A queda no desmatamento da Amazônia anunciada pela ministra Marina Silva estende um tapete vermelho para a delegação brasileira na COP 28, que ocorre em dezembro em Dubai. Foram 133 milhões de toneladas de carbono equivalente que o Brasil deixou de emitir apenas com a queda no desmatamento da Amazônia – o que reforça a importância de preservarmos esse bioma para o alcance de nossas metas climáticas. A prosseguir nesse ritmo, o Brasil terá plenas condições de apresentar metas de redução das emissões ainda mais ambiciosas e alinhadas com o desafio de manter o aumento da temperatura média do planeta dentro do limite de 1,5 grau Celsius.
Os efeitos iniciais do fenômeno El Niño deste ano têm nos forçado a experimentar o que significa um mundo mais quente. No campo, os produtores sabem exatamente como cada décimo de grau faz diferença, pois poucas atividades econômicas são tão dependentes do clima como a agropecuária.
Junto com a redução das emissões, o Brasil e o mundo precisam avançar em medidas de adaptação, como a ampliação do plantio de árvores integradas com agricultura e pastagens, o desenvolvimento de sementes mais resistentes a secas e a maior disseminação de técnicas de manejo de solo que reduzam a erosão e as emissões decorrentes da movimentação da terra.
Na pecuária – e em todas as atividades que emitem metano – há oportunidades de ganhos no curto prazo, tão necessários para reverter a curva das emissões. Sem falar na necessidade de amplificar a escala da restauração de ecossistemas para recuperar a vegetação nativa, especialmente nas áreas de preservação permanente – margens de rios e nascentes, encostas e topos de morros – e nas áreas de Reserva Legal.
Neste contexto, as informações atualizadas sobre a taxa de desmatamento na Amazônia trazem duas boas notícias e uma muito preocupante. A primeira boa notícia é a efetiva queda nos índices de desmatamento na Amazônia: 22,3%, em relação aos 12 meses anteriores. A redução foi observada, inclusive, em Estados onde este índice avançou nos últimos anos – caso, entre outros, do Amazonas (que registrou agora uma queda de 40% no desmate) e de Rondônia (42%). Dos Estados da Amazônia Legal, o único que apresentou aumento foi Mato Grosso, de 9%, o que demanda uma atenção especial, para compreender quais vetores estão contribuindo para essa situação.
A segunda boa notícia é que os números comprovam que a redução na taxa de desmatamento não se deu de maneira aleatória. Os dados indicam que a queda da devastação da floresta é consequência de um conjunto de ações que vêm sendo tomadas pelos governos federal e estaduais. Prova disso é que a redução do desmatamento foi maior do que a média nos 70 municípios do bioma onde as taxas eram mais altas e que concentraram mais de 73% de toda a perda da cobertura vegetal do bioma no período anterior. Há, portanto, uma operação articulada e bem-sucedida em curso, seguindo uma acertada estratégia de priorizar as regiões onde o problema era mais agudo.
Além disso, o cancelamento de inscrições no Cadastro Ambiental Rural (CAR) em terras indígenas e em florestas públicas não destinadas tem sido uma medida fundamental para mostrar a força do comando e do controle. Outras ações, tão efetivas quanto essas, também foram adotadas, a exemplo do aumento do embargo de áreas com desmatamento, a destruição de maquinários utilizados em crimes ambientais, a apreensão de gado em terras indígenas, além da desintrusão de garimpeiros e outros invasores. Todas são medidas que estão surtindo efeito.
No entanto, a terceira notícia dada por Marina Silva é muito preocupante. Tem relação com o desmatamento e a degradação florestal acumulados ao longo dos últimos anos, o que deixa essas áreas ainda mais vulneráveis às queimadas. Para agravar o quadro, temos a perspectiva de um super El Niño em 2024. Essa combinação de fatores aumenta em muito a vulnerabilidade da Amazônia, especialmente aos incêndios.
A situação que vimos há alguns dias em Santarém e em Manaus, quando uma onda de fumaça cobriu as duas cidades e tornou o ar irrespirável, pode se repetir e, infelizmente, ser ainda mais comum no ano que vem. Para evitar esse cenário e preparar-se melhor para lidar com os efeitos do El Niño, o governo precisa reforçar sua articulação com os Estados e também com os municípios, para enfrentar a situação de forma incisiva e, sobretudo, coordenada.
Já tivemos provas suficientes com as condições climáticas deste ano: o recado da natureza foi claro e não deixa dúvidas. Precisamos persistir na meta do desmatamento zero e alavancar todos os esforços possíveis para restaurar as áreas críticas. Há mais de 11 anos o Brasil tem um marco legal que prevê as obrigações, as responsabilidades e também os incentivos para essas ações. Trata-se da Lei de Proteção da Vegetação Nativa, mais conhecida como Código Florestal. Da sua efetiva implementação resultarão nossa resiliência climática, segurança hídrica e oportunidades de trabalho, renda e empreendedorismo com base na bioeconomia.
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ENGENHEIRO FLORESTAL, É MEMBRO DA COALIZÃO BRASIL E DIRETOR DE FLORESTAS E POLÍTICAS PÚBLICAS DA BVRio