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Para candidatos colombianos, zombaria do WhatsApp é boa publicidade

Stickers, figurinhas, fotos ou animações que piscam tornaram-se a linguagem das eleições presidenciais da Colômbia

Por Samantha Schmidt
Atualização:

THE WASHINGTON POST, BOGOTÁ — Os memes inundam as conversas em grupo ao longo do dia. Um político dá uma piscadela maliciosa. Outro dá um tapa na cara de um vereador. Um terceiro fracassa em um debate; o texto diz: “não inspira ninguém”.

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Os stickers, figurinhas, fotos ou animações que piscam no WhatsApp tornaram-se a linguagem das eleições altamente disputadas da Colômbia este ano. Com uma foto ou vídeo e um aplicativo simples, qualquer pessoa pode criar e enviar uma propaganda. Em um país onde os eleitores estão fartos de política e políticos, os stickers se tornaram uma maneira catártica de zombar dos candidatos e capturar os momentos mais absurdos da campanha presidencial colombiana.

Em 19 de junho, os colombianos votarão no último turno daquele que tem sido um ciclo eleitoral diferente de qualquer outro, marcado por violência, ameaças de morte contra candidatos, escândalos e acusações de fraude. A escolha é entre dois candidatos incomuns que prometem mudanças radicais. Um deles, o senador Gustavo Petro, é um ex-guerrilheiro que seria o primeiro presidente de esquerda do país. O outro, o empresário Rodolfo Hernández, é um populista sem filtro conhecido por insultar seus próprios funcionários.

Gustavo Petro (esquerda) e Rodolfo Hernández disputam o 2° turno das eleições na Colômbia. Foto: Luisa Gonzalez/ REUTERS

“Esta campanha produz muita ansiedade. Está separando as famílias, está causando tensões desnecessárias nos locais de trabalho, nos bate-papos em grupo, entre amigos”, disse Sergio Guzmán, diretor da consultoria Colombia Risk Analysis e criador de pelo menos 300 figurinhas políticas. “Precisamos de algo de que possamos tirar sarro coletivamente.”

As figurinhas de Whatsapp se tornaram tão populares que as próprias campanhas os adotam, em alguns casos para zombar de seus próprios candidatos.

Quem melhor usa isso é Hernández, o ex-prefeito de 77 anos que reivindicou o título de “Rei do TikTok” por seus vídeos peculiares e às vezes bizarros na plataforma. Sua equipe de mídia social é composta principalmente por jovens de 20 e poucos anos que trabalham em sua primeira campanha, de acordo com a porta-voz Luisa Fernanda Olejua.

Um sticker de Hernández amplamente divulgado, criado por sua própria campanha, mostra-o pronunciando as palavras “relocos, papi”, algo como “louco, papai”. Outro o mostra em um balanço, dizendo “weee”. Outros brincam com sua personalidade dura e direta – usando gírias vulgares de seu departamento natal, Santander.

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Danny Miranda, diretor criativo da campanha de Hernández, disse que os stickers do TikTok e do WhatsApp atendem a um público que está cansado de mensagens políticas tradicionais e retórica de campanha. Eles querem se divertir, rir, ver um candidato que não se leva tão a sério.

Mas ao compartilhar os vídeos e figurinhas de Hernández – mesmo que estejam tirando sarro dele – os colombianos estão dando publicidade a ele. “Quando o conteúdo chega pra gente de uma tia ou parente, você sabe que funcionou”, disse Miranda.

Figurinhas do WhatsApp se tornam febre nas eleições presidenciais da Colômbia. Foto: The Washington Post Foto: The Washington Post

Cristina Vélez, diretora da organização sem fins lucrativos Linterna Verde, que pesquisa a opinião pública online, disse que a “memeificação” de Hernández atraiu pessoas que de outra forma não estariam prestando atenção à política. Os stickers fazem parte dessa estratégia, que pode ser replicada em campanhas políticas globalmente.

“É uma nova maneira de bater na porta de quem estava com a porta fechada”, disse Vélez. “Ele diz: ‘Olha, eu vou entretê-lo - deixe-me entrar’.”

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A abordagem forçou outras campanhas a fazer o mesmo, embora com menos sucesso. A campanha do Petro também faz figurinhas de Whatsapp, mas eles se parecem mais com materiais de campanha tradicionais. Giovanny Abadía, membro da equipe de comunicação de Petro, disse que muitos visam capturar a mensagem do candidato sobre a “política do amor”.

Para Guzmán, criar e compartilhar figurinhas tem sido uma forma de aliviar a ansiedade de analisar um ciclo eleitoral tenso e imprevisível. Mas eles se tornaram tão populares que ele começou a fazer grupos de WhatsApp com centenas de pessoas apenas para divulgá-los.

Alguns são simplesmente fotos e citações diretas de políticos, como a vez em que um senador de direita foi gravado dizendo “ou ganhamos as eleições ou vamos todos nos ferrar”. Hernández sorrindo e dizendo a um rival para enfiar seu programa de governo em seu reto.

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Há Petro aparecendo para rezar em uma igreja, apesar de ter dito não ser praticante de rituais católicos. “Finja rezar, finja rezar, finja rezar”, diz a figurinha. Há a mãe armada de Hernández, de 97 anos, que fala de ter esbofeteado o filho até sangrar e ter disparado contra o marido durante uma briga. Na figurinhas de Whatsapp, uma foto tirada para o El Pais por Carlos Buitrago, ela sorri enquanto aponta o revólver para a câmera: “Os valores se ensinam em casa”, diz o texto.

No fim de semana, um influenciador do TikTok divulgou um vídeo de Hernández sem camisa usando óculos escuros e uma corrente de ouro e uma cruz no pescoço. O vídeo dá um zoom em seu peito nu e depois o mostra andando com duas mulheres mais jovens ao seu lado ao som de uma música do 50 Cent. (Embora a campanha não tenha compartilhado o vídeo, deu ao usuário do TikTok acesso ao candidato para a filmagem). Em poucas horas, Guzmán fez uma figurinhas de Whatsapp da cruz no peito de Hernández, com as palavras “Alguém me tire daqui”.

Para Evelin Mosquera Ceballos, uma advogada de 28 anos de Cali, as figurinhas de Guzmán a mantiveram atualizada. Cada vez que ela recebe um, procura na internet por uma explicação. Tem sido informativo e divertido em um ciclo eleitoral em que ela está descontente com as duas opções para presidente. Ela diz que está apoiando Petro porque ele é a “opção menos pior”.

É um mecanismo de enfrentamento familiar a muitos colombianos: “Você ri para não chorar”.

Na noite de quarta-feira, Mosquera viu um vídeo da esposa de Hernández ao lado dele enquanto falava com repórteres. Para combater o tráfico de drogas, Hernández sugeriu que o governo deveria apenas dar drogas para pessoas que lutam contra o vício.

A mudança de expressão no rosto de Socorro Oliveros refletia a progressão das emoções de muitos outros assistindo: Surpresa. Confusão. Exasperação. Um olhar vazio. Mosquera não resistiu. No dia seguinte, criou uma figurinha.

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