Há meses, Estados Unidos e Taleban vinham negociando um acordo para pôr fim aos 18 anos de guerra no Afeganistão. Mas um ataque suicida em Cabul provocou a morte de um soldado americano e mais 11 pessoas. “Ao tomar conhecimento disso, imediatamente, cancelei as negociações de paz”, afirmou um presidente Donald Trump, enfurecido no Twitter.
A decisão foi um alívio para muitas pessoas que temiam que Trump estivesse disposto a firmar qualquer tipo de acordo com o Taleban, por mais humilhante que fosse para os EUA ou catastrófico para o Afeganistão, apenas para cumprir uma promessa de campanha de que encerraria “guerras infindáveis” nas quais o país estava envolvido e traria os soldados de volta para casa.
Quando cancelou as conversações, ele revelou que estava às vésperas de receber negociadores do Taleban em Camp David, esperando selar um acordo. Muitos americanos ficariam chocados diante do espetáculo do seu presidente recebendo um grupo que deu refúgio a Osama bin Laden dias antes do aniversário de 18 anos dos atentados de 11 de setembro de 2001.
Em vez disso, depois de Trump cancelar o encontro, o comandante americano no Afeganistão declarou estar aumentando o ritmo dos ataques contra o Taleban. As negociações estão “mortas” reiterou Trump.
O acordo que os EUA estavam prestes a assinar era assimétrico. Foi uma das razões das divergências entre o presidente e o seu conselheiro de Segurança Nacional John Bolton, que deixou a função, eliminando o principal falcão do governo. Esse desacordo envolveu a retirada de 5 mil soldados sem que o Taleban concordasse com um cessar fogo. O que não é tão lamentável como parece.
Os EUA ainda têm um bom número de pessoas treinando o Exército afegão e fornecendo apoio aéreo. E, nesse meio tempo, o Taleban concordou em negociar diretamente com o governo afegão, embora isso fosse disfarçado como parte de um diálogo nacional, algo a que o Taleban, até hoje, resistia tenazmente.
O problema é que o Taleban não tem nenhum incentivo para fazer grandes concessões, como aceitar um cessar-fogo ou moderar sua demanda por uma teocracia no país, se continuar acreditando que o tempo está a seu favor. Alguns suspeitam que Trump deseja apenas declarar vitória antes da próxima eleição e deixar o Afeganistão à sua sorte, aconteça o que acontecer.
Para forjar uma paz durável, Trump precisa convencê-los de que estão errados e garantir que ele permanecerá no país, se for necessário. Não será fácil. A guerra não pode ser vencida apenas pela força das armas. Mesmo quando os EUA mantinham 100 mil soldados no Afeganistão, sete vezes mais do que hoje, não conseguiram erradicar o Taleban.
Com menos soldados, foram registradas cerca de uma dezena de perdas entre suas tropas e ainda conseguimos impedir o Taleban de tomar conta do país. No entanto, milhares de afegãos morrem e a vida para os remanescentes é miserável.
Saída abrupta do Afeganistão traz riscos
Uma saída americana abrupta só vai piorar a situação, com o Afeganistão condenado a uma guerra civil ainda mais sangrenta e a possibilidade de uma eventual vitória do Taleban, que desestabilizará a região, criará outro refúgio potencial para terroristas e deixará os afegãos à mercê de um grupo que é capaz de matar meninas pelo fato de elas irem à escola. É difícil imaginar um resultado pior para 18 anos de guerra.
Se a vitória militar é inatingível e a rendição intragável, resta somente uma opção: mais negociação. O Taleban diz estar aberto ao diálogo. Ótimo, que eles conversem com o governo eleito do Afeganistão.
Os EUA devem usar toda a sua força para levar os dois lados à mesa de negociação. E deixar claro que apoiará o regime em Cabul até ele não estar mais em perigo de ser derrubado por jihadistas. Todosdeverão assumir compromissos incômodos.
O Taleban deverá ter um papel proeminente no governo porque esta é a maneira de dar a ele uma participação na paz. O caminho é longo para se chegar a um tal acordo. E não será firmado em tempo para ser alardeado na campanha eleitoral de 2020. Que assim seja.
Trump está certo em não se apressar e fazer um mau acordo. O futuro do Afeganistão e a credibilidade dos EUA dependerão dele, ou de um futuro presidente, com paciência e determinação para negociar um acordo melhor. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
© 2018 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.