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Perigo para as contas externas

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Por Redação
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O Brasil poderá crescer em ritmo acelerado no próximo ano, com mais produção, mais emprego, mais consumo e melhores condições de vida para milhões de famílias. Este é o lado melhor das projeções. Mas a expansão da economia não sairá de graça. Parte do preço será, quase certamente, uma deterioração das contas externas. Os analistas do mercado financeiro e das grandes consultorias já calculam esse efeito. Esses prognósticos aparecem no relatório da pesquisa Focus, uma consulta realizada semanalmente pelo Banco Central (BC) a uma centena de instituições. Segundo as últimas previsões, o Produto Interno Bruto (PIB) crescerá 5%, o superávit comercial diminuirá dos US$ 25,20 bilhões estimados para este ano para US$ 13,40 bilhões e o déficit em conta corrente aumentará de US$ 17,25 bilhões para US$ 35,50 bilhões. Neste ano, de acordo com a pesquisa Focus, o ingresso de investimento direto, calculado em US$ 25 bilhões, deve ser bem mais que suficiente para cobrir o buraco da conta corrente. Se as estimativas estiverem corretas, em 2010 o ingresso líquido será de US$ 35 bilhões e ficará pouco abaixo do necessário para compensar aquele resultado negativo. Nada assustador, a curto prazo, mas os formuladores da política econômica deveriam pensar sobre esses números. As transações correntes do balanço de pagamentos são formadas pela soma de três contas: a balança comercial de mercadorias, a balança de serviços (onde se incluem remessas de lucros e de juros, turismo, fretes e seguros, entre outros itens) e as transferências unilaterais (onde aparece, como item principal, o dinheiro mandado ao Brasil pelos trabalhadores no exterior).Entre 2003 e 2007 o saldo das contas correntes foi positivo, porque foram acumulados grandes superávits no comércio de mercadorias. Em 2007, no entanto, o quadro começou a mudar, porque, com o rápido crescimento da economia, as importações aumentaram bem mais velozmente que as exportações. A tendência se manteve durante a maior parte do ano passado, porque a produção e a criação de empregos só perderam impulso no último trimestre. Se o Brasil tivesse mantido em 2009 um crescimento igual ou superior a 4%, num cenário global de recessão, o buraco nas transações correntes provavelmente ultrapassaria os US$ 35 bilhões. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, continuou falando de uma expansão econômica daquela ordem até o fim de 2008, quando já havia claros sinais de uma forte retração na atividade brasileira. Mas o Brasil, apesar do vigor de sua economia, não escapou da recessão. O PIB encolheu durante dois trimestres consecutivos e só voltou a crescer a partir do segundo trimestre de 2009. Com a forte retração da demanda, as importações diminuíram mais que as exportações. Inverteu-se o quadro dos dois anos anteriores. Por causa disso, a conta de comércio continuou positiva, embora o volume total das transações tenha diminuído. Na terceira semana de novembro, o País acumulava um superávit comercial de US$ 22,96 bilhões, 4,8% maior que o de um ano antes, pelo critério da média por dia útil. Pelo mesmo critério, as exportações, nesse período, foram 24,4% menores que as de igual período de 2008 e as importações, 28,6% inferiores.Mas, com a recuperação da economia, o descompasso entre vendas e compras começou novamente a mudar. As importações voltaram a crescer e sua expansão tende a ganhar impulso nos próximos meses e no próximo ano. É provável o retorno a um cenário parecido com o de 2007 e da maior parte de 2008, se a expansão do PIB voltar a um ritmo próximo de 5%. Mas até essa projeção pode ser otimista, se a recuperação do comércio global, como supõem muitos analistas, for lenta. Se esse for o caso, as exportações brasileiras também voltarão a crescer mais vagarosamente do que na fase pré-crise. Além do mais, o dólar provavelmente continuará barato, prejudicando os produtores brasileiros. O governo deveria dar um pouco mais de atenção a esse conjunto de dados e de projeções. Sem mexer diretamente no câmbio, as autoridades poderão fazer muita coisa para tornar a produção brasileira mais competitiva e para preservar a solidez das contas externas. Para isso as autoridades teriam de cuidar um pouco mais do médio prazo e um pouco menos dos interesses eleitorais imediatos. O próximo presidente ficaria com certeza muito grato.

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