
14 de julho de 2011 | 13h12
LONDRES - O tabloide dominical britânico News of the World, o mais vendido do país, foi fechado no último domingo por seu controlador, o grupo News International, devido ao envolvimento do jornal em um escândalo de escutas telefônicas ilegais. Publicado pela primeira vez há 168 anos, o jornal, cuja tiragem chegava a 2,8 milhões de exemplares a cada domingo, gerou um debate nacional sobre ética jornalística.
A BBC preparou uma série de perguntas e respostas sobre o caso e os acontecimentos que levaram ao fechamento do tabloide.
Como o escândalo começou?
As acusações de que funcionários do News of the World estariam envolvidos em interceptação ilegal de telefones começaram a surgir em 2006. Em 2007, a Justiça condenou à prisão o correspondente do jornal para assuntos da realeza Clive Goodman e o investigador Glenn Mulcaire devido ao grampo ilegal de telefones de membros da família real.
A Polícia Metropolitana de Londres (Scotland Yard) iniciou uma nova investigação em janeiro de 2011, após alegações de que milhares de pessoas, entre elas atores, políticos, jogadores de futebol, apresentadores de TV e outras celebridades tiveram seus telefones interceptados ilegalmente.
Em abril deste ano, o tabloide admitiu publicamente pela primeira vez ter interceptado mensagens deixadas na caixa postal de celulares de pessoas envolvidas em casos acompanhados pelo jornal.
O caso ganhou contornos de escândalo no início de julho, com a denúncia de que um detetive que trabalhava para o jornal teria grampeado o telefone celular - inclusive apagando mensagens - de Milly Dowler, uma menina de 13 anos que desapareceu em 2002. A manipulação das mensagens, ainda em 2002, fez a polícia e a família da jovem acreditar que ela ainda estaria viva, já que a sua caixa postal continuava sendo "limpa". O corpo foi encontrado depois.
O escândalo afugentou anunciantes do grupo e derrubou as ações do conglomerado nas bolsas americanas e da Austrália. Diante da intensa pressão de políticos, da imprensa e da opinião pública, o dono da News International, o magnata Rupert Murdoch, desistiu na quarta-feira, 13 de julho, de seguir com seus planos de adquirir a totalidade das ações da operadora de TV por assinatura BSkyB, da qual seu grupo já possui 39%.
A diretora-executiva do grupo News International, Rebekah Brooks, foi convocada para comparecer ao Parlamento britânico na terça-feira, dia 19, para responder a perguntas sobre o escândalo. Brooks foi editora-chefe do News of the World em 2002 - à época das supostas escutas no telefone da menina Milly Dowler.
Rupert e seu filho James Murdoch, também foram convidados à comparecer à mesma sessão no Parlamento. No entanto, os dois já alegaram impedimentos para não ir na data - James alega que só estará disponível em 10 de agosto. Diante da negativa, uma comissão parlamentar convocou ambos para comparecer, mas, como Rupert e James são cidadãos americanos, não são obrigados a ir.
Em 8 de julho, o jornalista Andy Coulson, ex-editor-chefe do News of the World e ex-chefe de comunicações do primeiro-ministro David Cameron, foi detido.
Já no dia 14, o ex-editor executivo do News of the World Neil Wallis também foi detido em conexão com o escândalo dos grampos. Wallis foi preso e levado para interrogatório em Londres, sob suspeita de conspirar para interceptar comunicações.
Logo após a divulgação do caso de Milly Dowler, jornais britânicos afirmaram, que, em busca de histórias exclusivas, o News of the World fez escuta nos celulares de familiares de soldados britânicos mortos no Afeganistão e de vítimas de casos policiais explorados pelo tabloide. Parentes de vítimas dos atentados de julho de 2005 em Londres também teriam sido alvo dos grampos.
Segundo o jornal The Guardian, 3 mil pessoas foram vítimas de escutas ilegais do News of the World. Entre elas, estariam celebridades como o ator Hugh Grant e as atrizes Sienna Miller e Gwyneth Paltrow, além de esportistas e políticos.
De acordo com o Guardian, a família do brasileiro escreveu uma carta ao primeiro-ministro britânico pedindo para estender o inquérito a respeito dos grampos telefônicos. Os parentes do brasileiro querem descobrir se policiais envolvidos na investigação da morte de Jean Charles estavam vazando informações para a imprensa, fosse para obter benefícios financeiros, fosse para melhorar a imagem da Scotland Yard.
Telefones celulares vendidos na Grã-Bretanha vinham com uma senha de quatro dígitos (que geralmente era um número padrão, como 1234, 0000 ou 3333). Ao comprar os aparelhos, os consumidores deveriam trocar esta senha, mas poucos se davam ao trabalho de fazê-lo. Segundo as acusações, os repórteres de tabloides e detetives particulares simplesmente ligavam para o número da pessoa investigada. Se ninguém respondesse, a ligação caía na caixa de mensagens. Assim, bastava entrar com a senha padrão para acessar as mensagens.
Outra tática comum seria trocar a senha do telefone para impedir que outros jornalistas acessassem a caixa de mensagens.
O News of the World inicialmente negou qualquer infração, mas, em abril de 2011, acabou pedindo desculpas, depois de forte pressão de outros veículos de mídia e das vítimas das interceptações.
O tabloide, no entanto, não admite ter realizado grampos no celular da garota Milly Dowler, nem nos telefones de parentes de militares mortos no Afeganistão.
Famílias de militares mortos no Afeganistão se disseram indignadas com as alegações. Muitas já entraram na Justiça. Para Adrian Weale, representante do associação de militares Federação das Forças Armadas Britânicas, "esta é uma situação lamentável, se de fato ocorreu".
Celebridades também já processaram o jornal. Uma delas foi a atriz Sienna Miller, que recebeu uma indenização de 100 mil libras (R$ 248 mil).
O jornal também foi condenado pelo coronel Richard Kemp, ex-comandante das forças britânicas no Afeganistão, que disse que as acusações o deixaram "absolutamente sem palavras e com raiva".
A Scotland Yard reabriu as investigações sobre as escutas do News of The World em janeiro passado, após o vazamento de alguns casos. Quatro e-mails que supostamente davam indícios do esquema foram encontrados pelos investigadores. Imediatamente, o News of the World afastou um de seus editores-assistentes, Ian Edmondson.
As mesmas suspeitas já haviam sido investigadas entre 2006 e 2009, sem que a polícia chegasse a conclusões, o que foi objeto de críticas de jornais como o Guardian. Na época, apenas Clive Goodman e Glenn Mulcaire foram presos. Rebekah Brooks também está no centro da polêmica. Ela tem o apoio de Rupert Murdoch, que já disse que não irá afastá-la do cargo, apesar da pressão da mídia.
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