SÃO PAULO – No dia 11 de junho moradores de Londres, Berlim, Paris e Madri viveram um dia de trânsito caótico. Taxistas pararam as principais vias dessas cidades para protestar contra um aplicativo de smartphone. Para quem desconhecia a plataforma, a manifestação poderia soar exagerada. Mas para aqueles profissionais era questão de sobrevivência. O alvo da ira era o Uber, plataforma que conecta passageiros a motoristas profissionais ou amadores.
O app americano que estaria tirando clientes de taxistas do mundo todo acaba de chegar a São Paulo e ao Rio de Janeiro de forma discreta. Após se instalar em outros 37 países e 138 cidades, recebeu um investimento de US$ 1,2 bilhão, que elevou seu valor de mercado para incríveis US$ 18,2 bilhões. Com essa avaliação o Uber se tornou a startup mais valiosa do mundo, superando marcas tradicionais de aluguel de veículos como a Hertz (vale US$ 12 bilhões) e a Avis (US$ 6 bilhões).
Estrago similar causou o site de aluguel de quartos e imóveis por temporada Airbnb, que permite a qualquer um hospedar turistas. Segunda startup mais valiosa do mundo (vale US$ 10 bilhões), e principal inimiga das redes hoteleiras, só no Rio de Janeiro o Airbnb teria 40 mil leitos, o equivalente a cerca de 50% da capacidade hoteleira.
Em comum, além do crescimento estrondoso, está o fato de que as duas maiores startups da atualidade fazem parte da chamada economia compartilhada, conceito que promove negócios que intermedeiam a prestação de serviços ou troca de produtos entre pessoas físicas (veja exemplo ao lado), a partir de recursos subutilizados. As duas empresas são apenas os maiores exemplos de uma série de negócios colaborativos que estão pipocando pelo mundo.
“A crise de 2008 serviu como oportunidade para esses projetos terem início. As pessoas perceberam que essas empresas oferecem outros valores, como o ganho cultural de receber alguém de outra nacionalidade, e adotaram esses serviços”, diz Victor Reimann, da Engage, que desenvolve projetos na área.
Somado a isso há também fatores conjunturais como o aumento do número de usuários da internet. “O surgimento do mundo dos apps e de sistemas de pagamento móvel contribuíram para criar um cenário em que esses negócios dão certo”, diz o CEO do fundo A5 Investments, Paulo Humberg.
OportunidadeA Forbes estima que a economia colaborativa gera uma receita anual de US$ 3,5 bilhões para os usuários desses serviços, valor que deve crescer 25% ao ano. “Não é uma tendência, mas uma mudança na maneira em que vivemos. A população das cidades está crescendo, tornando espaço físico algo valioso sobre o qual vamos pensar bem antes de desperdiçar”, diz Lisa Gansky, autora de um livro sobre economia compartilhada e do site Mesh. “Há milhares de plataformas sendo criadas mundialmente.”
Na semana passada, a francesa BlaBlaCar, que ajuda motoristas com espaço vazio no carro a encontrar passageiros para rachar as despesas de uma viagem recebeu uma rodada de investimento de US$ 100 milhões. O serviço já funciona em 12 países e tem 8 milhões de usuários. Já o site americano Storefront ajuda artistas e marcas a alugar um ponto de venda, que pode variar de um pequeno espaço em uma butique até uma loja inteira, negociando diretamente com o proprietário. Outros negócios semelhantes se propõem a ajudar usuários a encontrar escritórios ou um lugar para estacionar na casa de alguém. “A tecnologia tornou fácil e barato conectar pessoas e coisas. O público perdeu a confiança em marcas estabelecidas e abriu portas para outras ofertas”, diz Lisa.
Por destruir um mercado antigo para criar um novo, a economia compartilhada enfrenta resistência. Negócios tradicionais acusam essas empresas de ilegalidade, competição desleal (por não pagar os mesmos impostos), de oferecer riscos à segurança dos usuários e criar um modelo que trará desemprego.
“As leis de hoje foram criadas em uma época em que celulares e aplicativos não existiam e beneficiam indústrias estabelecidas, e não o consumidor”, disse ao Estado o chefe de comunicação do Uber, Lane Kasselman. “O que fazemos é algo totalmente novo. Apoiamos que exista regulamentação, mas antes pedimos para os governos atualizarem a legislação e reconhecer que há uma nova indústria”, afirma. Na semana passada, o Uber conquistou uma importante vitória: a cidade de Londres reconheceu a legalidade do serviço. / COLABOROU CAMILO ROCHA
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