Reino Unido aprova extradição de Julian Assange para os EUA; defesa vai recorrer

Ministério do Interior britânico concordou com decisão da Justiça do país de que o fundador do WikiLeaks pode ser deportado em segurança; Assange tem 14 dias para recorrer da decisão

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Por Redação
Atualização:

O governo britânico ordenou nesta sexta-feira, 17, a extradição do fundador do WikiLeaks, Julian Assange, para os Estados Unidos para enfrentar acusações de espionagem. Assange tem 14 dias para recorrer da decisão, disse o Ministério do Interior britânico.

Assange está detido em uma prisão de Londres desde 2019, depois de sete anos fugindo da prisão ao buscar asilo político na Embaixada do Equador.

Seus advogados argumentaram que ele estava em “alto risco de morrer” sob as restrições que poderia enfrentar enquanto estiver sob custódia dos EUA.

Jennifer Robinson, advogada de Julian Assange (de vermelho), fala sobre a decisão do governo britânico de extraditar o fundador do WikiLeaks  Foto: Henry Nicholls / Reuters

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O Ministério do Interior disse em um comunicado que “os tribunais do Reino Unido não consideraram que seria opressivo, injusto ou um abuso de processo extraditar Assange. Tampouco acreditam que a extradição seria incompatível com direitos humanos, incluindo seu direito a um julgamento justo e à liberdade de expressão, e que enquanto estiver nos EUA ele será tratado adequadamente, inclusive em relação à sua saúde”.

Priti Patel, a secretária do Interior britânica, assinou a ordem de extradição. A ministra do Interior é a autoridade final em relação à extradição no sistema britânico - embora Assange tenha outras vias legais que deve buscar para bloquear a decisão, e especialistas dizem que sua chegada aos Estados Unidos está longe de ser iminente.

O Ministério do Interior disse que Assange “só será entregue ao Estado requerente quando todas as vias de contestação legal estiverem esgotadas”.

Antes de sua extradição, Assange poderia pedir ao mais alto tribunal do Reino Unido que ouvisse mais argumentos, ou poderia recorrer ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos. Cada tribunal teria que concordar em ouvir o recurso de Assange, o que não é garantido.

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Julian Assange no dia em que foi detido, em 11 de abril de 2019, na embaixada do Equador em Londres  Foto: Hannah McKay / Reuters


Como parte do processo de extradição, o principal tribunal britânico aceitou em dezembro as garantias do governo dos EUA sobre medidas de segurança específicas que implementaria para Assange. O tribunal se recusou a ouvir o apelo de Assange sobre esse ponto em março.

Um tribunal federal da Virgínia indiciou Assange em 18 acusações, entre elas conspiração e divulgação de informações de defesa nacional. Os promotores alegam que ele trabalhou com a ex-soldado do Exército, Chelsea Manning, em 2010 para obter e publicar milhares de páginas de registros militares e telegramas diplomáticos sobre as guerras no Afeganistão e no Iraque.

A divulgação da informação, alegaram autoridades, colocou vidas em perigo. Assange diz que estava dentro de seus direitos como jornalista e editor ao buscar e divulgar informações sobre atividades controversas nos EUA.

Em janeiro de 2021, um juiz britânico suspendeu a extradição de Assange, considerando-o “um homem deprimido e às vezes desesperado, que está genuinamente com medo de seu futuro” e com alto risco de suicídio nas condições solitárias ou altamente restritivas que ele pode enfrentar sob custódia dos EUA. .

O governo dos EUA então se ofereceu para não impor “medidas restritivas especiais” a Assange e mantê-lo fora da prisão federal de segurança máxima em Florence, no Colorado, enquanto aguardava julgamento, a menos que ele fizesse algo no futuro para merecer tais restrições.

governo dos EUA disse que deixaria Assange cumprir sua sentença na Austrália se ele fosse condenado, e a Austrália concordou. O governo também se ofereceu para fornecer tratamento clínico e psicológico, seguindo recomendações médicas, enquanto ele permanecesse detido.

Com base nessas garantias, a alta corte britânica permitiu que a extradição prosseguisse, observando que “o Reino Unido e os EUA têm uma longa história de cooperação em questões de extradição, e os EUA no passado forneceram garantias com frequência e invariavelmente cumpriram.”

