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Reconstrução do Haiti pode levar cinco anos

Por Jeffrey D. Sachs
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THE WASHINGTON POSTO presidente americano, Barack Obama, declarou que os Estados Unidos não abandonarão o Haiti neste momento de agonia. Honrar esse compromisso seria a primeira vez para Washington. Para evitar o aprofundamento de uma espiral da morte, os EUA terão de agir de maneira diferente do que fizeram no passado. As instituições americanas de ajuda emergencial e desenvolvimento não funcionam bem, e acreditar em outra coisa seria condenar o pobre e moribundo Haiti à nossa própria mitologia. Tipicamente, uma tragédia como essa é seguida por promessas internacionais de bilhões de dólares, mas segue-se apenas um lento gotejar disso.O governo do Haiti, subjugado bem antes desse terremoto, não está em posição de pressionar 20 ou mais agências doadoras complexas para continuarem traçando projetos e desembolsando recursos. A operação de recuperação exige dinheiro no banco - num fundo de recuperação único, transparente, do Haiti constituído por diversos doadores sob observação internacional.O Haiti não precisa de uma rodada de promessas; precisa de uma conta bancária para financiar sua sobrevivência e reconstrução. O Banco Interamericano de Desenvolvimento seria uma instituição excelente; ele é bem gerido e altamente considerado, já opera como o maior financiador de desenvolvimento do Haiti e pode trazer parceiros de todo o globo. Como seria organizado um Fundo de Recuperação do Haiti? Ele devia receber desembolsos dos EUA e outros doadores; organizar um conselho que inclua membros indicados pelo presidente haitiano, René Préval, do secretário-geral da ONU e de doadores; e delegar poder a uma equipe de gestão para formular e executar planos aceitos pelo governo haitiano. O fundo de recuperação se concentraria primeiramente em restaurar os serviços básicos necessários para a sobrevivência. Nos próximos meses, suprimentos médicos de fora seriam armazenados e depois distribuídos na capital e no interior.Unidades cirúrgicas e instalações clínicas improvisadas serão fundamentais. Usinas de energia em barcaças ao largo da costa serão necessárias para fornecer eletricidade até que novas usinas sejam construídas. Os salários de funcionários públicos - especialmente professores, policiais, enfermeiras, trabalhadores e engenheiros da reconstrução - precisam ser assegurados, apesar do colapso total das receitas. A moeda do Haiti terá de ser lastreada por reservas internacionais para que a demanda por gastos públicos não produza uma inflação pavorosa.O Fundo de Recuperação do Haiti, junto com uma verba de rápido desembolso do Fundo Monetário Internacional, deve proporcionar as reservas necessárias e financiar o orçamento. O fundo deve ser constituído por cinco anos - um período adequado para responder a um desafio desse porte. A política eleitoral no Haiti deve ser suspensa por pelo menos um ano também. Este não é um momento para eleições nacionais; a sobrevivência do povo é o propósito principal da política. Quanto dinheiro precisará o fundo? E de onde ele virá? Eis uma estimativa precária. Antes do terremoto mas após os furacões, eu havia calculado uma necessidade de financiamento ao desenvolvimento urgente (e não atendida) de US$ 1,4 bilhão por ano para o Haiti, bem acima dos aproximadamente US$ 300 milhões que são desembolsados atualmente.Os custos básicos de reconstrução urgente somarão, talvez, outros US$ 5 bilhões a US$ 10 bilhões nos próximos anos. Pode-se imaginar desembolsos anuais de US$ 2 bilhões a US$ 3 bilhões por ano nos próximos cinco anos. Obama deveria buscar uma verba imediata de pelo menos US$ 1 bilhão neste ano e no próximo para o Fundo de Reconstrução do Haiti, e pedir que outros países e agências internacionais entrem com o resto, não com promessas, mas com dinheiro.A maneira óbvia para Washington cobrir esse novo financiamento é introduzindo impostos especiais sobre bônus de Wall Street, pagamentos absolutamente injustificados que serão anunciados nos próximos dias. O Haiti sofrerá uma morte rápida de fome e doenças se não agirmos, e os Estados Unidos sofrerão uma morte moral lenta e dolorosa se não respondermos à aflição extrema de nossos vizinhos, a quem negligenciamos por tanto tempo e, às vezes, até colocamos em situação perigosa. *Jeffrey D. Sachs é diretor do Earth Institute da Universidade de Columbia e autor de Common Wealth: Economics for a Crowded Planet

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