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Pesquisa quer evitar atropelamentos de animais

Estudo aponta falhas e acertos do sistema de proteção à fauna contra atropelamentos, implantado na rodovia BR-471, que corta a Estação Ecológica do Taim, no RS.

Por Agencia Estado
Atualização:

Muitos acordos de compensação ambiental propõem a construção de cercas e túneis de passagem de fauna, para prevenir o atropelamento de animais silvestres em remanescentes de vegetação nativa segmentadas por rodovias. Mas poucos estudos consideram a eficiência de tais medidas nos diferentes ecossistemas brasileiros. Para suprir esta deficiência de informação - pelo menos em relação à rodovia BR-471, que corta a Estação Ecológica do Taim, no Rio Grande do Sul - o oceanógrafo e doutor em Ecologia Alex Bager, da Universidade Católica de Pelotas (UCPEL), realizou um monitoramento sistemático de 120 km de estrada, dos quais 17 estão dentro da unidade de conservação e contam com um sistema de proteção à fauna. A rodovia é muito usada por caminhões, sobretudo na época de safra do arroz, de abril a junho. A maioria dos caminhões trafega à noite, quando a movimentação de animais é maior e a visibilidade menor, gerando, portanto, uma taxa de atropelamentos mais alta. Nos meses de verão, o tráfego também se intensifica, com a vinda de uruguaios para as férias. Implantado em 1998, o sistema de proteção à fauna é constituído de cercas de 1,30m de altura, nas duas margens da rodovia, com túneis de passagem de fauna, praticamente a cada quilômetro, e mata-burros, antes e depois de cada túnel, para evitar que os animais tenham acesso à pista. Parte de tal sistema foi parcialmente destruído, no ano passado, por ocasião das inundações ocorridas na região. Sua reconstrução deve aproveitar algumas sugestões geradas a partir da pesquisa de Bager, visando maior eficiência. Acompanhado de quatro estagiários e em colaboração com o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o pesquisador percorreu os 120km de estrada uma vez por semana, durante um ano, recolhendo todos os animais feridos ou mortos por atropelamento, além de verificar quais espécies passavam pelas telas e como o fazem. Nos túneis, foram instaladas armadilhas fotográficas, que disparam flashes e tiram fotos, quando os animais passam por elas. "Recolhemos, em um ano, cerca de 420 mamíferos, mais de 500 aves e também mais de 500 répteis. Só gato-do-mato-grande foram atropelados oito e lontras, seis. E, numa só tarde de outono, chegamos a recolher 84 cobras, só no trecho de 17km da Estação Ecológica", conta Alex Bager. "Os gatos e zorrilhos passam por cima da cerca e há animais que passam por baixo, pelos mata-burros ou mesmo por dentro das malhas da tela, como as cobras e lagartos. Os lagartos maiores, como o teiú, costumam ficar presos na tela, ao tentar passar". Segundo o pesquisador, as cercas funcionam bem apenas para capivaras e ratões-do-banhado. Já os túneis são usados por uma variedade grande de espécies, mas só quando os animais casualmente passam diante deles. Como estão distantes entre si, não têm a eficiência pretendida, o que significa que as cercas e a estrada funcionam mais como um fator de fragmentação das populações do que de proteção. "As populações dos dois lados da estrada não se misturam e, em alguns casos, como o das 4 espécies de tartarugas nativas, as cercas constituem uma barreira, que as separa do local ideal de nidificação", acrescenta Bager. É grande o número de tartarugas, que acaba pondo os ovos fora da área de nidificação, em locais muito úmidos, muito quentes ou muito frios. Ainda não se sabe o impacto da estrada sobre a eclosão dos ovos, mas, a longo prazo, os efeitos sobre estas populações podem ser consideráveis. No Taim, vivem tartarugas das espécies tigre-d´água, cágado-de-barbilhão, cágado-preto e cágado-do-pescoço-comprido. Quando conseguem varar a cerca e são atropeladas, elas são as espécies que mais sofrem. "Tartarugas são animais muito resistentes e podem levar muito tempo para morrer, mesmo com partes do corpo destruídas, sem condições de recuperação", observa o pesquisador. Os estudos devem prosseguir, sendo aprofundados em relação ao efeito de fragmentação da rodovia. Além de gerar as estatísticas e informações para tal aprofundamento, as carcaças dos animais recolhidos serão aproveitadas em estudos de genética de população e avaliação de dieta alimentar. Por enquanto, a sugestão de alteração do sistema de proteção à fauna é a retirada da cerca em toda a extensão da rodovia, mantendo apenas 200m de cada lado dos túneis, para dirigir os animais que estejam por ali. "No restante, valeria mais a pena instalar radares fotográficos - os chamados pardais - pois a diminuição da velocidade é a medida mais eficiente contra o atropelamento de animais", diz Bager. "Existe um pardal no trecho de rodovia dentro do Taim e ali é onde ocorrem menos acidentes, até 80% menos. Infelizmente a conservação está ligada ao bolso: só se reduz a taxa de atropelamento quando começa a doer no bolso dos motoristas".

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