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O tribunal também observou que uma testemunha chamada pela equipe de Assange durante o processo admitiu que o Centro de Detenção de Alexandria, onde Assange pode ser mantido na Virgínia aguardando julgamento, era uma prisão bem administrada com “um histórico estelar” na prevenção do suicídio.

Nick Vamos, um especialista em extradição de Londres, disse que a decisão de Patel não estava realmente em questão após as decisões dos tribunais. Mas Assange ainda pode convencer um tribunal superior a pesar seus argumentos de que a acusação dos EUA tem motivação política e é uma violação à sua liberdade de expressão, disse Vamos, prevendo que isso “não será o fim da batalha jurídica”.

O caso Julian Assange

Julian Assange e o WikiLeaks ganharam atenção mundial a partir de 2009, quando a plataforma publicou centenas de milhares de mensagens enviadas por pagers no dia 11 de setembro de 2001. A ONG, fundada em 2006 pelo ativista libertário australiano, permite a publicação online de documentos secretos sem identificar quem os vazou.

Pouco a pouco, as revelações se tornaram mais polêmicas e graves, como quando publicou um vídeo em que soldados americanos aparecem cometendo abusos no Iraque, e quando divulgou milhares de documentos militares sobre o Afeganistão. Em novembro de 2010, o WikiLeaks publicou, com a ajuda de cinco jornais internacionais (The New York Times, The Guardian, Der Spiegel, Le Monde e El País), mais de 250 mil documentos secretos que revelavam segredos da diplomacia americana, no episódio que depois foi batizado de “cablegate”.

Apoiadores de Julian Assange protestam contra a extradição do ativista em frente ao tribunal, no centro de Londres  Foto: Joe Klamar / AFP

As sucessivas denúncias tornaram Assange no inimigo número 1 do governo americano, que passou a tentar levá-lo a justiça, inicialmente acusando-o de hackear sistemas internos do governo americano.

Em meio às tentativas americanas, Assange precisou se defender de uma outra acusação, ligada a um suposto caso envolvendo agressões sexuais, incluindo estupro, na Suécia. Em 18 de novembro de 2010, o país nórdico emitiu um mandado de prisão internacional contra o ativista pelo caso envolvendo duas mulheres. O australiano negou as acusações e afirmou que as relações foram consentidas.

Em 18 de novembro de 2010, a Suécia emitiu um mandado de prisão internacional contra Assange, por um suposto caso de agressão sexuais, incluindo estupro, contra duas mulheres suecas em agosto do mesmo ano. O australiano negou as acusações e afirmou que as relações foram consentidas.

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Assange, que estava em Londres, entregou-se à polícia britânica em 7 de dezembro. Depois de permanecer nove dias na prisão, ele passa à prisão domiciliar. Em fevereiro do ano seguinte, um tribunal de Londres autoriza sua extradição para a Suécia.

Após esgotar todos os recursos jurídicos e temendo ser extraditado para os EUA pelas autoridades suecas, Assange pede refúgio na embaixada do Equador, em 19 de junho de 2012, e entra com um pedido de asilo político, concedido pelo então presidente, Rafael Correa. O ativista, contudo, não consegue um salvo-conduto das autoridades britânicas para deixar a embaixada em direção a Quito, permanecendo no prédio por quase sete anos.

Com a mudança de poder no país sul-americano, uma operação de captura é autorizada e a polícia britânica prende Assange em 11 de abril de 2019.

Imediatamente após a detenção, a advogada da mulher que acusava o ativista de estupro na Suécia anuncia que solicitaria a reabertura da investigação, arquivada em 2017. Os fatos que envolviam outro processo prescreveram em 2015. No mesmo mês, a Promotoria de Estocolmo anuncia a reabertura do caso, mas abandona a investigação em meados de outubro, por falta de provas.

Em maio de 2019, a justiça americana indicia Assange em 17 casos de violação da Lei de Espionagem - cujas penas somadas podem alcançar 175 anos de prisão.

Há três anos, Julian Assange está na penitenciária de segurança máxima de Belmarsh, no Reino Unido. / THE WASHINGTON POST, NYT, AP E REUTERS

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