A tensão aumentou ontem à noite na Praça Tahrir, no centro do Cairo, onde milhares de manifestantes exigem desde o dia 25 a renúncia do presidente Hosni Mubarak. O Exército tentou desocupar a avenida que corta a praça. Os manifestantes resistiram. Eles não se mostraram sensibilizados com a renúncia, ontem, da direção do Partido Nacional Democrático (PND), de Mubarak, incluindo o seu filho, Gamal, tido como seu sucessor até o começo dos protestos. Depois de assumir o controle sobre os acessos à praça - até então dominados apenas pelos manifestantes -, o general Hassan Al-Rowenry, comandante da região do centro do Cairo, pediu que eles saíssem da avenida. "Vocês têm todo o direito de expressar-se, mas por favor salvem o que resta do Egito", disse Al-Rowenry, que subiu em um pequeno palanque e falou por um alto-falante. "Olhem ao redor de vocês." Os manifestantes gritaram que queriam a renúncia de Mubarak. "Não falarei em meio a essas palavras de ordem", irritou-se o general, retirando-se.Os militares dispersaram alguns dos manifestantes que estavam na avenida, forçando-os a subir na calçada da praça. A intenção do Exército é garantir que os bancos e o comércio possam reabrir hoje. "Queremos que as pessoas voltem ao trabalho e que a vida retorne à normalidade", disse o general aos jornalistas. A praça é um ponto de intersecção de várias regiões do Cairo. Muitos moradores da cidade reclamam que sua ocupação, combinada com o toque de recolher das 16h às 8h, impede-os de trabalhar e de recorrer aos serviços públicos. Os manifestantes disseram temer que o Exército esteja preparando a desocupação total da praça e reafirmaram que não sairão dela até que Mubarak deixe a presidência, abrindo caminho para um governo de transição realizar a eleição para presidente, prevista para setembro. O novo secretário-geral do PND será Hossam Badrawi, considerado um liberal distante da velha guarda do regime. Mubarak promete ficar no poder até a eleição de setembro e limitou-se a trocar os ministros. Ontem, ele teve a primeira reunião com o novo gabinete. Aliados do presidente insistem que ele não deixará o poder de forma "humilhante", apesar da pressão. Ontem, na Península do Sinai, parte da tubulação de um gasoduto que liga o Egito a Israel e Jordânia explodiu. A TV estatal egípcia disse tratar-se de sabotagem.Um grupo de 30 intelectuais de oposição conhecido como "conselho de sábios", ligado ao diplomata Mohamed ElBaradei, encontrou-se duas vezes nos últimos dias com Omar Suleiman, o vice-presidente recém-nomeado por Mubarak, para discutir a saída do presidente e a formação de um governo interino. Segundo a proposta da oposição, Mubarak abriria mão de tudo menos do título de presidente, segundo Amr el-Shobaki, um dos integrantes do conselho.A oposição exige ainda a dissolução do Parlamento, controlado por aliados de Mubarak, e o fim das leis de emergência em vigor desde 1981. Na prática, elas dão poderes quase ilimitados ao aparato policial do regime.Na sexta-feira, o grupo encontrou-se com Ahmed Shafiq, o novo primeiro-ministro. Abdel-Rahman Youssef, líder estudantil que participa do conselho, disse que as negociações diretas não começaram formalmente, mas "mensagens para acabar com a crise" estavam sendo trocadas.Em uma conferência de segurança em Munique, a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, disse ser "importante o apoio a um processo de transição no Egito levado adiante, na prática, pelo vice-presidente Omar Suleiman". Nas entrelinhas, ficou a mensagem de que Mubarak deve passar o poder decisório para o número 2 de seu regime até as eleições de setembro. O PND está no poder desde sua criação, em 1978, pelo então presidente Anwar el-Sadat, assassinado no ano seguinte por fundamentalistas islâmicos, por ter assinado a paz com Israel, e substituído por seu vice, Mubarak, há 30 anos no poder.