''É uma forma autoritária de se fazer presente''

Tentativa de se manter vivo no universo virtual mesmo após a morte pode revelar desamparo pessoal

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Por Mariana Mandelli
Atualização:

A tentativa de se manter vivo virtualmente mesmo após morrer no "mundo real" pode indicar, segundo os especialistas, baixa autoestima, desamparo pessoal, dificuldade em lidar com a perda e necessidade de cultivar lembranças. "É uma fantasia de imortalidade e de onipotência. Mesmo com a intenção amorosa, é uma forma autoritária de se fazer presente", afirma Rosa Maria Farah, coordenadora do Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática da PUC-SP.Alguns serviços podem ser úteis, afirmam os pesquisadores. Planejar virtualmente o funeral, para quem tem dificuldade de lidar com isso em vida, pode ser uma alternativa, assim como revelar senhas após o falecimento do usuário pode ser prático. "É compreensível que não se queira discutir a morte em vida", explica o psiquiatra do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da Unifesp, Aderbal Vieira Junior. "Esse tipo de serviço é uma forma de se fazer virtualmente aquilo que já era feito antes, como um testamento, na "vida real"."O surgimento dessas manifestações mórbidas na internet pode ser encarado como mais um dos reflexos da transferência da realidade para o universo digital. "A internet é uma alavanca de dificuldades e recalques das pessoas. Ela dá a possibilidade de exercer um controle que não temos na vida real, como administrar uma fazendinha ou um falso perfil", explica o coordenador do projeto Dependentes de Internet, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, Cristiano Nabuco de Abreu.Para ele, a possibilidade de reescrever a vida, mesmo que digitalmente, atrai as pessoas. "O problema não é a rede, mas sim as nossas vulnerabilidades, que levamos para ela. A internet acaba funcionando como uma fuga para as situações pesadas da realidade."

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