhar. A história da exploração espacial, ela disse, é de visões excêntricas e não necessariamente nobres se tornando factíveis e úteis.

As missões dos EUA à Lua na década de 1960 foram motivadas pelo desejo de provar a superioridade dos EUA sobre a União Soviética. No entanto, as missões espaciais nacionalistas ajudaram a estimular o desenvolvimento de eletrônicos cada vez menores que usamos todos os dias, melhoraram a tecnologia da saúde e até nos deram a espuma de memória. O boom da última década nos voos espaciais comerciais reduziu o custo do acesso ao espaço e permitiu novas ideias, como satélites de pequena escala, para mapear a Terra de cima.

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Whitman Cobb disse que a tecnologia avançada que as empresas espaciais comerciais desenvolveram para voos espaciais também pode chegar a outras áreas que nos ajudam.

Uma autodenominada nerd do espaço, ela também disse que a admiração pelo espaço era um objetivo digno. “Também gera uma coceira, por assim dizer, do desejo da humanidade de explorar, descobrir e entender o mundo ao nosso redor”, ela disse.

Perguntei a Whitman Cobb se ela gostaria de viver em Marte. “Com certeza,” ela respondeu. “Talvez não para sempre.”

Não estou dissipando todas as minhas dúvidas sobre turismo em foguetes ou fantasias espaciais de bilionários. Quando as corporações desempenham um grande papel no espaço, elas podem acumular invenções em vez de fazê-las em benefício das pessoas. O turismo espacial também prejudica o meio ambiente, e não está claro o quanto as viagens espaciais e o comércio valem a pena. Sabemos que as tecnologias, mesmo as úteis, têm desvantagens.

Whitman Cobb quer que tenhamos esse ceticismo ao lado da empolgação. A história das viagens espaciais, ela disse, mostra que sonhos egoístas podem beneficiar a todos nós. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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