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‘Podcasts falsos’ invadem redes sociais na busca por seguidores

Vídeos que simulam entrevistas viram estratégia na busca pela fama nas redes sociais; estúdios recebem demanda de gravação do formato

Foto do author Bruna Arimathea
Por Bruna Arimathea
Atualização:

Embora seja um formato ancorado no áudio, podcasts de entrevistas se popularizaram nos últimos anos nas transmissões em vídeo das conversas — os chamados “videocasts”. Mais ainda: ganharam força também os “cortes”, vídeos curtos e editados que exibem os melhores momentos dos papos. Virou um formato tão chamativo que participar de um podcast e aparecer nos canais de cortes virou atalho para acumular seguidores e tentar a sorte de viralizar na internet.

Porém, assim como era um convite para o famoso sofá de Jô Soares, as oportunidades para dar entrevistas podem ser pouco frequentes. Para dar um jeito nisso, uma nova onda começou a dar as caras nas redes sociais: os “podcasts fakes”, pequenos vídeos que imitam os “cortes” e simulam a participação em programas de conversas — às vezes, o “entrevistado” está falando com a própria parede.

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Filipe Penoni, 23, foi um dos pioneiros na estratégia no Brasil. Em 2021, o influenciador, que conta com mais de 1,2 milhão de seguidores no TikTok, percebeu o sucesso dos videocasts. Com vontade de ser entrevistado — mas sem nenhum convite —, Penoni resolveu gravar a si mesmo com um microfone na mão: uma das publicações, em que fala sozinho, rendeu cerca de 1,5 milhão de visualizações.

“Sempre consumi muito conteúdo no TikTok e Instagram. Vi que os cortes estavam bombando e decidi criar o meu próprio, mesmo nunca tendo ido a nenhum podcast. Postei uns quatro em uma semana e as pessoas estavam pedindo o link da entrevista completa. Elas estavam acreditando”, conta Penoni ao Estadão.

Filipe Penoni revelou para seus usuários sobre o 'podcast fake' que publicou em 2021 e ensinou como produzir Foto: Leo Luz

Mas a intenção não era enganar ninguém. Depois que os vídeos viralizaram, Penoni respondeu aos seguidores que a publicação era apenas uma simulação e fez um tutorial de como gravar seu próprio podcast em casa. “O vídeo viralizou e empresas começaram a fazer esse tipo de corte também. Chegou a um ponto em que havia mais cortes de podcast fake do que dos reais”, lembra.

Autoridade

Existe um motivo pelo qual tantas pessoas aderiram ao método para tentar aumentar suas visualizações. O Brasil é, hoje, um dos maiores mercados de podcast do mundo: segundo o Spotify, 40% dos usuários de internet no País escutam o formato — a plataforma de dados Statista coloca o Brasil como o terceiro maior consumidor de podcast do mundo, atrás de Suécia e Irlanda.

Durante a pandemia, o formato ganhou ainda mais força acompanhado de vídeo. Alguns deles, como o “Quem pode, Pod”, das atrizes Fernanda Paes Leme e Giovanna Ewbank, ou o “PodPah”, dos influenciadores Igor Cavalari e Thiago Marques, atingiram milhões de seguidores em diversos agregadores do formato. Logo, virou um palco para repercutir assuntos e demonstrar prestígio.

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“Os podcasts remetem a uma questão de humanização da conversa, então conseguem transferir autoridade pela forma como foram criados. E o influenciador consegue colocar coisas em contextos nos quais, em uma conversa normal, não caberiam por serem fora de uma conversa habitual”, explica ao Estadão Rafael Arty, diretor de negócios da agência especializada em marketing de influência Squid.

Assim, o “atalho” dos cortes fakes para fama digital movimentam estúdios de gravação. Luciana Oncken é dona do estúdio Banca, em São Paulo, e conta que já recebeu pedidos para gravar cortes para as redes sociais. “Sempre tentei convencer os clientes a produzir, de fato, um podcast real. O trabalho é o mesmo e é uma questão de credibilidade”, afirma.

Dona de um estúdio em São Paulo, Luciana Oncken já recebeu pedidos para produzir “podcasts fictícios”; ela tenta convencer os clientes a não gravarem apenas os "cortes", mas entrevista inteiras Foto: Werther Santana/Estadão

Quem também já prestou esse serviço foi Gustavo Passi, podcaster e dono do estúdio Voz e Conteúdo. Com salas disponíveis para gravação, o empresário conta que, desde fevereiro deste ano, os pedidos para a produção de cortes para as redes sociais aumentaram significativamente, se comparado com 2021.

“É comum o cliente entrar e sair gravando para a câmera como se fosse um podcast, mas é aí que mora a sensibilidade. Algumas pessoas simulam. Outras chegam dizendo: ‘Quero ser entrevistado e quero os cortes’”, afirma Passi.

A observação de Passi encontra eco na opinião de profissionais que traçam estratégias para redes sociais. A fórmula, por exemplo, começou a ser replicada pelo mundo do marketing corporativo. “(Fazer o podcast) é uma baita estratégia, porque tem tudo: áudio para as plataformas de podcast, vídeo para YouTube e cortes de Reels e TikTok”, diz Passi.

(Fazer o podcast) é uma baita estratégia, porque tem tudo: áudio para plataformas de podcast, vídeo para YouTube e cortes de Reels e TikTok”

Gustavo Passi, podcaster e dono do estúdio Voz e Conteúdo

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Verdadeiro ou falso?

Ainda assim, é preciso cuidado antes de se empolgar com o sonho dos cortes próprios. Ao mesmo tempo que o videocast evoca a sensação de credibilidade, a “mentira”, quando levada a sério pelo telespectador, pode cair mal. Esse é um dos principais pontos a ser considerado antes de embarcar no trem dos podcasts falsos, segundo Paulo Cesar Dias, diretor de estratégia da Eyxo, agência de conteúdo e marketing de criação em redes sociais.

“Se essa relação é baseada em confiança e em algum momento eu estou induzindo você ao erro, isso gera um ruído na comunicação que pode ser muito prejudicial. Por mais que os algoritmos tenham uma lógica que beneficia o ‘hit’, não faz sentido entrar em tendências que não contemplem o conteúdo do seu público”, explica.

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