Em 2021, um estudo brasileiro liderado por Gatti et al. indicou que a Amazônia se aproximava de um ponto crítico de inflexão devido às mudanças climáticas e à ação humana. Foi o primeiro trabalho a utilizar medições atmosféricas diretas para identificar variações sazonais e regionais no balanço de carbono, atribuindo-as à seca, ao fogo, ao desmatamento e à degradação florestal.
Era um aviso crítico, mas fora da academia poucos prestaram atenção. Preso em jargões científicos e PDFs, o grito não ecoou. Alguns meses depois, o orçamento do INPE, que monitora a floresta, caiu cerca de 30%. A ciência falou, mas o mundo que ela tentava salvar ignorou.

Vivemos atualmente uma contradição profunda. Ao mesmo tempo em que o conhecimento científico atinge níveis inéditos de sofisticação e oferece benefícios tangíveis, como vacinas revolucionárias e algoritmos que já ultrapassam humanos em várias tarefas cognitivas, vemos um afastamento crescente entre a ciência e a sociedade.
O resultado é uma crise existencial para a prática científica. Suas conquistas têm sido questionadas ou ignoradas por uma parcela significativa da população e, consequentemente, por tomadores de decisão cada vez menos inclinados a investir em pesquisa.
Nos Estados Unidos, a situação atual é alarmante. O orçamento federal para pesquisa científica em agências como a National Science Foundation (NSF) e os National Institutes of Health (NIH) vem sofrendo reduções quase semanais. Esses cortes, justificados por prioridades econômicas de curto prazo, ignoram o papel da ciência como o principal motor de inovação e produtividade. Universidades e laboratórios já relatam demissões e interrupções em estudos sobre clima, saúde e tecnologia, enquanto a necessidade global por mais avanços científicos só aumenta.
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A realidade é que a marcha anti-ciência tem avançado rapidamente, e a sociedade, que depende da ciência como nunca, a entende cada vez menos. Fechar esse abismo exige começar a falar a linguagem de hoje: vídeos curtos, redes sociais e narrativas que engajam.
Um reel de apenas 30 segundos pode mostrar a curva de desmatamento e explicar o seu risco com dados reais. Uma analogia carrega peso se vier com fatos, não só emoção. Se influencers políticos conseguem usar narrativas dramáticas para viralizar fake news, por que não conseguimos usar a linguagem das redes sociais para explicar as mudanças climáticas?
Nas universidades, treinamos cientistas para conduzir experimentos, mas não para contar histórias. Precisamos de treinamento em comunicação científica — transformar um gráfico num tuíte deveria ser tão natural quanto publicá-lo num artigo. Se não redefinirmos a nossa voz, a ciência ficará irrelevante para quem ela serve.