Opinião | A transparência necessária dos gastos públicos

Além de mitigar o risco de expropriação, a transparência permite que o desempenho dos administradores públicos seja avaliado

Por Fernando Dal-Ri Murcia

Os políticos e os gestores possuem responsabilidade de utilizar de forma eficiente os recursos públicos, sempre no melhor interesse da população. Afinal, como eles administram recursos de terceiros, têm o dever fiduciário de prestar contas (accountability) e também o dever de lealdade.

Acontece que, como todos os seres humanos, possuem seus próprios incentivos econômicos, que, por vezes, podem ser conflitantes com os interesses da população. Do mesmo modo, as leis e os contratos em geral são incompletos, não sendo possível especificar todas as ações que devem ser tomadas pelos agentes em razão da incerteza sobre o futuro.

Nesse contexto, a transparência dos gastos e do Orçamento público é fundamental para mitigar dois problemas relevantes: o risco moral e a seleção adversa.

Note-se que a transparência funciona como importante mecanismo de controle. Isso porque ela torna as ações dos agentes visíveis para a população. A literatura evidencia que, quando os agentes são “forçados” a prestar contas, eles estão menos propensos a “expropriar” a população. Note-se que o risco moral pode se manifestar por meio de várias formas, dentre elas a fraude, o uso de recursos para projetos de interesse pessoal, a assunção de riscos desproporcionais, etc.

Além de mitigar o risco de expropriação, a transparência permite que o desempenho dos administradores públicos seja avaliado, examinado. Com mais e melhores informações, os diversos stakeholders e a população como um todo conseguem verificar a eficiência dos gestores de modo a premiar – através do voto, por exemplo – aqueles com melhor performance e/ou substituir aqueles com desempenho inadequado.

Por outro lado, sem transparência, a população não consegue separar “o joio do trigo”, o “bom” do “mau” político. De fato – conforme bem documentado pelo professor George Akerlof em seu trabalho seminal intitulado The Market for Lemons –, o eleitor tenderá a atribuir uma avaliação média para o desempenho dos agentes, que invariavelmente levará bons políticos e gestores a deixarem suas funções públicas, sobrando no final apenas os “ruins”. Em outras palavras, a falta de transparência implica o fenômeno da seleção adversa, gerando diversos malefícios para a população.

Em suma: o funcionamento eficiente da máquina pública depende, invariavelmente, da transparência sobre as ações dos gestores e políticos. A divulgação ampla e completa, o chamado full and fair disclosure, tanto das receitas, mas principalmente dos gastos públicos, é fundamental e irá permitir, neste momento, um debate racional sobre as escolhas e os melhores caminhos para o País.

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PROFESSOR DA FEA-USP

Opinião por Fernando Dal-Ri Murcia

Professor da FEA-USP