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Pedro Almodóvar e a fina arte da reinvenção

Abraços Partidos reabre a vertente do melodrama, já presente na obra do cineasta

Por Luis Carlos Merten e RIO
Atualização:

Deve ser uma perversão da crítica, mas Abraços Partidos, de Pedro Almodóvar, está sendo penalizado pela própria excelência do trabalho do autor espanhol. Almodóvar já fez coisas tão boas - Carne Trêmula, Tudo Sobre Minha Mãe, Fale com Ela - que Abraços está sendo considerado "menor", quando se trata de outra obra de maturidade plena. É mais ou menos como dizer que Orson Welles nunca superou Cidadão Kane nem Sergei M. Eisenstein igualou O Encouraçado Potemkin. Claro, são os dois maiores filmes de todos os tempos.Abraços Partidos é um belo Almodóvar e daqui a pouco você poderá confirmá-lo na Mostra de São Paulo, antes da próxima estreia. O filme reabre a vertente do melodrama na obra do cineasta, fala de cinema, de um filme dentro do filme. Penélope Cruz é maravilhosa. Numa cena, o maquiador que acaba de prepará-la diz que é Audrey Hepburn. O penteado, a franja, a roupa, tudo vem da bonequinha de luxo, mas Penelope não é Audrey. Almodóvar cria um universo de duplos - é um de seus temas favoritos. A garota de programa vira uma estrela, seu amante é o produtor, mas ela se apaixonou pelo diretor e se sacrifica para preservar a integridade da obra do homem que ama.Uma grande cena mostra Penelope dizendo em voz alta o diálogo que uma leitora de lábios tenta identificar, num vídeo feito clandestinamente, a pedido do amante. Ele quer testar a fidelidade de Lena (é seu nome no filme). A dublagem, o falso e o verdadeiro - Almodóvar reinventa-se. Pobres críticos que acham que ele apenas se repete.O universo do cinema, a ficção que invade a realidade, e vice-versa, são temas de A Falta Que Nos Move, longa de estreia da diretora de teatro Christiane Jatahy, em cartaz na Première Brasil. Digamos que a ideia desse filme é mais interessante que sua execução. Cinco atores encenam uma ficção e o filme de Christiane, preparado durante quatro anos, foi rodado durante 13 horas de um único dia, 23 de dezembro de 2007. Cinco amigos se reúnem para jantar, à espera de um sexto personagem - Godot? -, que nunca chega. Misturam-se realidade e ficção. É cinema ou um reality show? Os atores/personagens falam em cenas, mas não se veem as câmeras nem o diretor. Cria-se o antagonismo, o grupo briga. Os pais de uma garota foram guerrilheiros e cobram engajamento de uma geração à deriva, que não acredita mais na militância. Acredita em quê? Na amizade? Todas as brigas levam a um momento de alívio e verdade. O quinteto chora e, se a lágrima for verdadeira, como poderia dizer Abbas Kiarostami (leia ao lado), há salvação. Volto porque te amo? O afeto está em discussão no Rio.

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