O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, acredita que a inflação esteja “relativamente” dentro da normalidade brasileira desde o Plano Real, em 1994. “O Brasil deixou de ter uma inflação de dois dígitos. Hoje, tem inflação entre 4% e 5%, relativamente dentro da normalidade desde que o real foi implementado”, afirmou, ao participar de um painel na conferência do Fundo Monetário Internacional (FMI) na Arábia Saudita.
Qualquer cidadão com mais de 40 anos tem memória vívida dos anos de hiperinflação. Felizmente, o País deixou para trás um período em que havia remarcações diárias de itens de supermercados, seguidas por troca de moedas, confiscos, congelamentos e tabelamentos, iniciativas tão conhecidas quanto fracassadas para controlar os preços. A hiperinflação deixou traumas profundos na sociedade brasileira, e não foi por acaso que o ministro da Fazenda que lançou um plano capaz de debelá-la foi eleito e reeleito presidente da República na década de 1990. A população estava cansada de tanto amadorismo e, no momento em que conheceu a estabilidade econômica, passou a defendê-la como um valor a ser preservado.
Dito isso, não se pode dizer que a inflação esteja dentro da normalidade quando o índice está acima da meta de 3%. Meta, como se sabe, é para ser cumprida, e os limites inferior e superior servem para acomodar choques. Em janeiro, o IPCA acumulado nos 12 meses ficou em 4,56%, mas o índice teria chegado a 5,13% não fosse o bônus nas contas de luz da energia gerada pela usina de Itaipu – uma contribuição que, aliás, não se repetirá em fevereiro.
Ademais, o IPCA espelha uma cesta de consumo média da população, mas há muitos itens que subiram bem mais e que pesam no bolso das famílias mais carentes, entre eles alimentos. Não parece ser mera coincidência, portanto, que a popularidade do presidente Lula da Silva tenha atingido o pior nível de seus três mandatos e caído mais entre mulheres e habitantes do Nordeste.
Inflação nunca é algo a ser relativizado, mas é especialmente preocupante quando é o ministro da Fazenda quem o faz. O gasto público excessivo é um motor que estimula a economia e aquece a demanda, e o governo, quando se recusa a fazer sua parte por meio de uma política fiscal mais austera, deixa toda a responsabilidade de conter a inflação para o Banco Central.
A atual taxa básica de juros, em 13,25% ao ano, é reflexo disso, e nada indica que o cenário deva melhorar no curto e médio prazos. Mesmo com a perspectiva de que o Copom eleve a Selic a 14,25% ao ano em março, a mediana das expectativas para o IPCA deste ano subiu pela 18.ª semana consecutiva, para 5,60%, segundo o Boletim Focus.
Com a experiência de quem coordenou o Índice de Preços ao Consumidor da Fipe por 26 anos, o economista Heron do Carmo disse ao Estadão que projeta uma inflação de 5,5% neste ano. Mas a previsão dele depende da adoção de medidas adicionais de controle do gasto público, já descartadas pelo presidente. Nada, portanto, parece relativamente dentro da normalidade, a não ser a displicência com que governos petistas lidam com a inflação.