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Comissão da Verdade estuda ação jurídica contra Exército

Por Clarissa Thomé
Atualização:

A Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro estuda medida jurídica para obrigar o Exército a colaborar com as investigações sobre o paradeiro de desaparecidos políticos. O presidente da comissão, Wadih Damous, informou que está discutindo o assunto com juristas. "Tenho discutido a hipótese de medida jurídica. Não sei se seria ação ou se uma interpelação judicial. Mas um mecanismo para obrigar o Estado brasileiro a se pronunciar oficialmente sobre o que aconteceu", afirmou Damous. A declaração foi feita no dia seguinte ao depoimento do coronel reformado Paulo Malhães à Comissão Nacional da Verdade, em que ele confirmou ter torturado e assassinado presos políticos, mas se recusou a fornecer nomes de vítimas e torturadores. Ele também negou ter sido o oficial que desapareceu com o corpo do deputado Rubens Paiva - embora tivesse assumido a autoria deste crime à Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro."Tenho reiterado que não há mais nada a se fazer a respeito dessas declarações. Nunca vamos ter certeza se é verdade ou mentira. O Exército tem que vir a público e esclarecer o que aconteceu. Não é pedir documento A, B, C ou D. É de se presumir que não haja mais documento. Agora é fazer pergunta direta: o corpo de Rubens Paiva foi jogado no rio?", afirmou Damous. Ele comentou ainda as informações contraditórias nos depoimentos e entrevistas de Malhães. "Para nós, ele disse que pessoalmente se livrou do corpo. Pegou o saco e levou a um rio. Ao Globo, disse que jogou no mar. À Comissão Nacional, que não foi ele. Para quem mentiu? Não dá para assinar embaixo do que ele fala. Tem que ter a palavra oficial", defendeu, alegando questão humanitária.O Ministério Público Federal também tem cobrado maior transparência do Exército. Em fevereiro, quando foram denunciadas seis pessoas pelo envolvimento no atentado do Riocentro, os promotores entraram com pedido de busca e apreensão de documentos em posse do Exército. A Justiça ainda não se pronunciou. "O Exército demora, não fornece informações completas ou dá informações contraditórias ao que havia informado. Das três forças é a que mais dificulta o acesso", afirmou o procurador Sergio Suiama, que integra o Grupo de Trabalho Justiça de Transição. "A gente nem espera mais ter o paradeiro. O que a gente gostaria é que o Exército cumprisse a lei e fornecesse as informações requeridas".A recusa de Malhães em fornecer nomes de presos políticos que passaram pela Casa da Morte ou informar os destinos que tiveram frustrou as expectativas das famílias de desaparecidos durante a ditadura que, na manhã de terça-feira, assistiram à audiência pública sobre o centro de tortura que funcionou numa casa em Petrópolis, na Região Serrana do Rio."O governo jamais reconheceu a morte do meu irmão, nunca soubemos as reais circunstâncias. Tudo o que sabemos é o que foi levantado pelo Tortura Nunca Mais: ele foi preso em 27 de outubro de 1973 e enterrado como indigente no Cemitério de Ricardo de Albuquerque. O corpo nunca foi achado. Nesse período a Casa da Morte estava em funcionamento. As investigações avançam em dose homeopática. Meu pai tem 95 anos, está lúcido e quer saber o que foi feito do filho", afirmou o engenheiro Romildo Maranhão do Valle, irmão de Ramires, militante do PCBR.No depoimento à Comissão Estadual da Verdade, Malhães disse que os corpos jamais serão encontrados. "Podem esburacar o Brasil todo. Não vão achar ninguém", afirmou. O Serviço de Comunicação Social do Exército foi procurado ontem pelo Estado, mas informou que precisaria de tempo para elaborar a resposta.

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