
09 de setembro de 2011 | 20h13
26 de outubro
Primeira noite de núpcias.
Mas primeira noite de luto?
27 de outubro
- Você não conheceu o corpo da Mulher!
- Conheci o corpo de minha mãe doente, depois agonizante.
***
Toda manhã, por volta das seis e meia, lá fora no escuro, o ruído de ferragens das latas de lixo.
Ela dizia com alívio: a noite finalmente acabou (tinha sofrido durante a noite, sozinha, coisa atroz).
(...)
Todos calculam - eu o sinto - o grau de intensidade do luto. Mas é impossível (sinais irrisórios, contraditórios) medir quanto alguém está atingido.
29 de outubro
Ideia - assombrosa, mas não desoladora - de que ela não foi "tudo" para mim. Senão, eu não teria escrito uma obra. Desde que eu cuidava dela, há seis meses, efetivamente ela era "tudo" para mim, e esqueci completamente que havia escrito. Eu estava perdidamente por conta dela. Antes, ela se fazia transparente para que eu pudesse escrever.
***
Tomando estas notas, confio-me à banalidade que há em mim.
***
Os desejos que tive antes de sua morte (durante sua doença) agora não podem mais ser realizados, pois isso significaria que é sua morte que me permite realizá-los -- que sua morte poderia ser, em certo sentido, libertadora com relação a meus desejos. Mas sua morte mudou-me, já não desejo o que desejava.
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