Eu estava tentando desenvolver a resiliência do meu filho, não traumatizá-lo para o resto da vida

A 275 metros de altura em uma rocha, comecei a questionar minha estratégia parental

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Por Erik Vance
6 min de leitura

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Quando minha esposa e eu levamos nosso filho de 7 anos para escalar um pedaço de rocha de 275 metros perto de nossa casa no Colorado, pareceu uma boa ideia na época.

Tínhamos feito uma escalada de 180 metros no ano anterior, e ele tinha adorado. Esta, chamada “Rota Padrão”, no Third Flatiron em Boulder, era um pouco mais difícil - tinha a forma de um escorregador íngreme e rochoso que está ligado a um arranha-céu.

Sim, ele disse à minha esposa na noite anterior e novamente naquela manhã que estava com muito medo. Ela temia que o estivéssemos pressionando, mas insisti que continuássemos. E o garoto parecia confiante quando todos chegamos ao final da rota.

Onde está o limite entre ficar traumatizado para o resto da vida e ficar suficientemente arranhado para construir resiliência?  Foto: Antoine Maillard/The New York Times

Infelizmente, não foi tudo bem. O ângulo era íngreme demais e a coisa toda demorou cerca de duas horas a mais do que eu havia planejado. Uma nuvem de insetos no topo era quase intolerável e o equipamento nas costas envolvia uma confusão desconfortável de membros e cordas prendendo meu filho contra a rocha.

“Este é o pior dia da minha vida!” ele gritou em um momento particularmente difícil.

Não foi nosso primeiro “contratempo provocado pelo papai”, e não consigo imaginar que seja o último. Fui criado para acreditar que desafiar uma criança é uma coisa boa - meu pai sempre chamou isso de “construir o caráter”.

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Mas onde está o limite entre ficar traumatizado para o resto da vida e ficar suficientemente arranhado para construir resiliência? É uma escolha que os pais pesam todos os dias - quando abraçá-los se eles machucam o joelho e quando dar uma dose de adversidade para que se tornem fortes o suficiente para enfrentar o caminho que têm pela frente.

Para ter clareza sobre como ou onde posso ter errado, pedi conselhos a alguns especialistas.

O que é resiliência - e o que a constrói?

Resiliência é um termo popular na psicologia moderna que, simplesmente, refere-se à capacidade de se recuperar e seguir em frente após eventos adversos, falhas ou mudanças.

“Não chamamos mais isso de ‘caráter’, disse Jelena Kecmanovic, diretora do Arlington/DC Behavior Therapy Institute. “Chamamos isso de capacidade de tolerar o sofrimento, capacidade de tolerar a incerteza.”

Estudos sugerem que a resiliência nas crianças está associada a coisas como empatia, competências de enfrentamento e resolução de problemas, embora esta pesquisa seja frequentemente realizada em crianças em circunstâncias extremas e possa não se aplicar a todas as pessoas. Ainda assim, muitos especialistas estão começando a ver a construção da resiliência como uma forma eficaz de prevenir a ansiedade e a depressão dos jovens.

“Acho que muitas crianças são realmente cautelosas - talvez excessivamente cautelosas - hoje”, disse Kathy Hirsh-Pasek, psicóloga de desenvolvimento da Temple University, especialista em brincadeiras e autora de Becoming Brilliant: What Science Tells Us About Raising Successful Children (Tornando-se brilhante: o que a ciência nos diz sobre como criar filhos bem-sucedidos em tradução livre). “Vivemos numa sociedade que nos diz de forma bastante consistente que se não fizermos as coisas bem, seremos um fracasso.”

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Uma solução, de acordo com os especialistas, é encorajar a assumir riscos e encarar o fracasso, com algumas proteções em torno da segurança física e emocional. Por exemplo, é importante que as crianças tenham uma base de amor e apoio antes de saírem e correrem riscos que desenvolvam a resiliência. E elas precisam saber que serão amadas mesmo que falhem.

Encontre o ponto ideal da dificuldade

“Desafios” só são desafiadores se forem difíceis. Os psicólogos infantis falam frequentemente sobre a “zona de desenvolvimento proximal” - a área entre o que uma criança pode fazer sem qualquer ajuda e o que uma criança não pode fazer, mesmo com ajuda. Meu filho pode aprender a lançar uma bola de beisebol, mas provavelmente não uma bola rápida de forma profissional, mesmo que seu treinador seja Clayton Kershaw.

“Você coloca a barra onde ele pode agarrá-la, mas não além do seu alcance”, disse o Dr. Ken Ginsburg, fundador do Centro de Comunicação para Pais e Adolescentes do Hospital Infantil da Filadélfia e autor do livro Congrats - You’re Having a Teen! (“Parabéns - Você vai ter um adolescente!” em tradução livre). “Se colocar a barra acima do que ele pode razoavelmente alcançar, ele vai sentir-se um fracasso. E mais significativamente, como se tivesse falhado com você.”

Como posicionar a barra? Ginsburg recomenda perguntar ao seu filho: “Com o que você acha que consegue lidar? O que você acha que pode lidar comigo ao seu lado?”

Deixe que os interesses deles o guiem

A melhor maneira de desenvolver resiliência é fazer algo que você esteja motivado a fazer, não importa sua idade. Para os pais, isso significa ouvir atentamente o que entusiasma seu filho, em vez de forçá-lo a fazer o que o entusiasma.

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“Sua aventura pode não ser a aventura dele”, disse Ginsburg.

Não lhes dê sempre uma saída

Muitos de nós lembram-se de detestar os primeiros dias do acampamento de verão, agachados em uma cabana mofada, com tanta saudade de casa que tínhamos vontade de chorar. Mas alguns dias de tie-dye e canoagem depois, disse Hirsh-Pasek, aquilo se torna uma experiência de infância preciosa. Às vezes, os pais só precisam definir o que é lei e forçar os filhos a sair da sua zona de conforto, acrescentou ela.

“Se você não perseverar em algo um pouco difícil, às vezes você nunca obterá os benefícios”, disse ela.

O medo de uma escalada é bom. O medo da comunicação não é.

Minha pequena desventura com meu filho teve alguns elementos saudáveis, disse Ginsburg: estar ao ar livre, fazer meu filho ampliar suas habilidades além do que ele acha que pode fazer e comemorar sua conquista. Mas uma coisa o fez hesitar.

“O que eu não gostaria é que seu filho sentisse que não poderia dizer que aquilo era mais do que ele poderia fazer confortavelmente”, alertou. Ou que “ele teve que se encaixar em uma atividade de suposta masculinidade definida por seu pai”.

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Agora que a provação acabou, ele está orgulhoso do que fez - ele ainda se gaba disso e sorri no carro quando a montanha aparece. No final das contas, não consigo imaginar uma mudança tão grande em minha estratégia parental. Se meu filho tiver uma experiência verdadeiramente fortalecedora para cada fracasso, eu consideraria isso um sucesso.

Mas é crucial que eu mostre (e diga) a ele que não importa o que ele faça, ele não perderá meu amor e respeito. E, à medida que ele cresce, preciso garantir que nossas aventuras sejam desafios que ele queira vencer tanto quanto eu. Meu filho adora água, então talvez da próxima vez tentemos um bom dia de caiaque. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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