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Os dribles de Garrincha pela ótica de suas vítimas

O Filme traz depoimentos dos laterais que literalmente dançaram com o camisa 7

Por Bruno Lousada
Atualização:

ANJO DAS PERNAS TORTAS - Garrincha aplica drible sobre jogador inglês na Copa do Chile, em 1962: marcá-lo era tarefa inglória

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Para o amante do futebol, Garrincha foi o anjo das pernas tortas. Para seus marcadores, Mané era o demônio das pernas tortas, de tanto infernizar com dribles de entortar a coluna. Relegados a segundo plano nos duelos com Garrincha, os "Joões", como o ex-craque da seleção brasileira e do Botafogo chamava quem o perseguia em campo, vão virar protagonistas do documentário Simplesmente passarinho, de André Felipe de Lima.

O título é uma referência à maneira como o craque conduzia sua vida - quando livre, estava feliz; quando preso, triste. Apesar de faltar patrocínio para o lançamento, o filme está em fase final de edição, com previsão de estrear neste semestre.

O documentário vai recuperar a trajetória do filho mais ilustre do distrito de Pau Grande, na região metropolitana do Rio, pela visão das vítimas do gênio da bola. Os ex-laterais-esquerdos Jordan (Flamengo), Coronel (Vasco), Altair (Fluminense) vão contar histórias do filho de seu Amaro e de dona Maria Carolina.

Levar uma finta de Garrincha era fácil. Difícil era esquecê-la. Quem aplica um drible desmoralizante, pode nem se lembrar disso. Mas quem o leva, guarda aquilo para sempre.

Campeão mundial em 1962, no Chile, pela seleção, Altair nunca apagou da memória o baile que levou na antológica final do Campeonato Carioca, de 1957, em que o Botafogo aplicou um inesquecível 6 a 2 no Fluminense.

"Levei um baile. Só faltou a orquestra na área. Garrincha estava danado. Na bola dividida, eu ganhava, mas ele, com ela dominada... Toda hora driblava, ia no fundo, centrava. Quando estava em boa situação, ninguém segurava Garrincha, não. E, na seleção, ele fazia isso. Os gringos não o conheciam, então, Garrincha deitava e rolava", conta Altair em depoimento para o filme.

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"Se você desse um pontapé nele, estava ferrado. Ele driblava e, ao invés de ir para o gol, esperava você voltar para driblar novamente", recorda.

Lateral-esquerdo do Vasco na década de 1950, Coronel conta que não dormia bem ao saber que iria enfrentar Mané. "Uma vez, fui dar o combate e, quando olhei para trás, tinha mais dois ou três caídos. O Mané foi muito mais do que as pessoas imaginam. Foi tudo isso e mais um pouco."

Para ele, o pior é que, depois do drible, vinha a gozação dos torcedores. "Era o que mais acontecia, porque pimenta nos olhos dos outros é refresco", emenda. Tricampeão estadual em 1953, 54 e 55 pelo Flamengo, Jordan era, no entender do biógrafo Ruy Castro, o marcador mais leal que Garrincha enfrentou.

"Eu gostava (do jeito debochado dele driblar) porque aquilo me dava forças para chegar duro nele (Jordan bate na mão). Quando ele começava a fazer aquelas papagaiadas (bate mais três vezes na mão), eu estava sempre junto. Mas ele era legal comigo. Ele não me dava pontapé, nem eu nele", relata.

O documentário terá imagens de arquivo e depoimentos do presidente honorário da Fifa, João Havelange, do biógrafo Ruy Castro e a narração de trechos de crônicas de Paulo Mendes Campos, Carlos Drummond de Andrade e Nelson Rodrigues. Um gol de placa para o resgate da memória do futebol nacional.

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