Os oceanos são uma grande fonte potencial de energia. E eu não estou falando do petróleo da camada pré-sal. O movimento das ondas, das marés e das correntes marinhas e as diferenças de temperatura e da salinidade das águas podem ser convertidos em energia elétrica. Mas a tecnologia para isso tudo não foi totalmente dominada. Existem vários projetos-piloto no mundo, sem que se tenha encontrado uma solução viável economicamente para que os mares passem a gerar energia em larga escala.O professor Segen Estefen, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), identifica uma oportunidade para o Brasil nessa área. "Temos condição de ser competitivos no mar, já que perdemos a corrida na energia solar e na eólica", disse Estefen, diretor de Tecnologia e Inovação do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe), da UFRJ. Na semana passada, ele participou, no Recife, do 5.º Encontro Preparatório para o Fórum Mundial de Ciência 2013.Em qualquer lugar, esse é um campo novo. De acordo com o relatório "Fontes de Energias Renováveis e Mitigação da Mudança Climática", publicado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas em 2011, somente 0,002% do total da oferta de energia no mundo tem origem no mar. O Brasil tem um dos projetos de ponta nessa área. No ano passado, foi instalada no Porto do Pecém, a 60 quilômetros de Fortaleza, uma usina de ondas. Com tecnologia da Coppe, teve apoio da Tractebel e do governo do Ceará. O investimento é de cerca de R$ 15 milhões, com recursos do Programa de Pesquisa e Desenvolvimento da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).A costa brasileira tem um potencial de geração de energia de 114 gigawatts (GW). Desse total, cerca de 20% são viáveis, de acordo com o professor da UFRJ. Para se ter uma ideia do que seriam esses 22 GW, a usina hidrelétrica de Itaipu tem uma capacidade instalada de 14 GW. Os mares podem se tornar uma fonte alternativa importante de energia renovável, caso os desafios tecnológicos sejam resolvidos.A usina de ondas de Pecém é um projeto experimental, com capacidade de 100 quilowatts (um quilowatt equivale a um milionésimo de gigawatt). Segundo Estefen, a usina foi construída com tecnologia 100% nacional, desenvolvida no Laboratório de Tecnologia Submarina da Coppe. Um dos pesquisadores chegou a registrar uma patente nos Estados Unidos.O sistema tem dois módulos, cada um deles formado por uma boia com 10 metros de diâmetro e um braço mecânico de 22 metros de comprimento. As ondas fazem as boias subir e descer, e movimentam os braços mecânicos. O movimento alternado aciona uma bomba mecânica, que libera um jato com força equivalente a uma queda d'água de 400 metros, similar às das grandes hidrelétricas. O jato aciona uma turbina, que ativa um gerador e produz energia elétrica. A água desse jato não é do mar, mas água doce num sistema fechado que existe na usina.Até agora, a usina de ondas funcionou durante alguns períodos. "Agora queremos colocar o laboratório em operação contínua", disse Estefen. "O desafio é garantir a confiabilidade do equipamento e manter a usina produzindo energia." A ideia seria garantir uma produção mínima de energia, como acontece nas usinas eólicas.A tecnologia usada em Pecém surgiu no laboratório da Coppe, que também desenvolve soluções para exploração de petróleo em águas profundas. Segundo o professor da UFRJ, o próximo projeto será criar uma usina em alto-mar, no Rio de Janeiro. O projeto está sendo discutido com a Marinha e deve ser financiado por Furnas. A ideia é criar e instalar um módulo só, com investimento de cerca de R$ 8 milhões. Sem ocupar espaço na costa, que pode ser caro, a geração de energia do oceano acabaria por se tornar mais viável.Os clientes poderiam ser as próprias plataformas do pré-sal. "O petróleo ainda vai dominar por algumas décadas", reconheceu Estefen. Mas, na sua visão, a exploração de petróleo em águas profundas pode ajudar o Brasil a desenvolver e dominar a tecnologia de geração de energia do mar, preparando o caminho para o futuro.