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O Brasil Sensacional e a maçã podre

Colunista comenta as campanhas de promoção de NY e do Brasil.

Por Lucas Mendes
Atualização:

Na década de 70, o Brasil lançou mais uma campanha para atrair turistas e as paredes do escritório do Brazilian Trade Bureau de Nova York estavam cobertas de pôsteres com mulatas de costas, traseiros arrebitados sobre a Floresta Amazônica e a frase da campanha: ENTRE NO BRASIL PELO LADO EXÓTICO. Um amigo diplomata, entre o constrangimento e o deboche, me disse: "Bunda de mulata é nossa marca registrada". Quando se marca o gado com ferro em fogo é um "branding". Quando você vende uma imagem de um produto, cidade ou país, em inglês, é um branding. Aquela marca definidora resume não só o produto que oferece, como tenta criar uma identidade e seus valores. Nova York estava falida na década de 70. A pobreza e a violência da cidade eram estrelas dos filmes: Midnight Cowboy (Perdidos na Noite), Taxi Driver, French Connection (Operação França), Escape from New York, Fort Apache (Os Apaches do Bronx), The Bronx(Os Guerreiros do Bronx) eram exemplos que intelectuais europeus, em especial os franceses, usavam para ilustrar a decadência não só da cidade mas do capitalismo. A Alitalia lançou uma campanha para promover seus novos vôos para Boston e Washington com a imagem da estátua da Liberdade afundando com lágrimas nos olhos. Até a década de 70, escreve a socióloga e professora Miriam Greenberg, Nova York tinha feito pouco ou nada para promover, policiar e proteger sua imagem. No seu recém-lançando Branding New York: How a City in Crises Was Sold to the World, ela conta como Nova York se livrou do inferno do Bronx e se tornou um modelo bem sucedido de autopromoção. A campanha começou com The Big Apple (A Grande Maçã), em 1971, e morreu na crise fiscal de 75/76. A maçã estava podre, mas deixou uma "brand", diz a doutora Greenberg. Foi no verão de 77, dos assassinatos em série do Son of Sam (Filho de Sam), que a imagem da cidade chegou no seu ponto mais decadente e assustador. Eu fiz minha pequena contribuição com uma série de matérias na Globo sobre os assassinatos e recebi cartas de brasileiros com medo de sair à noite até no sul do Brasil. Na véspera do primeiro assassinato do Filho de Sam fiz uma reportagem sobre o medo dos novaiorquinos de ele voltar a matar para comemorar a data. Ele voltou e matou. A limpeza da imagem começou nesta época com a campanha criada pela agência Wells, Rich, Greene e o desenho de Milton Glaser - I Love New York. A cidade tinha sentido o impacto da crise, milhares perderam empregos e empresas. Os empregados municipais perceberam que ia tudo para o beleléu. Foi, em grande parte, o dinheiro dos fundos de pensões destes empregados que bancaram a saída da crise fiscal e sustentaram o I Love New York. A "branding" ou marca de Nova York, escreve Miriam Greenberg, promoveu a transformação de uma cidade suja de classe média baixa em um ambiente receptivoàs grandes e pequena empresas e aos turistas, compatível com até com conservadores como Ronald Regan que deu uma entrevista com um cachecol I Love New York. Nenhuma campanha publicitária se sustenta no vácuo e na mentira. Surgiram os BIDs - Business Improvement District -, um programa de bairros onde os pequenos e grandes proprietários davam e ainda dão uma pequena comissão para limpeza e segurança de uma área. As calçadas foram varridas, os postes iluminados e, em 90, veio a campanha de Giuliani inspirada na tese da "janela quebrada". Os grandes crimes acontecem quando se ignora os pequenos, Tolerância Zero. A nova campanha de Nova York, criada na administração do prefeito Bloomberg éThe World's Second Home (A Segunda Casa do Mundo). Tomara que pegue porque muita gente vai perder o teto nesta crise. O presidente Lula veio aqui esta semana lançar a nova campanha da Embratur para levar turistas ao Brasil. Ele, o ministro de Turismo e os governadores de Pernambuco e da Bahia, todos muito articulados, trouxeram a mensagem do Brasil Sensacional - Sensational é a palavra de ordem da campanha. O belo vídeo, com texto extravagante, tem imagens de todos os lados, inclusive o exótico, e de mulatas, mas nenhuma bunda. Uma raridade em promoções brasileiras. Também não tem e ninguém usou a palavra segurança. Sensacional! BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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