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É preciso regulamentar o jogo no Brasil

Artigo publicado originalmente no Estadão Noite O jogo está proibido no Brasil desde a década de 40 do século passado, com exceção de loterias estatais e do turfe (o bingo foi liberado e proibido novamente na década de 90). Somos um dos poucos países do mundo onde a atividade não é regulamentada. Nesta nada honrosa exceção, estamos acompanhados por países da África Saariana e do Oriente Médio e de alguns poucos países da Ásia, que em sua maioria proíbem o jogo por questões religiosas. Essa proibição quase centenária, contudo, nunca conseguiu banir o jogo. Muito pelo contrário. Hoje qualquer um pode apostar em eventos esportivos, bingos e cassinos pela internet, ou encontrar uma banca de jogo do bicho em sua vizinhança - isso para não falar dos diversos bingos e cassinos clandestinos. Como resultado, temos talvez o maior mercado ilegal do mundo, estimado em R$ 18 bilhões por ano (apenas como referência, as loterias da Caixa Econômica Federal arrecadaram R$ 13,5 bilhões em 2014). Todo aquele dinheiro vai para as mãos de contraventores ou de empresas situadas fora do Brasil, sem pagar impostos nem criar empregos formais. E sem qualquer preocupação social com possíveis impactos negativos do jogo. É interessante destacar que os argumentos daqueles contrários ao jogo podem ser usados, justamente, para exigir sua regulamentação. Em geral, a oposição se baseia nas ideias de combate ao crime organizado, na prevenção à lavagem de dinheiro e na preocupação com a ludopatia, o vício no jogo. Ora, com o mercado existente sem qualquer controle, todos esses receios se tornam realidade. Já com a regulamentação adequada é possível estabelecer mecanismos de controle que impedem a lavagem de dinheiro e que impõem práticas de prevenção e combate à ludopatia. Em diversos países há o conceito do “jogo responsável”, com campanhas e práticas eficazes, tais como os mecanismos da “auto-exclusão” e da definição de limites, por meio dos quais o apostador pode se inscrever em um cadastro que o impede de ser aceito em qualquer empresa de jogo, ou pode estabelecer um valor máximo para apostas por hora, dia ou mês.  Há, ainda, o potencial de arrecadação de tributos, tão importante na atual conjuntura econômica. De acordo com estimativas, o potencial de arrecadação supera R$ 20 bilhões por ano. Isso sem falar no que o governo poderia arrecadar com os leilões das concessões para a atividade, do incentivo ao turismo, da geração de empregos e do combate à evasão de divisas e ao crime organizado, que existem em decorrência da falta de uma alternativa legal. No entanto, não devemos repetir o grande erro cometido no passado, quando os bingos foram legalizados. O jogo não pode ser pura e simplesmente liberado sem qualquer espécie de controle. Assim como outras atividades econômicas, como a atividade bancária, por exemplo, para ser desenvolvido com a devida segurança jurídica e proteção do público, o jogo exige fiscalização intensa e normas específicas. É assim em todos os países onde a atividade se desenvolve com sucesso, nos quais existem órgãos reguladores especializados. Por isso, a discussão no Brasil não deve ser apenas sobre a legalização do jogo, mas sim sobre a criação de um marco regulatório e de uma agência reguladora, capazes de normatizar e fiscalizar adequadamente o mercado, para que setor se desenvolva de forma segura e sustentável.  

Por Luiz Felipe Maia
Atualização:

* Luiz Felipe Maia é especialista em legislação de jogos e sócio do escritório Oliveira Ramos, Maia e Advogados Associados

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