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Despreparo que penaliza os jovens

O divórcio entre a educação e o mundo do trabalho é um erro que custa caro. O Brasil tem o dever de investir na formação profissionalizante da juventude, a maior vítima do desemprego

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Por Notas & Informações
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A falta de experiência profissional já é um desafio para quem tenta ingressar ou está começando no mercado de trabalho. Para milhões de jovens no Brasil, porém, há obstáculos muito maiores, e é preciso agir logo para reverter esse quadro − sob pena de que uma parcela significativa da juventude continue condenada a engrossar as estatísticas do desemprego ou a depender de programas assistenciais para sobreviver. Não bastassem as deficiências da educação básica, que tanto deixa a desejar, o País falha na oferta de ensino técnico e profissionalizante, seja por oferecer vagas em número inferior à demanda ou, não raro, por ignorar as profundas transformações que vêm remodelando a economia e o mercado de trabalho.

Um diagnóstico desse desarranjo, motivo de tantos prejuízos, acaba de ser lançado − e deveria ser lido com atenção pelas autoridades responsáveis pela Educação Profissional e Tecnológica (EPT). Trata-se da pesquisa O futuro do mundo do trabalho para as juventudes brasileiras, elaborada pelo Instituto Cíclica, em parceria com o Instituto Veredas e apoio do Itaú Educação e Trabalho, da Fundação Roberto Marinho e da Fundação Telefônica Vivo, entre outras entidades.

Infelizmente, o ponto de partida é o atual cenário em que a taxa de desemprego na faixa de 18 a 24 anos corresponde a mais que o dobro da média geral do País. Outro dado grave diz respeito à chamada geração “nem-nem”, formada por quem não trabalha nem estuda − situação de um a cada quatro jovens de 18 a 29 anos. É desolador, para dizer o mínimo, perceber a falta de perspectivas em que um contingente tão expressivo da juventude brasileira está mergulhado. Vale indagar: aonde o País espera chegar abrindo mão do potencial de tamanha quantidade de jovens?

A pesquisa ouviu 34 organizações da sociedade civil envolvidas com a inclusão produtiva de jovens, além de revisar mais de 500 publicações sobre o tema. Os resultados reforçam o “divórcio entre educação e trabalho”, na acertada expressão da superintendente do Itaú Educação e Trabalho, Ana Inoue, em entrevista ao Valor. Para 82% das organizações, os empregadores não encontram jovens com a devida qualificação para as vagas de trabalho anunciadas; para 77%, os jovens estão mal informados sobre o funcionamento do mundo do trabalho e sobre as carreiras do futuro; para 59%, os cursos de formação profissional não são atualizados nem estão em sintonia com o mundo do trabalho.

O estudo chama a atenção para o impacto da digitalização da economia, que cada vez mais substitui postos de trabalho, especialmente em funções que exigem menor qualificação. Um gargalo que se estreita, portanto, para a maior parte da juventude, considerando que cerca de dois terços dos jovens que conseguem seu primeiro emprego ganham até um salário mínimo. Eis outro aspecto que merece atenção das autoridades educacionais. Claro está que não basta apenas expandir os cursos técnicos e profissionalizantes: é preciso repensá-los à luz das novas tecnologias. A digitalização e as inovações tecnológicas, como se sabe, também criam oportunidades, a começar pelo setor de tecnologia da informação (TI) − no qual, aliás, é comum faltar mão de obra especializada.

Nesse sentido, o estudo lista carreiras consideradas promissoras para a inclusão profissional de jovens − e defende que os cursos de EPT sejam expandidos também para atender quem já concluiu o ensino médio. A chamada economia verde, por exemplo, demanda profissionais para a instalação de equipamentos de energia solar, para a manutenção de turbinas eólicas e para o processamento de biocombustíveis. No caso da economia digital, um dos nichos é o de operador de drones. Já o envelhecimento da população faz crescer a procura por cuidadores de idosos.

A menos que o Brasil tenha compromisso com o atraso, é preciso qualificar a formação da atual e das novas gerações. Criar condições para que um número cada vez maior de jovens conquiste empregos e ajude o País a crescer. O divórcio entre a educação e o mundo do trabalho não interessa a ninguém.