PUBLICIDADE

As lições de Londres 2012 para os Jogos do Rio 2016

Autoridades, atletas, observadores e torcedores apontam erros e acertos da experiência olímpica britânica que podem inspirar o Brasil.

Por Ruth Costas
Atualização:

A Olimpíada atraiu as atenções internacionais para a capital britânica, mas o Brasil observou os Jogos de Londres com um olhar um pouco mais cuidadoso que o de outros países. A cada competição, cada intervalo ou cada problema logístico que ganhou as manchetes dos jornais locais, autoridades brasileiras tentaram encontrar respostas para uma pergunta-chave: o que podemos aprender com a experiência olímpica britânica para garantir o sucesso dos Jogos no Rio em 2016? Para responder a essa questão, muitas dessas autoridades brasileiras acompanharam diversos aspectos da organização e implementação Jogos de Londres. Atletas veteranos de várias Olimpíadas e chefes de delegações esportivas também foram frequentemente consultados sobre suas impressões. Além disso, com a colaboração britânica, dois programas de observadores foram implementados para facilitar o fluxo de informações do atual anfitrião dos Jogos para os brasileiros. O primeiro trouxe à Grã-Bretanha cerca de cem funcionários do governo brasileiro. O segundo, com aproximadamente 150 integrantes, estava ligado ao comitê organizador da Rio-2016 e permitiu três tipos de esquemas de observação: a simples visita a estádios e escritórios administrativos, o acompanhamento de funcionários britânicos durante o seu dia de trabalho e o envolvimento ativo em tarefas ligadas à gestão dos Jogos de Londres. A BBC Brasil entrevistou algumas dessas autoridades, funcionários de órgãos envolvidos na organização da Rio-2016, atletas veteranos e torcedores brasileiros para entender quais são as lições que o Brasil pode tirar dos erros e acertos britânicos. A lista abaixo, resultado dessa apuração, expõe os desafios que o País tem pela frente. A percepção geral é de que, salvo falhas pontuais, a Grã-Bretanha levou ouro na organização os Jogos - e será uma tarefa difícil para o Rio alcançar o mesmo padrão na gestão da sua Olimpíada, em 2016. Como definiu com entusiasmo o ex-jogador de vôlei e chefe da Missão do Brasil na Olimpíada, Bernard Rajzman, que já participou de oito Olimpíadas, como atleta ou dirigente: "Em termos de organização, agora Londres concorre com Barcelona, Sidney e Pequim pelo título de melhor Olimpíada da história moderna dos Jogos." Transportes Na área de transportes, os problemas em Londres foram bastante localizados, como a paralisação, por algumas horas, da linha Central do metrô, que leva ao Parque Olímpico, em um dos dias mais movimentados dos Jogos; ou o fato de que alguns dos motoristas disponibilizados para os atletas e membros de delegações olímpicas não conheciam muito bem as ruas de Londres, como destaca Rajzman. No geral, porém, o sistema de transporte da cidade aguentou bem o fluxo de fãs do esporte que se dirigiam para os principais locais de competição, como destacou o mesa-tenista brasileiro Hugo Hoyama, que participou de todas as Olimpíadas desde 1992. As faixas de trânsito exclusivas permitiram o deslocamento rápido de atletas e membros de delegações olímpicas para os locais das competições. E para os espectadores que queriam chegar ao Parque Olímpico também foram oferecidas muitas opções - duas linhas de metrô, ônibus e até barco. Além disso, meses antes dos Jogos autoridades de Londres já instruíam os habitantes da cidade para trabalharem de casa ou mudarem seus horários durante as competições. Esse planejamento foi considerado eficiente por autoridades brasileiras, mas o desafio do Rio de Janeiro será muito maior que o de Londres, dado o problema crônico de insuficiência e má qualidade de rede de transporte público carioca. Por isso, essa é uma das áreas que vai exigir mais investimentos e planejamento, como enfatizam o embaixador do Brasil em Londres, Roberto Jaguaribe, e o presidente da Autoridade Pública Olímpica brasileira, Márcio Fortes. Segurança O maior problema enfrentado pelos britânicos nessa área foi que a empresa de segurança G4S não conseguiu contratar a tempo a quantidade de agentes de segurança necessários para cobrir todos os locais onde haveria competições. Como resultado, o governo foi obrigado a mobilizar 3.500 militares extras de última hora para suprir essa demanda - trazendo muitos do Afeganistão. A experiência serve como alerta para os brasileiros de que tanto no caso de serviços terceirizados quanto naqueles fornecidos por órgãos públicos, uma supervisão constante é essencial para garantir que os prazos serão cumpridos. Além disso, esquemas de revista semelhantes