''Não existe escola sem bullying''

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Por Marcia Vieira e RIO
Atualização:

O tema virou obrigatório no universo escolar. Bullying, termo inglês que define todo tipo de preconceito, discriminação e violência entre crianças e adolescentes nas escolas, atinge todas as classes sociais. Os casos têm aumentado tanto que, na semana passada, a Justiça de Belo Horizonte determinou que um adolescente pagasse indenização de R$ 8 mil a outro por bullying. "Escola que anuncia não ter casos de bullying está fazendo propaganda enganosa", diz a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, que acaba de lançar um livro sobre o assunto. Bullying - Mentes Perigosas nas Escolas ajuda a identificar e combater o fenômeno. Em seus dois consultórios, no Rio e em São Paulo, Ana Beatriz, que já vendeu mais de 400 mil exemplares de Mentes Perigosas - O Psicopata Mora ao Lado, atende sobretudo a vítimas das escolas de classe média e da elite. "As escolas públicas sabem lidar melhor com o bullying que as particulares", diz. Ana defende que os pais das vítimas recorram à Justiça para cobrar pelo tratamento psicológico dos seus filhos. "Quando as escolas começarem a sentir no bolso o custo de ignorar o bullying, elas terão mais cuidado com esses casos", defende, na entrevista a seguir. Em quais tipos de colégios há mais chance de bullying?Todos. O bullying é democrático. Acontece tanto na escola particular quanto na pública. O que faz uma escola ser boa é como ela vai lidar com o bullying. A escola privada lida melhor com isso que a pública?Não. Em geral, na escola pública há uma postura mais adequada. A direção está mais orientada. Se não consegue resolver, chama o Conselho Tutelar. A particular não admite o problema por temer propaganda negativa. Ou expulsa o agressor ou diz para o pai da vítima: "Seu filho é sensível demais." Isso é que dói. Geralmente, o convidado a se retirar é o "sensível". A senhora recomenda que os pais tirem os filhos da escola nesses casos?Tentamos mudar a cultura naquele micromundo escolar, porque só assim a gente muda a sociedade. Quando vou às escolas falar sobre algum paciente que é vítima de apelidos maldosos, geralmente ouço da diretora a velha explicação: "Mas é brincadeira." Se é brincadeira, todos deveriam se divertir. Quando é bullying, um grupo se diverte às custas da humilhação de outros. Se a direção não faz nada e a criança começa a sofrer demais, recomendo que ela saia da escola, mas sugiro que o colégio seja acionado judicialmente para pagar o tratamento. Já conseguimos duas vezes. A senhora diz que bullying existe desde que a escola existe. Mas houve aumento dos casos?O bullying é um fenômeno típico das relações humanas. Agora percebemos mais porque estudamos mais. E lidamos com filhos de pais excessivamente permissivos. Quais são as características das vítimas e dos agressores?As vítimas geralmente estão fora do padrão: gordo demais, magro demais. São crianças mais tímidas, menos pop. Os motivos dos agressores variam: ele pode reproduzir a violência do lar; pode estar numa situação circunstancial de revolta porque os pais estão se separando. O caso mais grave é o do menino com transtorno de conduta. Ele dá problema na escola e em casa. No livro, eu cito o caso de um garoto que colocou a pata do cachorro na torradeira. Depois, furou a mão da professora. Esse tipo é o mais raro. Nesse caso, o que move a criança é a maldade?Sim. É difícil admitir que exista maldade, ainda mais em uma criança de 8 anos, mas existe. Quem mais aparece no consultório: agressores ou vítimas?Vítimas. A primeira coisa que eu faço é mostrar que elas não têm nada de errado. Hipersensibilidade não é doença. Muitas vezes as crianças chegam pedindo desculpa por serem tímidas. As vítimas justificam o injustificável. Nenhuma violência é justificável.

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