O que é Anom e como a polícia o usou para prender centenas de criminosos?

Aplicativo de mensagens encriptadas comprometeu grupos Triad na Ásia, cartéis de drogas sul-americanos e laboratórios clandestinos na Austrália

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Por Antonia Noori Farzan e Adam Taylor
Atualização:

WASHINGTON - Oficiais da lei em todo o mundo anunciaram nesta terça-feira, 8, que conseguiram enganar centenas de supostos criminosos a usar o aplicativo de mensagens encriptadas Anom, secretamente controlado pelo FBI.

O serviço de investigação americano se uniu à polícia australiana e a uma série de agências europeias de aplicação da lei em um esforço audacioso para dar aos oficiais uma visão secreta de supostas empresas criminosas globais.

Aqui está o que sabemos sobre o caso:

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O que é Anom?

Para usuários, ele parecia ser um aplicativo desenvolvido para possibilitar uma comunicação livre de monitoramentos. Como o WhatsApp ou as mensagens de texto, ele permitia conversas com textos, fotos e vídeos, mas, ao contrário deles, parecia ter sido desenhado para uso ilícito. 

Oficiais da lei disseram que usuários migraram para o app após outros serviços de mensagens encriptadas, como o EncroChat, serem desativados por autoridades. Anom veio pré-instalado, com funcionalidades limitadas, em celulares comercializados no mercado ilegal. 

Aplicativo de mensagens encriptadas implantado comprometeu grupos Triad na Ásia, cartéis de drogas sul-americanos e laboratórios clandestinos na Austrália Foto: Olivier Morin/AFP

Ele se tornou popular. Embora contratos de quase seis meses pudessem custar mais de US$ 2 mil, haviam quase 12 mil celulares com o Anom instalado, informam documentos do FBI. Para comprar o aplicativo, era necessário receber aprovação de um usuário ativo, informaram os oficiais, o que fazia com que novos e antigos usuários se sentissem seguros.

Mas o aplicativo era um estratagema inventado por funcionários australianos e americanos em 2018. Embora as mensagens fossem criptografadas, o FBI e outras agências de aplicação da lei construíram uma chave mestra para o sistema, o que significa que os funcionários poderiam descriptografar e armazenar qualquer mensagem enviada sem o conhecimento do usuário.

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O FBI chamou o plano de Operação Escudo de Tróia e a polícia australiana o chamou de Operação Especial Ironside.

Quem foi preso?

Embora o Anom estivesse disponível inicialmente em apenas um número limitado de países, ele acabou se espalhando. O FBI disse em um arquivamento na terça-feira que ele estava em uso em 90 países, com a maioria dos usuários encontrados na Alemanha, Holanda, Espanha, Austrália e Sérvia.

Policiais disseram na terça-feira que uma coalizão internacional prendeu mais de 800 pessoas e obteve informações sobre blocos criminosos tão diversos quanto cartéis de drogas sul-americanos e grupos Triad na Ásia.

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Uma das maiores operações foi na Austrália, onde 224 pessoas foram presas por 525 acusações. A polícia também disse que fechou seis laboratórios clandestinos e agiu sob 21 ameaças de morte, incluindo uma que salvou uma família de cinco pessoas.

O que foi apreendido?

Ao anunciar a operação na terça-feira, as autoridades apontaram para os bens ilícitos e outros itens que foram apreendidos como resultado da armação.

Funcionários da Europol, a agência policial europeia, disseram em um comunicado que as batidas em todo o mundo levaram à “apreensão de mais de 8 toneladas de cocaína, 22 toneladas de cannabis e resina de cannabis, 2 toneladas de drogas sintéticas (anfetaminas e metanfetamina), 6 toneladas de precursores de drogas sintéticas, 250 armas de fogo, 55 veículos de luxo e mais de US $ 48 milhões em várias moedas e criptomoedas em todo o mundo ”.

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O comunicado também disse que “inúmeras operações de spin-off serão realizadas nas próximas semanas”.

Fotos divulgadas por agências de aplicação da lei mostraram grandes maços de dinheiro, revólveres e rifles com miras de longo alcance e um carro esporte McLaren.

Como o submundo pode reagir?

“Haverá represálias, haverá dívidas, haverá conflito”, disse David Hudson, vice-comissário de investigações e contraterrorismo da Polícia Federal Australiana, a repórteres na terça-feira.

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Enquanto monitorava o aplicativo, a polícia descobriu que supostos criminosos estavam fazendo negócios nas costas uns dos outros. E na esteira das prisões em massa, alertaram as autoridades, outros grupos criminosos podem surgir para preencher o vácuo.

A Polícia Federal australiana reforçou sua unidade de crimes graves e divisão de gangues na preparação para essa possibilidade, disse Hudson.

Quem é Hakan Ayik, o fugitivo australiano que deu aos investigadores sua grande chance?

Um dos criminosos mais procurados da Austrália, Hakan Ayik fugiu do país há mais de uma década e é suspeito de ser um narcotraficante de alto escalão que continua controlando o fluxo de importações da Turquia.

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Ayik ainda não foi preso, mas autoridades disseram na terça-feira que policiais disfarçados conseguiram induzi-lo a se tornar um dos primeiros a adotar o aplicativo e promovê-lo para outras pessoas em sua rede.

“Ele basicamente ‘armou’ para os seus próprios colegas”, disse o comissário da Polícia Federal Australiana, Reece Kershaw, instando Ayik a se entregar antes que ele ou sua família se tornem alvos por causa de seu papel involuntário no esquema.

No início deste mês, o Sydney Morning Herald relatou que Ayik parecia levar um estilo de vida luxuoso em Istambul e que fontes da lei acreditavam que ele poderia ter feito cirurgia plástica para ser menos reconhecível.