Análise - Desafios e limites do governo Temer

Texto publicado originalmente no Estadão Noite

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Por Marco Antonio Carvalho Teixeira e Gustavo Andrey Fernandes
Atualização:

O afastamento provisório de Dilma Rousseff representa o fim de uma etapa que se iniciou após os resultados das eleições presidenciais de 2014. Naquele momento, Aécio Neves e o PSDB estimularam indiretamente o ímpeto dos movimentos antipetistas ao questionarem a lisura do resultado eleitoral. O tucano afirmou, publicamente, que teria sido derrotado por uma organização criminosa, quando se referiu ao PT e seus aliados, obviamente incluindo o PMDB. O abismo entre oposição e situação também ficou claro nas vozes vindas do Planalto, visto que em seu discurso de vitória, Dilma em nenhum momento mencionou Aécio. Com a aprovação da admissibilidade do processo de impeachment pelo Senado e o afastamento da presidente por até 180 dias, tornou-se praticamente nula a possibilidade do seu retorno após a conclusão dos trabalhos da comissão que ficará incumbida de avaliar o afastamento definitivo. Mesmo precisando de apenas 27 senadores (de 81) votando contra a sua cassação, a petista continuará sob fogo cruzado da imprevisível Lava Jato e certamente vai enfrentar um grau de isolamento político ainda maior, uma vez que vai ficar privada de recursos governamentais, em um ano de eleições municipais.  Além disso, Dilma e o PT deverão ser bombardeados no período eleitoral por seus opositores ávidos por faturarem votos com o episódio do impedimento, o que ocorrerá quase que de maneira simultânea à conclusão dos trabalhos da comissão e a votação do impeachment no plenário do Senado. De todo modo, o País segue, e Temer, antes aliado petista e igualmente atacado pelo PSDB, agora governa com o apoio dos tucanos.  O desafio imediato do governo peemedebista é melhorar o ambiente econômico a ponto de voltarem os investimentos e de estancar rapidamente o crescimento do desemprego. Se isso ocorrer, ele ganhará fôlego para fazer reformas estruturais necessárias como a Tributária e a da Previdência. Caso contrário, a crise política permanecerá e vai enfraquecer o seu governo, a ponto de representar um obstáculo às mudanças que possam retirar ativos que ainda são controlados pela classe política.  No momento, Temer ainda parece estar tateando e talvez não tenha ambiente político necessário para tocar mudanças substantivas e estruturais no governo. Por exemplo, a reforma ministerial que ele sinaliza com a redução do número de pastas mais parece baseada em intuição do que em justificativas sólidas. É mais um discurso para sinalizar alguma mudança do que de fato um conjunto de medidas concretas. Apesar de ser necessária e recebida de maneira positiva pela sociedade, tal reforma ainda não convence do ponto de vista do equilíbrio necessário entre a dimensão técnica e o interesse social.  Por exemplo, para quem conhece a dinâmica pública, colocar Educação e Cultura numa mesma pasta é indicar o enfraquecimento das duas áreas. É voltar para o passado e tratar a política cultural, ou pior, educacional de forma secundária. A medida, aliás, por si só, não traz nenhum ganho em eficiência, eficácia e economicidade da política pública. Bom lembrar que parte da boa imagem que o País preserva no mundo tem a ver com seus elementos culturais e que as deficiências em educação são um dos maiores obstáculos para o desenvolvimento. Uma outra proposta, trazer a Previdência para a Fazenda, sinaliza que o governo vai tratar de uma temática importantíssima do ponto de vista social, mais pelo viés do equilíbrio financeiro do que em relação ao que representa o pacote de benefícios previdenciários para a sociedade. Além disso, para piorar as coisas, coloca em uma só pasta, nos ombros de apenas um ministro, o peso de negociar difíceis reformas de um dos sistemas previdenciários mais complexos e injustos do mundo. Inúmeras são as questões em aberto. É bem verdade que o desfecho do impeachment deverá trazer alguma melhoria no curto prazo, em virtude da redução de incertezas. No médio e no longo prazo, uma plataforma que se resume a uma dança das placas dos ministérios, além de vagas propostas constantes no programa 'Ponte para o Futuro', indica que o fim da crise ainda está muito distante.* Marco Antonio Carvalho Teixeira, cientista político e professor de administração pública da FGVSP e Gustavo Andrey Fernandes, economista e professor de economia do setor público da FGVSP