O governo federal, entre ecos de populismo tributário, apresentou proposta para isentar o Imposto de Renda sobre ganhos mensais até R$ 5 mil, criando medida compensatória de majoração fiscal sobre aleatória alta renda ou super-ricos, que, segundo termos apresentados, seriam aqueles com ganhos acima de R$ 50 mil por mês. Contraditoriamente, quando da reunião do G-20, ocorrida em outra fase da Lua, o governo brasileiro havia defendido a taxação sobre riquezas acima de US$ 1 bilhão; agora, para o botim fiscal de ocasião, bastam, a câmbio presente, menos de US$ 10 mil mensais. Ou seja, resta claro que o interesse inconteste é só, e somente só, aumentar a arrecadação do erário, jogando, com tons soviéticos, a conta no colo dos tidos privilegiados da exploração capitalista.
No mundo real, o mérito governamental deveria ter sido outro: a exposição de um planejamento sério e criterioso para contenção e redução da despesa pública, fechando-se a torneira da expansão monetária irrefreada de forma a atenuar a pressão inflacionária para, ato contínuo, possibilitar a queda dos juros oficiais. O problema é que o Planalto, ao invés de cumprir seu dever e enfrentar a grave sangria dos cofres públicos, prefere o negacionismo econômico e irresponsabilidade fiscal como procedimento, culpando infantilmente o mercado, quando o silêncio lhe traria o benefício da dúvida ante a estupidez assumida.
Ora, é lição antiga que todo e qualquer tributo representa uma ingerência do Estado sobre a “propriedade privada”, direito fundamental do cidadão, nos termos do artigo 5.°, inciso XXII, da Constituição federal. Logo, para ser constitucional, a exigência tributária, antes de atender a apetites ou caprichos do governante de plantão, deve ser tecnicamente ancorada em argumentos de fato e juridicamente objetivos, impedindo-se a subversão da ordem tributária em favor da incompetência política. Tanto é verdade que a lei fundamental determinou a “eficiência” como princípio cogente da administração pública (artigo 37), impondo aos governantes o dever de economia e redução de custos, controle de desperdícios, aumento de produtividade, avaliação contínua, aprimoramento qualitativo dos serviços prestados e, fundamentalmente, absoluta decência no uso e manejo do dinheiro do povo.
Sem rodeios, a ineficiência estatal é causa direta da inconstitucionalidade arrecadatória. Sim, o governo ineficiente é intrinsecamente inconstitucional, não dispondo de autoridade formal ou material para aumentar tributos enquanto sua ineficiência perdurar. Pergunta-se, então: será o governo brasileiro um exemplo primoroso de eficiência administrativa de modo a justificar eventual aumento fiscal para ampliação de seus projetos políticos? Ou será a máquina pública obesa, com inúmeros cabides de empregos em uma Esplanada ministerial ao vento, com empresas públicas deficitárias, sem critérios de mérito, produtividade ou avaliação parametrizada das entregas disponíveis aos cidadãos, entremeados por casos de corrupção, práticas nebulosas e ambientes hostis à transparência, integridade e legalidade dos atos públicos?
Alheio a polêmicas inúteis, até mesmo um frade de pedra irá dizer que as ineficiências brasileiras são de fazer corar. Por conseguinte, enquanto não resolvermos a gritante incompetência política que macula a gestão pública nacional, toda e qualquer proposta ou projeto de majoração tributária é – e será – abertamente inconstitucional. É hora, portanto, da sociedade brasileira reagir. Não podemos mais aceitar o uso e abuso do recurso fácil ao aumento tributário sempre que o governo gasta mais do que pode. Em uma democracia digna, o povo é titular de direitos fundamentais, e não farrapo da ineficiência estatal patológica. Aliás, enquanto a propriedade privada for saqueada por tributos injustos, antes de dinheiro a governos perdulários estaremos promovendo o desmonte constitucional no Brasil, subjugando-se a lei à opressão tributária.
Por tudo, não se ignora o cabimento de um debate sério e detido sobre o melhor realizar da progressividade na tributação da renda no País. Todavia, para ser sério e detido, tal debate não pode ser fruto de um demagógico populismo arrecadatório, promovido por governos ineficientes, através de expedientes legislativos de última hora. Se o Planalto é incapaz de cumprir seus deveres e promover o necessário ajuste nas contas públicas, não venha jogar o rojão da sua incompetência no colo do contribuinte nem propor leis fajutas para falsos fins. Isso porque não será tributando mais que faremos um país melhor. O que faz o sucesso de uma nação é a gestão eficiente dos recursos tributários e os justos incentivos de progresso promovidos pela ação política responsável. Do contrário, tributaremos os ricos até deixá-los pobres, destruindo o sistema econômico em favor de uma aristocracia estatal intocável.
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ADVOGADO, É CHAIRMAN DO INSTITUTO MILLENIUM