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Usina de Belo Monte está funcionando sem plano de emergência, diz MPF

Órgão deu prazo de 24 horas para que a Norte Energia apresente o plano da barragem

Por Isabela Palhares
Atualização:

SÃO PAULO - Uma inspeção do Ministério Público Federal (MPF) e outras oito instituições nacionais e internacionais descobriu que a Usina de Belo Monte está funcionando sem um plano de emergência e sem que os monitoramentos semestrais exigidos pelo licenciamento ambiental sejam apresentados. O órgão deu um prazo de 24 horas para que a Norte Energia, dona da hidrelétrica, apresente o plano e os relatórios de monitoramento. Em nota, a Norte Energia diz que possui um plano de segurança, onde está contido o plano de ações emergenciais. 

Entre fevereiro e março, uma tonelada de peixes mortos foi retirada do local. Foto: Daniel Teixeira/Estadão - 22/3/2016

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Leonardo Pinho, presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão que também acompanhou a missão, diz que a usina não poderia funcionar sem o plano estar instalado e devidamente comunicado às comunidades do entorno.

"A lei determina que a barragem só poderia operar depois da apresentação do plano e deveriam ser feitas simulações anuais com a população, rotas de fuga, plano de evacuação, sirenes. Nada disso foi feito. Belo Monte está funcionando sem nenhuma previsão de contingência. Em Brumadinho, em que se perderam tantas vidas, havia tudo isso. Em Altamira, não há nada”, afirmou. 

A inspeção também descobriu que a empresa vem descumprindo o envio de relatórios de monitoramento dos programas ambientais de Belo Monte. De acordo com o licenciamento, os dados deveriam ser enviados para a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) a cada seis meses - os últimos três nunca foram enviados. Os monitoramentos devem mostrar o impacto da barragem sobre os peixes na Volta Grande do Xingu, por exemplo. 

A inspeção, feita nesta semana, visitou 25 comunidades e percorreu um trecho de 100 km do Rio Xingu, no Pará, que teve 80% de suas águas desviadas para a produção de energia elétrica. O MPF também denuncia que estão ocorrendo violações sistemáticas de direitos humanos no local. 

Segundo as entidades, a barragem da hidrelétrica estrangulou o rio, provocando a morte de peixes e prejudicando a navegabilidade dos moradores, que ficaram sem rotas para escoar produtos agrícolas. "A insegurança alimentar se tornou um fato cotidiano para todas as comunidades da Volta Grande". 

Os moradores relatam ainda falta de merenda escolar, remédios e médicos. O barramento do rio também dificulta o acesso à água potável porque seca os lençóis freáticos superficiais, o que em algumas comunidades, como a Ilha da Fazenda, beira uma situação de emergência. A Norte Energia já perfurou três poços para fornecimento de água na comunidade, uma das mais antigas da região do médio Xingu, e, mesmo assim, até hoje não foi capaz de garantir o abastecimento nas casas.

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“Eu passo a olhar o processo de instalação de Belo Monte como um processo genocida, um processo de expulsão das comunidades. Afirmo minha perplexidade e minha indignação com o que verificamos”, disse a procuradora da República Thais Santi, que coordenou a vistoria interinstitucional. 

Empresa diz possuir planos de segurança

Em nota, a Norte Energia declarou que Belo Monte possui Plano de Segurança de Barragens  e Plano de Ações Emergenciais (PAE). Segundo a empresa, em agosto de 2018, a Agência Nacional de Energia Elétrica constatou que o PAE é "objetivo e de ágil aplicação". "A empresa conta com um board de consultores independentes de segurança de barragens, de renome internacional, que acompanha e atesta as ações realizadas pela Usina. Há menos de um mês, consultores independentes que atuam na área de geotecnia e geologia inspecionaram estruturas do empreendimento, e também atestaram o bom desempenho, bem como a condição adequada de segurança dos barramentos", acrescentou.

Sobre o licenciamento ambiental, a Norte Energia disse que "já foram investidos mais de R$ 6 bilhões em ações de mitigação e compensação das interferências do empreendimento na região" e que "todos os relatórios consolidados dos monitoramentos que integram o Projeto Básico Ambiental (PBA) são protocolados no Ibama e estão disponíveis para consulta pública no site do órgão".

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A empresa disse ainda que "sempre esteve à disposição da Funai para prestação de informações e apoio às atividades de vistoria – inclusive tendo realizado reunião com a equipe do órgão indigenista em sua sede (junho/2018), para apresentação das ações em curso". A nota aponta ainda que "os estudos realizados junto aos moradores das comunidades ao longo do Rio Xingu demonstram que o consumo de pescado anual per capita estimado destas famílias (42 quilos), representa o dobro da média mundial (cerca de 20 quilos)", o que afastaria o argumento de insegurança alimentar.

Sobre a merenda escolar, remédios e médicos, a empresa disse que "há que se diferenciar, de forma clara e definitiva, o papel que cabe às instâncias de governo e a empreendedores privados no amparo à população". "Mesmo que quisesse ampliar o espectro de sua ação social, há limites para a atuação da empresa, cuja transposição fere o princípio da exclusividade de competência do poder público." Por fim, a Norte Energia disse atuar "pautada no desenvolvimento sustentável e com transparência nas ações socioambientais realizadas, reiterando, assim, o compromisso de respeito ao território, aos direitos humanos e à cultura das comunidades locais e dos povos indígenas."

 

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