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Parece Verdade, um guerreiro da imagem resiste

O paulistano Caio Reisewitz reúne 50 trabalhos em exposição no Rio

Por Roberta Pennafort
Atualização:

Imagine a felicidade de um artista de 42 anos que, pela primeira vez, vê sua obra reunida em três salas de um importante centro cultural do Rio. É como se sente o fotógrafo paulistano Caio Reisewitz, que abre para convidados hoje, no CCBB, a mostra Parece Verdade, com 50 fotografias, todas da última década (amanhã será a abertura ao público). "Para mim, é uma fascinação. É a primeira vez que estou vendo todas elas juntas. Você vai trabalhando, sonhando, e um dia acontece", conta Reisewitz, que acaba de voltar da Galícia, na Espanha, onde foi saudado como "um dos fotógrafos mais premiados do mundo". No segundo semestre de 2009, em dois espaços diferentes, foram expostas por lá fotos suas feitas na Espanha e no Brasil, também nos últimos anos. Ao Rio, veio uma seleção de imagens realizada por Reisewitz e pelo curador Fernando Cocchiarale que são bem representativas de sua produção, chancelada por participações nas bienais de Veneza e de São Paulo. O título remete à estranheza causada por algumas imagens, que, de tão perfeitas, parecem manipuladas - como a paisagem composta pela grama, as árvores e o céu no Goiânia Golf Club (2007). Ou a tomada aérea de Cubatão (2003), que em nada lembra a imagem poluída que se perpetuou no imaginário brasileiro. "A trama do meu trabalho gira em torno de uma fotografia que parece artificial, só que é real. Procuro paraísos que parecem montados no computador, mas são de verdade."São registros ora da natureza intocada, ora do cenário modificado pela ação do homem. No CCBB, aparecem grandiosos, em dimensões que chegam até a 2,8 por 2 metros. "Vivo em São Paulo e aqui existe um descontrole, uma voracidade muito grande. Sou muito ligado à natureza, porque sempre andei pelos arredores da cidade, pela Serra da Cantareira e a Serra do Mar", diz Reisewitz, lembrando duas locações que fotografou. Como ressalta Cocchiarale, os traços icônicos das localidades não são o foco, mas sim "territórios vazios, nos quais encontramos apenas os indícios de uma humanidade ausente". "Seus trabalhos recentes, exceção feita a alguns poucos retratos e paisagens, nos revelam pouca coisa a respeito dos lugares registrados." Na exposição, está a arquitetura imponente do Palácio do Itamaraty, em Brasília (2005), e a preciosidade dos interiores da igreja de São Francisco da Penitência e do Real Gabinete Português de Leitura, ambos no Rio e fotografados em 2004. São representações de poder, assim como o gabinete do prefeito de São Paulo, no Palácio do Anhangabaú (2004). A figura humana pouco aparece, a não ser por fotos de pessoas próximas de Reisewitz. O Terminal Rodoviário do Tietê surge numa colagem, que representa a grande energia que circula por ali. Neste caso, é o oposto do que acontece nas fotos de paisagem: o amontoado de imagens poderia ser real, mas foi criado pelo computador. Há sete anos, o fotógrafo, fã de Marc Ferrez e suas cenas do fim do século 19 e início do 20, mantém-se apegado à sua câmera alemã Linhoff, que utiliza placa de negativo de 9 por 12 centímetros. "É uma câmera relativamente arcaica, mas precisa. Gosto do tempo que é visível nas imagens: a foto mostra este tempo, não o instante." Os filmes vêm dos EUA, a revelação é realizada no Brasil e as ampliações têm de ser feitas na Alemanha. Reisewitz não se imagina (ainda) migrando para a técnica digital - caminho natural já trilhado por nomes como Sebastião Salgado. "Sou um guerreiro, vou resistindo. Cada vez mais fico num beco sem saída, mas acho que essa indústria vai sobreviver, por causa de caras como eu." O CCBB fica na Rua 1º de Maio, 66, centro, tel. 21 3808-2020.

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