Tratamentos hormonais para a menopausa podem aumentar o risco de demência?

Um novo estudo sugere uma ligação, mas especialistas alertam que há mais a se considerar

PUBLICIDADE

Por Alisha Haridasani Gupta

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Um grande novo estudo na Dinamarca sugeriu que a terapia hormonal - que as mulheres usam para controlar os sintomas da menopausa - foi associada a um risco aumentado de desenvolver o mal de Alzheimer e outros tipos de demência. O estudo descobriu que o risco aumentado estava presente mesmo em mulheres que iniciaram a terapia aos 55 anos ou menos e em usuárias de curto prazo.

Última menstruação da mulher ocorre, em média, entre 45 e 55 anos de idade, dando início à menopausa, período em que muitas mulheres passam por reposição hormonal. Foto: Pixabay

PUBLICIDADE

Os autores do estudo alertaram que não foi possível distinguir entre os efeitos dos hormônios e os sintomas da menopausa que levaram as mulheres a procurar tratamento que, por sua vez, estariam associados a um risco aumentado de demência. E na mesma revista onde o estudo dinamarquês foi publicado, pesquisadores da Mayo Clinic e da Harvard Medical School publicaram um editorial, intitulado A Causal Link Remains Unlikely (Um vínculo causal permanece improvável), observando que o estudo não forneceu evidências de que a terapia hormonal causa Alzheimer ou outras demências.

Usando o registro nacional da Dinamarca, o estudo examinou os registros médicos de mais de 5.500 mulheres que foram diagnosticadas com demência e Alzheimer entre 2000 e 2018 e os comparou com mais de 55.800 mulheres que não foram diagnosticadas com as doenças. O estudo descobriu que as mulheres que usaram hormônios tiveram uma taxa 24% maior de demência (incluindo Alzheimer) do que as mulheres que não usaram hormônios.

As descobertas ecoam estudos anteriores que identificaram algumas associações entre tomar hormônios para os sintomas da menopausa e demência, alguns dos quais tinham limitações semelhantes ao estudo atual. Em 2003, a Women’s Health Initiative nos EUA descobriu que mulheres com 65 anos ou mais em terapia hormonal tinham um risco maior de desenvolver demência do que aquelas que tomavam placebo.

Publicidade

“Como acontece com qualquer tratamento farmacêutico, a terapia hormonal também tem efeitos colaterais”, disse o Dr. Nelsan Pourhadi, pesquisador do Centro Dinamarquês de Pesquisa em Demência do Hospital Rigshospitalet da Universidade de Copenhague e principal autor do estudo recente. “Isso deve ser ponderado em relação aos benefícios.”

O Dr. Pourhadi observou que este estudo e outros semelhantes não deveriam alarmar tanto as mulheres a ponto de elas abandonarem seus tratamentos de terapia hormonal. Na semana passada, a North American Menopause Society (Sociedade Norte-americana de Menopausa) enviou um aviso aos seus membros, que são profissionais certificados, de que o estudo “não deve mudar a prática”, disse a Dra. Stephanie Faubion, diretora médica da N.A.M.S. e diretora do Centro de Saúde da Mulher da Mayo Clinic.

O estudo, ela acrescentou, é uma fonte de incerteza e medo, mas não fornece muitas informações úteis.

A redução dos níveis de hormônios provocamondas de calor, que prejudicam a maioria das mulheres nesta fase. Foto: Georgie Pauwels/ Creative Commons

Fatores de confusão

A maior limitação do estudo é que ele foi observacional, disse a Dra. Faubion, e, portanto, incapaz de estabelecer uma relação de causalidade.

Publicidade

Alguns especialistas sugerem que a verdadeira conexão pode estar entre os sintomas da menopausa e a demência. “Se você tem sintomas da menopausa - ondas de calor, insônia, depressão, confusão mental - é mais provável que queira usar hormônios”, disse a Dra. Lisa Mosconi, diretora do Programa de Prevenção de Alzheimer da Weill Cornell Medicine. Estudos demonstraram que esses sintomas têm uma ligação com o desenvolvimento do Mal de Alzheimer e outras demências.

