A missão de colocar o novo Código Florestal em prática

Artigo originalmente publicado no Estadão Noite

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Por Luiz Gustavo Bezerra
Atualização:

Depois de mais de uma década tramitando no Congresso Nacional, em 2012, finalmente foi reformada a legislação florestal brasileira. O Código Florestal de 1965, já muito remendado, deu lugar à Lei 12.651/12. Muitos desacreditavam nesta reforma, outros grupos polarizaram a discussão, mas o fato é que a nova legislação florestal brasileira finalmente foi sancionada e entrou em vigor. Obviamente, não sem antes ser objeto, ainda no berço, de vetos presidenciais, alterações por medida provisória, meses depois convertida em lei, que já modificava a nova legislação florestal mal saída da maternidade. Isso, sem mencionar as ações diretas de constitucionalidade pendentes de julgamento de mérito no STF.

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Vida de legislação recém-nascida no Brasil não é nada fácil. Mais ainda, legislação tão crucial para o agronegócio e promissor setor florestal, apenas para mencionar alguns. Foram mais dois anos de espera para que fosse publicada, em 6 de maio deste ano, a Instrução Normativa nº 2 (IN) do Ministério do Meio Ambiente (MMA), que implementou formalmente o bendito Cadastro Ambiental Rural (CAR). Segundo o governo federal, essa espera foi necessária para estruturação e treinamento de órgãos ambientais e demais atores envolvidos na inscrição e fiscalização do CAR. Inaugurou-se, finalmente, o prazo de 1 ano para inscrição no CAR de todos os imóveis rurais.

Com toda a euforia da Copa, já se foram 3 meses e restam 9 meses, uma gestação humana, para se esvair o prazo para inscrição no CAR. O registro do imóvel rural no CAR é nacional, único e permanente, constituído por um código composto de identificação numeral sequencial, da unidade da federação e do código de identificação do município em que o imóvel se insere. O objetivo do CAR é identificar passivos e pendências em relação a área de preservação permanente (APP) e reserva legal de um imóvel rural.

Merece destaque o fato de que a IN preencheu uma importante lacuna da legislação florestal ao trazer a definição expressa de “imóvel rural”, entendido como o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja sua localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial. Nos termos da IN, os proprietários ou possuidores de imóveis rurais que possuem mais de uma propriedade ou posse em área contínua deverão efetuar uma única inscrição - eliminando a interpretação de que a inscrição no CAR deveria ser realizada por matrícula.

Outro importante diploma legal promulgado quase em conjunto com a referida IN foi o Decreto nº 8.235, que estabelece normas gerais complementares aos Programas de Regularização Ambiental (PRA). Em linha com a nova legislação florestal de 2012, o proprietário ou possuidor de imóvel rural com passivo ambiental somente poderá aderir aos PRAs mediante prévia inscrição no CAR.

Assim como a IN, o decreto também tratou de sanar lacunas, particularmente aquela relacionada à compensação de reserva legal. Nos termos do Código Florestal, a compensação de reserva legal fora do Estado de origem somente pode ocorrer quando a área utilizada para compensação estiver localizada em “áreas identificadas como prioritárias pela União ou pelos Estados”. Contudo, não havia definição do que seriam tais áreas prioritárias. O novo decreto estabelece que áreas prioritárias são (i) aquelas definidas pelo MMA; (ii) as unidades de conservação de domínio público pendentes de regularização fundiária; (iii) áreas que abriguem espécies migratórias ou ameaçadas de extinção, segundo lista oficial publicada por órgãos do Sisnama; e (iv) áreas identificadas pelos Estados e Distrito Federal.

Por fim, o decreto estabelece que, no prazo de um ano, será editado ato que disciplinará o programa para conversão das multas aplicadas por desmatamentos ocorridos sem licença ou autorização, em áreas onde não era vedada a supressão de vegetação à época - antes de 22 de julho de 2008. Outras tantas regulamentações ainda estão pendentes, como a prevista para o progressivo capítulo de instrumentos econômicos da Lei 12.651/12, quase esquecidos por todos aqueles que hoje discutem a nova legislação florestal.

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Pois não podem ser esquecidos. Os instrumentos econômicos podem ser os grandes garantidores do sucesso da nova legislação. Apenas para mencionar um destes instrumentos, a Cota de Reserva Ambiental (CRA), como título representativo de compensação da reserva legal para aqueles que desmataram antes de 22 de julho de 2008, ainda não recebeu a devida atenção, particularmente das empresas que se beneficiarão com a regularização de suas terras e as de seus fornecedores e parceiros.

Empresas, entidades representativas, investidores, consumidores, entes federativos e cidadãos, todos fomos incumbidos pela Constituição de 1988 da proteção do meio ambiente e da promoção do desenvolvimento sustentável. Coloquemos em prática, finalmente, o plano de tornar efetiva e eficaz uma legislação que nasceu a fórceps, mas que, reconhecidos os seus defeitos de nascença, é uma legislação saudável para o Brasil que queremos. * Luiz Gustavo Bezerra é sócio responsável pela área ambiental de Tauil & Chequer Advogados

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