22 de novembro de 2010 | 00h00
As declarações do papa ganharam as manchetes em todo o mundo, e alguns analistas chegaram a dizer que a Igreja Católica teria mudado repentinamente de posição em relação à contracepção e teria finalmente começado a entrar em sintonia com a sociedade moderna.
Mas uma leitura atenta dos trechos citados mostra que o papa não rompeu com ensinamentos passados, e sim analisou a questão usando uma lógica que data de São Tomas Aquino, do século 13. Ele conclui que, embora ainda seja errado, o uso da camisinha pode representar um mal menor em alguns casos.
Muitos teólogos católicos chegaram à mesma conclusão anos atrás, e alguns padres na África aconselham reservadamente o uso da camisinha quando esta representa uma alternativa à contaminação com o vírus do HIV, como por exemplo no caso de mulheres cujos maridos soropositivos desejam fazer sexo com elas.
Mas esta é a primeira vez em que um papa diz isso publicamente. A questão vem representando um campo minado para vários papas, e tentativas sucessivas de explicar as ideias da Igreja fracassaram, como o próprio Bento descobriu em visita à África no ano passado. Na época, ele causou ultraje internacional quando disse a jornalistas que camisinhas não devem ser usadas porque podem agravar a proliferação da aids.
Agora o papa buscou a ajuda de um jornalista católico em quem confia, o também alemão Peter Seewald - cuja longa entrevista com Bento compõe o livro -, para ajudá-lo a reformular o argumento de uma maneira que faça a doutrina da Igreja parecer menos fria e absoluta.
Para o jornalista católico britânico Austen Ivereigh, "o papa usou o formato informal de um livro-entrevista para assinalar algo que dá a impressão de ser uma grande mudança de postura, mas que não passa de uma expressão do óbvio".
Sem mudança quanto à contracepção no livro Luz do Mundo, Bento destaca que o uso da camisinha não é uma solução moralmente aceitável para combater a epidemia da aids porque, segundo ele, a camisinha pode converter o sexo de uma expressão de amor desinteressado em "uma espécie de droga". Ele afirma em seguida que o uso da camisinha pode se justificar em alguns casos, como o de um prostituto soropositivo que queira proteger sua parceira.
TOM HENEGHAN É EDITOR DE RELIGIÃO DA REUTERS
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