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STF tem recorde de ações de impeachment

Com crise política e tomada de decisões polêmicas, ministros viram alvo; em 2016 há disparada de processos, com 11 pedidos no Senado

Por Rodrigo Burgarelli e Guilherme Duarte
Atualização:

O número de pedidos de impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) atingiu em 2016 o recorde absoluto das últimas décadas. Até o início da crise política que levou à cassação da presidente Dilma Rousseff, esses pedidos eram raros: de 2000 a 2014, houve apenas cinco. Em 2015, dois pedidos foram protocolados no Senado. O número explodiu em 2016, quando houve 11 requerimentos para impedir seis ministros da Corte.

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O movimento pode ser visto como uma reação à atuação cada vez mais política que o STF tem adotado nos últimos anos, quando tomou decisões polêmicas envolvendo autoridades de outros Poderes – e muitas vezes em caráter liminar. De 2015 para cá, por exemplo, a Corte determinou o afastamento do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), proibiu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de assumir ministério no governo Dilma e chegou até a remover o atual presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de seu cargo de maneira monocrática, decisão que depois foi revista pelo plenário.

“A crise política fez com que a Corte tomasse decisão em casos polêmicos, desagradando aos lados da disputa política. E a presença de grupos cada vez mais atuantes e a facilidade de protocolar pedidos de impeachment levaram a esse aumento”, afirma o cientista político Rodrigo Martins, pesquisador da Universidade de São Paulo (USP).

Entre os ministros que foram alvo das ações no ano passado, o líder é Luís Roberto Barroso, com três pedidos de impedimento. Dois deles têm como base o mesmo fato: a decisão do STF em anular a votação secreta determinada por Cunha para criar a comissão de análise do impeachment de Dilma, no fim de 2015. Barroso foi o relator desse caso no plenário e, segundo os autores dos pedidos, “mentiu por omisso” ao não ler por completo um artigo do Regimento Interno da Câmara que, supostamente, garantiria a constitucionalidade da votação.

“O Supremo está muito ativista. Eles começaram a legislar e interferir nos outros Poderes”, diz o autor de um dos pedidos, Salim Rogério Bittar, de 62 anos. Ele é administrador de empresas em Goiânia e diz que passou a se interessar por política recentemente, após ver o forte impacto da crise econômica no mercado local. “Hoje participo dos movimentos de rua que pediram o impeachment da Dilma. Aí comecei a ler tudo, a me informar. E eu e um grupo de colegas vimos que, nesse caso, o Barroso praticamente inventou o regimento”, diz.

Em seguida, três ministros estão empatados com dois pedidos cada – Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli. No caso de Gilmar, seus dois processos são de autoria de juristas conhecidos – um deles é assinado pelo ex-procurador-geral da República Cláudio Lemos Fonteles e o outro pelo professor de Direito Administrativo da PUC-SP Celso Antônio Bandeira de Mello. 

Data venia 

Acusações. Fonteles e seus coautores acusam Gilmar de se manifestar sobre processos na imprensa, de uso de linguagem indecorosa, de participar de julgamento em casos em que devia ter se declarado suspeito e de envolvimento em atividade político-partidária ao oferecer, por exemplo, café da manhã para o atual presidente Michel Temer e para sua base aliada no Congresso enquanto o afastamento definitivo de Dilma ainda não havia sido determinado.

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Os outros dois alvos de pedido de impeachment no STF em 2016 foram Luiz Fux e Marco Aurélio. A acusação contra Fux foi formulada por um grupo de procuradores federais em maio do ano passado que acusam o ministro de ter mantido privilégios para o Judiciário por meio de uma liminar que manteve o pagamento de auxílio-moradia de até R$ 4 mil mensais para juízes de todo o País.

Dois dos procuradores que assinam a petição, Carlos Studart e Pablo Bezerra Luciano, embora reconheçam um crescente ativismo por parte do Supremo, discordam que a razão de sua petição tenha a ver com isso. Segundo eles, trata-se de uma reação ao corporativismo da Justiça. “Um ministro do STF não pode conceder uma liminar e passar mais de dois anos impedindo o plenário de apreciar sua decisão. Um ministro do STF não deve ter esse poder todo”, diz Studart. 

Regras. O rito do processo de impeachment de ministro do STF e do procurador-geral da República é definido pela Lei do Impeachment, de 1950, a mesma que estabelece as regras para o impedimento do presidente da República. A diferença, porém, é que no caso dos ministros e do PGR, apenas o Senado decide sobre o cabimento ou não dos pedidos, que podem ser escritos por qualquer cidadão. Nunca ocorreu um impeachment de membro do Supremo. 

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Em períodos autoritários, porém, ministros foram removidos por ato de outros Poderes. Em 1965, foram aposentados compulsoriamente pela ditadura militar os ministros Victor Nunes Leal, Hermes Lima e Evandro Lins e Silva.

Dos 11 pedidos de impeachment protocolados neste ano, a maioria foi rejeitada por decisão da Mesa, sem que nem sequer uma comissão de análise fosse eleita. Apenas três ainda tramitam: um pedido contra Toffoli, um contra Lewandowski e um contra Barroso, Rosa Weber e Edson Fachin. A reportagem procurou todos os ministros para se pronunciar sobre seus casos, mas a assessoria do STF informou que, em razão do recesso do Judiciário, não foi possível fazer contato com nenhum deles