De improviso, Dilma cria cotas em bolsas

Presidente surpreende assessores ao decidir, após críticas em evento, que concessão de bolsas para cursos de exatas não será 100% por mérito

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Por Leonencio Nossa e BRASÍLIA
Atualização:

De improviso, a presidente Dilma Rousseff decidiu, em evento no Palácio do Planalto, que a seleção para o programa de bolsas no exterior Ciência sem Fronteiras não levará em conta apenas o mérito. Após ouvir cobranças de dois representantes do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), ela disse que as 75 mil vagas em cursos nas áreas tecnológicas e exatas serão distribuídas por Estados e uma parte será concedida de acordo com questões étnicas e de gênero. No evento, Dilma pediu para os empresários bancarem outras 25 mil bolsas. Os dirigentes da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), da União Nacional de Cana-de-Açúcar (Única) e da Câmara Brasileira da Construção (CBIC), que estavam no encontro, não se pronunciaram. Apenas dois empresários, em decisões individuais, ofereceram recursos para a concessão de cem bolsas cada um. O programa de bolsas do governo é estimado em R$ 3,1 bilhões e tem como prioridade cursos de engenharia, além de outras áreas tecnológicas e de licenciatura em ciências exatas. A decisão da presidente em abandonar a seleção totalmente por mérito surpreendeu assessores do governo. Após o anúncio, Dilma tentou mostrar que não havia contradição. Enfatizou que o mérito será "crucial" mesmo na seleção das vagas por questões étnicas e de gênero, sem dar detalhes. "A partir desse primeiro critério, de mérito, teremos de aplicar outros critérios que podem contemplar toda a questão relativa a gênero, à questão étnica", afirmou. A presidente alterou o programa após os discursos dos conselheiros Naomar de Almeida Filho, ex-reitor da Universidade Federal da Bahia, e José Vicente, reitor da Universidade Zumbi dos Palmares. Naomar discursou que a deficiência em língua estrangeira é o maior entrave para a participação dos estudantes da rede pública na seleção de bolsas. Ele defendeu mais investimento na capacitação dos alunos das classes de renda baixa. Depois, em entrevista, avaliou como "ponto vago" a parte do programa que o governo espera ver bancada pela iniciativa privada. Dilma afirmou que o mérito no País já está "combinado com outros fatores", citando o Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e o Programa Universidade para Todos (ProUni) - que concede bolsas de graduação em cursos de humanas. Ela observou que o ProUni mostrou a capacidade dos estudantes das classes baixas e garantiu que se empenhará para evitar distorções no novo programa de bolsas. A presidente disse que o crescimento econômico recente criou gargalos na área de infraestrutura e hoje profissionais de engenharia estão em falta no mercado. "Não precisamos apenas de engenheiros nas tesourarias dos bancos, mas para fazer projetos, trabalhar na infraestrutura e na área de pesquisa", disse. O ministro de Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, avaliou que a meta é corrigir uma deficiência na formação de profissionais na área de exatas. Ele comparou o número de formandos em ciências humanas, que cresceu 66% em 2009, comparado com 2001, com o de formandos em engenharia, que cresceu apenas 1%.

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