Por exemplo, as ondas de calor têm sido associadas à quantidade de hiperintensidades da substância branca, que são pequenas lesões na parte do cérebro contendo as fibras que conectam as células neuronais, disse a Dra. Mosconi. Um estudo publicado no ano passado mostrou que taxas mais altas de ondas de calor estavam ligadas a um aumento na quantidade de hiperintensidades da substância branca. As lesões são “consideradas um fator de risco para demência”, disse a Dra. Mosconi. (Não está claro se as ondas de calor causam danos ao cérebro ou se as ondas de calor e os danos à substância branca compartilham uma causa subjacente.)

A insônia na meia-idade - que pode ser causada por suores noturnos - é considerada um fator de risco para o desenvolvimento de doenças neurodegenerativas mais tarde na vida. “Certas proteínas, que são as precursoras do Mal de Alzheimer, se acumulam ao longo do dia no cérebro. E quando dormimos, na verdade há uma onda mecânica, como uma onda no oceano, que as empurra para fora do cérebro”, disse a Dra. Pauline Maki, diretora do Programa de Pesquisa em Saúde Mental Feminina da Universidade de Illinois em Chicago. “Sabemos que muitas mulheres sofrem com as ondas de calor sem tratamento por anos e anos e têm problemas para dormir noite após noite - então essa também é uma consideração importante.” Estudos ainda precisam mostrar que a insônia causada especificamente por suores noturnos é um fator de risco para demência, mas é uma área de pesquisa em andamento, disse a Dra. Maki.

A depressão na meia-idade - outro sintoma comum da menopausa - também é considerada um fator de risco para o desenvolvimento de demência mais tarde na vida.

Publicidade

O estudo dinamarquês não esclarece se essas questões subjacentes levaram as mulheres a procurar terapias hormonais inicialmente, nem considerou a predisposição genética para o desenvolvimento do Mal de Alzheimer, ambas as quais o Dr. Pourhadi reconheceu serem explicações viáveis para seus resultados.

Evidências contraditórias

Assim como existem estudos anteriores que mostram uma ligação entre terapia hormonal e doenças neurodegenerativas, há uma série de estudos que mostram o contrário: que a terapia hormonal está associada a um risco reduzido de desenvolver demência e Alzheimer, disse a Dra. Mosconi. Um estudo observacional, publicado em 2021, analisou os registros médicos de quase 380.000 mulheres e descobriu que o uso prolongado de terapia hormonal teve um aparente “efeito protetor” contra doenças neurodegenerativas em geral.

E, acrescentou a Dra. Mosconi, três estudos separados que deram aleatoriamente às mulheres terapia hormonal ou um placebo - que é considerado o padrão-ouro para determinar os efeitos dos medicamentos - descobriram que o uso de hormônios não teve efeitos negativos sobre a cognição. Esses estudos, incluindo um publicado em 2013 que analisou novamente os dados da Women’s Health Initiative nos EUA, concluíram que iniciar a terapia hormonal aos 55 anos ou menos foi um fator importante na mitigação dos efeitos negativos na cognição.

Em alta
Loading...Loading...
Loading...Loading...
Loading...Loading...

Os especialistas também observaram que o estudo dinamarquês apenas analisou os efeitos de uma formulação específica de hormônios - estrogênio com progestógenos sintéticos - enquanto outras formulações, como progesterona bioidêntica ou, para mulheres que fizeram histerectomia, apenas estrogênio, podem ter resultados muito diferentes, disse a Dra. Faubion. “Nós agrupamos a terapia hormonal em um único grupo e realmente não deveríamos”, disse ela. “São todos compostos químicos muito diferentes e não afetam o corpo da mesma maneira, por isso devemos parar de nos referir a eles como uma entidade única”. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

Comentários

Os comentários são exclusivos para cadastrados.