Papa afirma que natureza da Igreja é essencialmente espiritual, não política

Em pronunciamento a jornalistas, Francisco pregou que quer uma ‘Igreja pobre para os pobres’ e enfatizou que a escolha de seu nome faz referência a Francisco de Assis, ‘homem da pobreza’; ao final de discurso, o pontífice foi aplaudido de pé por todos

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Por VATICANO
Atualização:

Em mais um sinal de que deseja reorientar o discurso católico, o papa Francisco pregou ontem, no Vaticano, uma “Igreja pobre e para os pobres”, mas com menos ênfase política e mais espiritual. 

O recado foi enviado em um pronunciamento a jornalistas do mundo inteiro, convidados a encontrar-se com o novo pontífice. Ao final da solenidade, foi ovacionado por uma plateia de cerca de 4 mil pessoas, boa parte indiferente às acusações que pairam sobre suas relações com a ditadura na Argentina dos anos 1970 e 1980. O encontro com os jornalistas foi sua quarta aparição pública em quatro dias de pontificado, desde sua eleição no conclave de quarta-feira. Alternando a leitura de um discurso escrito e trechos de improviso mais intimistas, Francisco falou por 15 minutos, voltando a abordar as relações entre a espiritualidade e a política na religião, tema sobre o qual havia feito uma homilia aos cardeais em missa na quinta-feira, na Capela Sistina. “A Igreja, ainda que seja uma instituição humana, histórica, com tudo o que comporta, não tem natureza política, e sim essencialmente espiritual: é o povo de Deus que caminha para o encontro com Jesus. Só com essa perspectiva é possível entender a obra da Igreja Católica”, disse o papa. Outro ponto importante de seu pronunciamento girou em torno de um tema que se repete como foco de seus discursos: o voto de pobreza. Evocando o assunto de improviso, o papa defendeu uma evangelização voltada “ao último”, referindo-se aos excluídos. “Como eu gostaria de uma Igreja pobre, para os pobres!”, afirmou, sendo interrompido por aplausos. Também de improviso, Jorge Mario Bergoglio explicou as razões pelas quais adotou o nome de Francisco (mais informações nesta página), em referência a São Francisco de Assis. “É um homem da pobreza, um homem da paz, que ama e protege a criatura, em um momento em que não temos uma relação tão boa”, disse o pontífice. Bem-humorado, ele recordou os instantes finais do conclave, quando percebeu que seria o escolhido, e mais tarde as brincadeiras que ouviu sobre outros nomes que poderia ter adotado. Uma das denominações sugeridas, lembrou, foi Clemente. “Então você seria o Clemente XV, para se vingar de Clemente XIV, que suprimiu a Companhia de Jesus”, disse, relatando um diálogo que fazia referência à sua condição de jesuíta. Imprensa. A seguir, o papa se dirigiu aos jornalistas, agradecendo-lhes pela cobertura da transição no Vaticano, aberta pelo anúncio da renúncia feito por Bento XVI em fevereiro. “Quero renovar meu agradecimento pelos esforços desses dias tão trabalhosos e quero fazer um convite para que vocês tentem conhecer cada vez mais a natureza da Igreja, com seus pecados e virtudes, e conhecer suas motivações espirituais”, afirmou, assegurando ver identidade entre os interesses da religião e da mídia. “Seu trabalho exige atenção para com a verdade, o que nos deixa muito próximos.” Ao final de seu discurso, Francisco foi aplaudido de pé – até mesmo por muitos jornalistas – e ouviu seu nome em gritos de saudação, antes de passar a receber alguns religiosos, jornalistas e trabalhadores do Vaticano. Em nenhum momento de seu discurso, Francisco evocou ou fez alusão indireta à controvérsia em torno de suas supostas relações com a ditadura militar na Argentina entre 1976 e 1983. Na sexta-feira, o Vaticano lançou-se a uma ofensiva na mídia para responder às críticas vindas da Argentina. Até aqui, o pontífice segue sem ter se manifestado ele mesmo sobre o assunto.

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