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Disparado na contramão

O Brasil supera de longe as maiores economias do mundo quando a comparação envolve o buraco das contas públicas. Nos 12 meses até setembro, o déficit nominal do setor público atingiu 9,34% do Produto Interno Bruto (PIB). Esse número inclui a despesa com juros. O rombo foi formado por 7,76% do governo central, 1,39% dos governos de Estados e municípios e 0,19% das estatais. O resultado final do ano ainda pode ser pior. O déficit fiscal das sete maiores economias (G-7) do mundo capitalista ficou em média em 4,5% do PIB no ano passado e deve diminuir para 3,5% em 2015. Em 2009, quando o impacto da crise financeira desarranjou as contas de todos os países desenvolvidos, o déficit médio dos membros do G-7 foi de 10%, pouco maior que o do Brasil nos últimos 12 meses. Na zona do euro, o saldo negativo correspondeu a 2,4% do PIB em 2014 e deve encolher para 2% neste ano, segundo estimativa publicada no começo de outubro pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).

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Por Redação
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Também esses dados confirmam: o Brasil continua na contramão da maior parte do mundo e só se tem alinhado às economias submetidas aos piores padrões de governo, como as da Venezuela e da Argentina. Nos países administrados com alguma seriedade, as contas públicas têm melhorado. Depois de vencida a pior parte da crise internacional a atividade econômica vem-se recuperando, embora em ritmos bem desiguais, e o desemprego recua. No Brasil, a atividade primeiro ficou estagnada, em seguida veio a recessão e o desemprego chegou a 8,7% no trimestre encerrado em agosto.

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Recessão, propensão à gastança, rigidez orçamentária e crise política produziram neste ano, até setembro, um déficit primário – sem contar os juros, portanto – de R$ 8,42 bilhões nas contas do setor público. Um superávit de R$ 16,37 bilhões nos governos regionais possibilitou esse resultado, porque o governo central – Tesouro, Previdência e Banco Central (BC) – acumulou um déficit de R$ 21,72 bilhões. O saldo nominal total do setor público em nove meses foi um buraco de R$ 416,74 bilhões, equivalente a 9,7% do PIB. O governo central participou com R$ 361,78 bilhões para a formação desse déficit. Esse balanço geral é produzido mensalmente pelo BC.

Pelos cálculos do Tesouro, o déficit do governo central ficou em R$ 20,94 bilhões de janeiro a setembro. Os números divergem um pouco por causa dos critérios. O Tesouro considera simplesmente a diferença entre receitas e despesas, enquanto nas tabelas do BC o saldo corresponde à necessidade de financiamento.

Pelo critério mais simples, baseado no fluxo de receitas e despesas, é mais fácil vincular o resultado fiscal às decisões políticas e às condições da economia. O governo central até fez algum esforço e o gasto em nove meses, de R$ 786,65 bilhões, foi 4% inferior ao de um ano antes, descontada a inflação. Mas a receita líquida, de R$ 765,71 bilhões, caiu 4,6% na mesma comparação. A maior parte do corte ocorreu nos investimentos, 38,1% menores, mas os subsídios e subvenções aumentaram 180% de um ano para outro e as despesas com pessoal só recuaram 1,8%.

Apesar de tudo, o Tesouro ainda teve um superávit primário de R$ 35,47 bilhões. A Previdência continuou sendo o componente mais desastroso, com déficit de R$ 55,53 bilhões em nove meses. Com a crise, a queda real da arrecadação previdenciária chegou a 3,1%, enquanto o pagamento de benefícios encolheu apenas 1,8%.

O déficit primário do setor público poderá chegar a R$ 117,9 bilhões em 2015, pelas últimas informações do Executivo. Será o segundo ano consecutivo no vermelho. O superávit primário de 0,7% do PIB prometido para 2016 é um vago compromisso, dependente da recriação da CPMF, o imposto do cheque. E a dívida pública poderá bater em 71,1% do PIB no próximo ano, aumentando o risco de novos rebaixamentos do crédito brasileiro. Enquanto o quadro piora, o governo derrapa tanto na busca de soluções imediatas quanto no caminho das reformas para um crescimento seguro.