PUBLICIDADE

Nova chance à transparência?

Artigo publicado originalmente no Estadão Noite

Por Izabela Corrêa
Atualização:

Instituído pelo Art. 5º XXXIII da Constituição Federal de 1988, o direito fundamental de acesso à informação pública foi regulamentado apenas em novembro de 2011, pela Lei Federal 12.527. Se os mais de 20 anos sem a regulamentação do direito fizeram mal à clareza de parte das elites políticas e estatais no Brasil quanto ao que é essencialmente de interesse público ou se trata-se apenas de mera negligência à adoção abrangente da Lei de Acesso à Informação (LAI) é o que hoje, depois de mais de três anos de sua entrada em vigor, menos importa. Após ser questionado acerca das motivações do sigilo a documentos da Sabesp, do Metrô e da Polícia Militar, no dia 15 de outubro o Governador Geraldo Alckmin assinou decreto que limitou as autoridades que poderão declarar o sigilo no âmbito do Estado, revogou os atos normativos que instituíram ‘Tabelas de Classificação de Sigilo de Documentos, Dados e Informações’ e determinou o prazo de 30 dias para que novas Tabelas de Classificação fossem encaminhadas à Comissão Estadual de Acesso à Informação (CEAI) que, em igual período, deverá deliberar sobre a ratificação dos sigilos propostos pelos Secretários de Estado e o Procurador Geral do Estado. Ao mesmo tempo em que o recém-publicado decreto aponta para uma tentativa do governo paulista de rever o tratamento dado às informações públicas em seu poder, a norma evidencia o descaso com outras questões relativas à transparência pública até o momento. Diferentemente do que entenderam alguns veículos de comunicação e cidadãos paulistas acerca da nota ‘Governo de SP cria comissão para rever classificação de atos sigilosos’ publicada pelo governo paulista no dia 15 de outubro, a CEAI não foi formalizada na semana passada. A Comissão Estadual de Acesso à Informação foi formalmente criada no dia 11 de fevereiro de 2014, por meio do Decreto Estadual 60.144/2014, o qual atribuiu a ela, entre outros, os papéis de instância recursal de acesso no âmbito da Administração Estadual, e o de rever, a qualquer tempo, a classificação de documentos, dados e informações no grau secreto ou ultrassecreto. Ou seja, estivesse a CEAI em funcionamento a pleno vapor desde 2014, possivelmente os paulistas não teriam que esperar mais 60 dias para conhecer os documentos que deixarão de ser classificados como secretos e ultrassecretos, conforme termos do Decreto 61.559, de 15 de outubro de 2015. O governo paulista também tem um bom trabalho a fazer para cumprir plenamente o Art. 4º II do Decreto Estadual 58.052/2012, segundo o qual ‘É dever dos órgãos e entidades da Administração Pública Estadual divulgar documentos, dados e informações de interesse coletivo ou geral, sob sua custódia, independentemente de solicitações’. Se faltava clareza sobre quando categorizar uma informação pública como de interesse coletivo, as mobilizações geradas em torno do segredo de uma série de dados da Sabesp, do Metrô e da Polícia Militar deveriam ser suficientes para indicar que, naquilo que não for reclassificado como sigiloso, boa parte deveria ser publicada proativamente pelo governo. Mas mais preocupante é perceber que quase três anos e meio após a entrada em vigor da Lei de Acesso à Informação, parece pouco claro ao alto escalão da administração do Estado de São Paulo que a referida lei institucionalizou o acesso a informações públicas como a regra, e o sigilo como a exceção, admitido exclusivamente em razão de sua imprescindibilidade para a segurança da sociedade e do Estado. Enquanto regras podem ser suficientes para fazer valer o acesso à informação, é preciso uma liderança comprometida com a transparência para conseguir mudar a cultura das instituições públicas. Não se mover nessa direção colocaria em xeque não apenas os motivos por trás do sigilo dos documentos, mas a própria capacidade do governador Alckmin de gestor da coisa pública.* Izabela Corrêa é doutoranda em ciência política pela London School of Economics and Political Science (LSE) e especialista em transparência pública

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.