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''Autoestima entre índios é elevada''

Uma das consequências, segundo presidente da Funai, é que Brasil está entrando na ''era do protagonismo indígena''

Por Roldão Arruda
Atualização:

As obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na região amazônica, tais como hidrelétricas e rodovias, preocupam cada vez mais as comunidades indígenas e também os indigenistas. Eles temem os impactos ambientais e sociais que possam causar. Em entrevista ao Estado, o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Márcio Meira, disse que as preocupações são justas, uma vez que qualquer empreendimento na região acaba alterando a sua dinâmica ambiental, demográfica e econômica. Ao mesmo tempo, porém, ressalvou que em todos casos as comunidades têm sido ouvidas e os seus direitos, respeitados.Empreendimentos do PAC que se estendem pela região amazônica afetam ou vão afetar comunidades indígenas. Como vê essa questão?A maioria das obras - no PAC ou fora dele - não afeta diretamente as terras indígenas, porque não entra em suas terras. Mas passa perto delas e, de alguma forma, afeta indiretamente. Para todos os casos, existe uma legislação e regras sobre o que se pode fazer e o que não se pode em terra indígena. Também existe a legislação ambiental. As áreas indígenas são protegidas, o que torna obrigatórios os estudos de impacto ambiental. Quando uma obra atravessa a terra dos índios, eles têm de ser rigorosamente consultados. A Funai tem acompanhado e ouvido as populações indígenas em cada caso e assessorado as instituições de defesa ambiental.A BR-317, que liga o sul do Amazonas ao Acre, atravessa duas terras indígenas.Quando essa estrada foi aberta, durante o regime militar, essas terras ainda não tinham sido demarcadas. Foi na abertura da estrada que deram de cara com os índios que ali viviam, assim como aconteceu com a Transamazônica, a BR-369, a BR-364, a maior parte das estradas construídas naquele período. No caso da BR-317, trata-se agora do seu asfaltamento. Para isso, a Funai exigiu estudos sobre os pactos que podem surgir, consultas, reuniões e esclarecimentos às comunidades. Seguimos as regras, rigorosamente.O sertanista José Carlos Meirelles tem manifestado preocupação com a construção de estradas, tais como as rodovias que se destinam a facilitar o acesso ao Pacífico, ao redor de áreas onde vivem índios isolados - ainda não contactados. Isso também o preocupa?Todos os empreendimentos voltados para a Amazônia são preocupantes, porque, de alguma maneira, levam mais gente para a região, aumentam a pressão demográfica, econômica, logística, ambiental. É mais pressão sobre os índios e a floresta. Por isso criamos no Brasil os remédios, para que esses fenômenos possam ser corretamente avaliados e mitigados. O impacto do empreendimento deve ser controlado. Quando isso não for possível, deve ser deixado de lado. O Brasil avançou muito nessa área. Desde a Constituição de 1988, as obras de infraestrutura não são mais levadas adiante à revelia dos índios e da questão ambiental. É muito diferente dos anos da ditadura militar, quando não se consultava ninguém, quando se cometiam atrocidades imensas.Os índios também ficaram mais organizados.Sem dúvida. Assim como ocorre entre os afrodescendentes, a autoestima entre os índios é cada vez mais elevada. Uma das consequências disso é que estamos entrando na era do protagonismo indígena. Hoje eles têm candidatos a prefeito e a vereador nas áreas em que vivem. Em 2010 disputarão cadeiras de deputados estaduais e federais. Também ocupam cargos importantes na administração pública, enviam os filhos para as universidades e tornam suas organizações cada vez mais fortes. Com o aumento da autoestima, os filhos também valorizam mais as tradições culturais - usando para isso tecnologias digitais, como computadores, câmeras, vídeos, filmes. Num processo inverso ao que ocorria no passado, quando os índios tinham vergonha de assumir que eram índios, é cada vez maior o número de comunidades que assumem. O fenômeno da etnicidade ganhou um impulso muito grande no Brasil.Outro fenômeno é o crescimento populacional.A política indigenista tem tido impactos positivos. Um deles é o crescimento da população. Nos anos 80, a estimativa era de 250 mil índios aldeados no País. O Censo de 2000 revelou que já eram 735 mil, incluindo os não-aldeados. E de lá para cá a população indígena cresce num ritmo maior que a média nacional. Em 2010, o censo tratará não só o número de índios, mas também das línguas que falam e das etnias a que pertencem.

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