ao de aeroportos foram adotados em Londres na entrada dos estádios, Vila Olímpica e outros locais onde se concentravam atletas e espectadores, principalmente para evitar ataques terroristas. "Nunca é agradável passar por essas revistas, mas sabemos que elas são necessárias - e em geral aqui em Londres elas eram rápidas e não havia filas", diz Hoyama. No Rio, a maior preocupação na área de segurança será como controlar a criminalidade comum, mas o risco de atos terroristas também terá de ser considerado - e essa é uma área em que a experiência britânica pode ajudar. Segundo Fortes, entre os aspectos observados pelas autoridades brasileiras estão a participação dos militares britânicos nos esquemas de segurança e, em especial, a forma como foi feita a interação desses militares com autoridades e funcionários civis. Venda de ingressos Em Londres essa foi de longe a área mais problemática. Logo de início, o sistema escolhido para distribuir as entradas para as competições foi criticado por ser restrito em relação aos meios de pagamento. Foi feito um sorteio - e alguns torcedores acabaram recebendo mais ingressos do que realmente queriam, enquanto outros ficaram sem nada. O que começou mal, terminou pior. Durante as competições, britânicos e visitantes estrangeiros se deram conta de que muitas das cadeiras reservadas para patrocinadores e comitês olímpicos estavam vazias, enquanto uma multidão ainda estava sem-ingresso. Não havia sistema que permitisse a ocupação desses assentos na última hora. Também não existia um esquema oficial para torcedores estrangeiros trocarem as entradas que não tinham intenção de usar - por exemplo, no caso de seu país ter sido eliminado antes da competição. Houve até parentes de atletas que ficaram de fora dos estádios - um dos problemas que no Brasil poderiam ser atenuados, na opinião do gerente de competição esportiva do Rio-2016 e ex-nadador Ricardo Prado, que atuou como observador na Olimpíada de Londres. Segundo o diretor-geral do Comitê Olímpico e Paraolímpico carioca, Leonardo Gryner, para evitar os problemas enfrentados por Londres a organização dos Jogos do Rio-2016 quer "flexibilizar" a venda de ingressos e a ocupação de última hora de espaços vazios nas arenas olímpicas. Sinalizações e gestão de multidões Nessas áreas, os Jogos de Londres impressionaram, segundo a maior parte das autoridades, atletas e torcedores brasileiros. Por toda a parte havia indicações aos turistas sobre como chegar aos locais das competições. Além disso, voluntários com o uniforme dos jogos estavam espalhados pelas estações de trem e metrô, oferecendo aos visitantes ajuda para se localizar na cidade. Nas proximidades dos estádios e do Parque Olímpico, uma multidão desses voluntários, juntamente com funcionários temporários do comitê organizador da Olimpíada, evitavam tumulto garantindo que os espectadores caminhassem na direção certa. Para não parecerem antipáticos, também brincavam com os turistas, cantando, dançando e gritando palavras de motivação. "Animem-se, hoje o dia vai ser fantástico", dizia um desses funcionários no Parque Olímpico. "O dia é de festa", completava o outro. "Não só era fácil chegar aos estádios, mas o escoamento de espectadores era feito rapidamente após as competições", destaca Prado. "Em um momento você estava no Parque Olímpico com outras 200 mil pessoas, no momento seguinte o Parque estava vazio - e todos haviam saído sem tumulto. Vai ser um desafio repetir isso no Rio." Legado dos Jogos Uma das grandes preocupações das autoridades responsáveis pela Olimpíada de Londres era com o seu legado - em especial, que a infraestrutura erguida para a competição deveria contribuir para melhorar a vida dos habitantes de algumas regiões da cidade após os jogos. O Parque Olímpico e a Vila Olímpica foram construídos em uma zona industrial no Leste de Londres e as obras e trabalhos de renovação nessa área degradada consumiram 75% dos 9 bilhões de libras (R$ 28,3 bilhões) gastos com os Jogos. Ainda é cedo para avaliar se os objetivos nessa área serão cumpridos, mas garantir um legado positivo para os Jogos também é uma preocupação do Brasil. O Parque Olímpico do Rio está sendo projetado pela mesma empresa responsável pelo Parque Olímpico londrino - a filial britânica da empresa AECOM - e depois dos jogos será transformado em um centro de treinamento de atletas de ponta. O secretário de turismo do Rio, Pedro Guimarães, diz que a meta é usar a Olimpíada para melhorar as condições de vida na cidade de forma permanente. "Não são os Jogos que devem se servir da cidade, mas a cidade que deve se servir dos jogos", disse. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.