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CPI sugere Aneel sob controle externo

Proposta visa monitorar relação entre agência e empresas privadas

Por David Friedlander
Atualização:

Palco de disputas empresariais e políticas desde o começo, a CPI da Tarifa de Energia vai sugerir que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) tenha controle externo e que uma de suas diretorias seja ocupada por representantes dos consumidores. Na visão dos membros da comissão, embora tenha um corpo técnico capacitado, os cargos de comando da agência são ocupados por pessoas que vieram ou irão para a iniciativa privada - situação que colocaria em risco a independência do órgão."É crucial monitorar a relação dos diretores da Aneel com as empresas que eles deveriam vigiar", diz o relator da comissão, deputado Alexandre Santos (PMDB-RJ). "Do jeito que é hoje, ela explica os aumentos exorbitantes das tarifas pagas pelo consumidor." A Aneel, hoje presidida por Nelson Hubner, não quis se pronunciar.Pelo raciocínio da CPI, a Aneel assume valores e interesses das empresas privadas em prejuízo do interesse público. Entre as supostas irregularidades, a CPI aponta o relacionamento entre o grupo Neoenergia e três ex-dirigentes da Aneel: o ex-diretor-geral José Maria Abdo, o ex- diretor Eduardo Henrique Ellery Filho e o ex-superintendente de Regulação Econômica Cesar Antonio Gonçalves.Em 2004, a Celpe, concessionária de Pernambuco, deixou de comprar energia da Chesf e passou a comprar energia - 165% mais cara - da Termopernambuco. A Celpe e a Termopernambuco são do mesmo grupo, a Neoenergia. A Celpe então foi à Aneel pedir permissão para repassar à conta de luz dos pernambucanos os quase R$ 300 milhões a mais que teria de pagar ao novo fornecedor de eletricidade. A agência autorizou, mas mandou picar o repasse em três anos.Segundo a CPI, o pedido da Celpe teve parecer favorável feito por Cesar Gonçalves, foi relatado por Eduardo Ellery e deferido por José Mário Abdo. Mais tarde, os três deixaram a Aneel e montaram uma empresa de consultoria que presta serviços à Neoenergia, a dona da Celpe e da Termopernambuco. Detalhe: um pedido igual feito pela Coelce, do Ceará, foi negado mais tarde pela diretoria da Aneel que substituiu Abdo.Procurados, Abdo, Ellery e Gonçalves não quiseram se pronunciar. Em nota, a Neoenergia afirma que a decisão que favoreceu a Celpe, sua controlada, foi questionada na Justiça e mantida. Diz, também, que a Celpe só contratou a consultoria de Abdo em 2008, muito tempo depois de sua saída da Aneel. Na realidade, o primeiro contrato de Abdo com uma empresa da Neoenergia ocorreu meses depois que ele deixou a agência. Em outro caso envolvendo uma empresa da Neoenergia, o ex-procurador-geral da Aneel, Cláudio Girardi, aprovou parecer favorável à Coelba, distribuidora da Bahia, numa disputa contra a Braskem e a Columbian, fabricante de insumos para a indústria de pneus. Com base no parecer, a Aneel tirou da Braskem o direito de vender energia à Columbian dentro do polo de Camaçari, na Bahia, e o transferiu à Coelba. "Essa decisão iria fazer meu cliente pagar muito mais pela energia que ele precisa. Não fomos ouvidos no processo e não concordamos com isso", afirma o advogado Maury Sergio Lima e Silva, que defende a Columbian.Silva recorreu à Justiça e conseguiu anular a decisão. O processo recomeçou na Aneel, com uma diferença: Girardi, que dera parecer favorável à Coelba quando estava na Aneel, saiu da agência e agora é o advogado da Coelba no mesmo processo. "A tese está correta, não tem nada de irregular. Alguém está querendo me prejudicar", afirma Girardi. Sobre trabalhar como advogado no mesmo caso em que atuou quando estava na Aneel, disse: "Eu ia trabalhar onde? Trabalhei nessa área minha vida toda".A Neoenergia também nega irregularidades nesse caso. E, na nota enviada ao Estado, afirma não ver conflito de interesses nem no caso da Coelba nem no da Celpe. "Uma restrição permanente inviabilizaria que os melhores profissionais se interessassem em trabalhar numa agência reguladora, sob pena de não poder atuar mais no setor"."Para influenciar uma decisão, seria preciso convencer o superintendente, o procurador e os outros diretores. Não é como se imagina", afirma Paulo Jerônimo Pedrosa, presidente da Abraceel, associação dos grandes vendedores de energia elétrica. Segundo a CPI, quando era diretor da Aneel, Pedrosa teria favorecido a Cemar, distribuidora do Maranhão, ao relatar o processo que permitiu à empresa reajustar as tarifas de energia em quase 20% em 2004 ( a inflação naquele ano foi de 7,6%). Quando deixou a Aneel, Pedrosa tornou-se conselheiro do grupo Equatorial, dono da Cemar. "A decisão foi técnica", afirma ele. A Equatorial, por meio de nota, afirmou "que a escolha dos seus conselheiros obedece a critérios estritamente técnicos".

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