A empresa de tecnologia D-Wave anunciou ter atingido a supremacia quântica ao realizar uma simulação de materiais magnéticos supostamente inalcançável por computadores tradicionais. O estudo, publicado na quarta-feira, 12, na revista Science, foi recebido com ceticismo por parte da comunidade científica, que questiona a validade da afirmação.
Supremacia quântica é o termo usado para descrever o momento em que um computador quântico executa uma tarefa impossível para um supercomputador clássico - em 2019, o Google foi a primeira companhia a afirmar ter realizado o feito. A D-Wave afirma ter conseguido esse feito ao modelar o comportamento de materiais magnéticos em menos de 20 minutos, enquanto um supercomputador tradicional levaria quase um milhão de anos para executar o mesmo processo.

O conceito de computação quântica baseia-se no uso de bits quânticos, ou qubits. Na computação clássica, usada por PCs e smartphones atuais, toda e qualquer informação é armazenada ou processada na forma de bits – que podem ser representados por 0 ou 1. Mas, na quântica, os chamados qubits podem assumir inúmeros estados entre 0 e 1, num fenômeno chamado superposição. Isso aumenta exponencialmente a quantidade de informação que pode ser processada ao mesmo tempo.
A D-Wave tem se destacado por utilizar a técnica de “quantum annealing”, voltada para solução de problemas de otimização. Segundo Alan Baratz, CEO da empresa, a simulação de materiais magnéticos é um avanço significativo, com aplicações na produção de sensores, motores e dispositivos médicos.
A reivindicação, no entanto, enfrenta contestação. Miles Stoudenmire, pesquisador do Instituto Flatiron, publicou um estudo sugerindo que métodos clássicos mais recentes poderiam atingir resultados semelhantes. “Esse problema, dessa vez, não venceu os computadores clássicos. Tente de novo”, disse Stoudenmire.
Devido a complexidade dessas máquinas, os resultados divulgados pelas empresas são normalmente recebidos com ceticismo. O Google também afirmou ter atingido a supremacia quântica em 2019, com o processador Sycamore. A empresa declarou que seu chip foi capaz de executar em 200 segundos um cálculo que levaria milhares de anos em um supercomputador tradicional. Na época, o estudo também foi alvo de críticas, incluindo contestações da IBM, que sugeriu que o problema poderia ser resolvido por métodos clássicos aprimorados.
Outras grandes empresas do setor, como Amazon e Microsoft, também avançam na corrida pela computação quântica. Em fevereiro, a Microsoft anunciou a criação de um novo estado da matéria para melhorar a estabilidade dos qubits, um dos maiores desafios na área, mas também tem seus resultados contestados de forma ampla na comunidade científica.
A D-Wave defende que seus experimentos comprovam a vantagem dos computadores quânticos sobre os clássicos. Trevor Lanting, diretor de desenvolvimento da empresa, rebateu as críticas, afirmando que “a capacidade de recriar todo o conjunto de resultados que produzimos não é possível classicamente”. A companhia não revelou qual de seus processadores e nem quantos qubits foram utilizados no experimento.
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Conceito de ‘supremacia quântica’ vem sendo discutido
O debate sobre a validade do conceito de supremacia quântica também está em curso. De acordo com um artigo publicado na Scientific American, especialistas apontam que o termo tem sido substituído por expressões como “vantagem quântica” ou “utilidade quântica”, que enfatizam a capacidade de resolver problemas científicos e empresariais de forma mais eficiente do que os computadores tradicionais. Até aqui, a expressão “supremacia quântica” foi usado para problemas complexos mas sem utilidade no mundo real.
A nomenclatura empregada na ciência pode ter impactos que vão além do meio acadêmico, refletindo questões sociais e culturais mais amplas. O termo “supremacia quântica”, usado para descrever a capacidade dos computadores quânticos de superar os clássicos em determinadas tarefas, tem sido criticado por suas conotações problemáticas. Além da associação direta com “supremacia branca”, o termo pode sugerir um domínio absoluto da tecnologia quântica sobre a computação tradicional, algo que não é necessariamente verdade.
O conceito foi introduzido em 2012 pelo físico John Preskill, que admitiu desde o início não estar completamente satisfeito com a escolha das palavras. Desde então, pesquisadores e especialistas têm sugerido alternativas como “vantagem quântica” ou “primazia quântica”, buscando um termo mais preciso e menos carregado de significados indesejados. A preocupação não é apenas terminológica, mas também científica, uma vez que a computação quântica ainda enfrenta desafios significativos e não elimina a relevância dos computadores clássicos.