A COP-29 terminou com uma nova meta de financiamento climático considerada bem abaixo do necessário para o mundo em desenvolvimento enfrentar as necessidades de mitigação e adaptação. Sob o risco de um não acordo, a conferência bateu o martelo no compromisso de US$ 300 bilhões anuais até 2035, substituindo a meta anterior de US$ 100 bilhões por ano. O valor está totalmente desconectado das necessidades de investimento das economias em desenvolvimento e emergentes diante da crise climática.
Para conter a frustração de expectativas e pavimentar o caminho das negociações subsequentes, foi lançado o “Roteiro de Baku a Belém para US$ 1,3 trilhão”. A ideia é ampliar o financiamento climático para ao menos US$ 1,3 trilhão por ano até 2035 com a participação ampla de atores não estatais.
Essa artimanha, no entanto, acaba por transferir um desafio adicional para a presidência brasileira, em 2025. Como a COP-30 será palco da nova rodada de planos climáticos (as NDCs 3.0), é importante não só catalisar ambição climática, mas também buscar soluções de financiamento por diferentes atores, incluindo o setor privado.
Nesse contexto, os países precisam garantir apoio através de planos de financiamento que traduzam as metas climáticas em um mapa de investimentos construído com as partes envolvidas. E, embora todos possam se beneficiar de tais planos, eles são mais críticos para nações com espaço fiscal reduzido.
Assumindo a NDC de um país como ponto de partida, um plano de financiamento define as necessidades e lacunas de investimento de curto e médio prazos, numa abordagem integrada da economia. Assim, apoia a construção das políticas para acionar esses investimentos, identificando o papel dos atores públicos, privados e internacionais.
Os mecanismos de plataforma-país são um exemplo dessa orquestração. Fornecem um espaço institucional de domínio doméstico que pode reunir ampla gama de atores – formuladores de políticas públicas, setor privado, investidores internacionais e especialistas – e podem gerar um processo supervisionado pelo governo nacional para desenvolver tais planos.
Contudo, os governos não terão sucesso se estiverem sozinhos. A luta contra a mudança climática depende intrinsecamente do setor privado. A fase de implementação do Acordo de Paris precisa mais do que nunca da ação concreta de empresas e instituições financeiras. Isso exige que o setor privado implemente planos de transição alinhados às NDCs de seus países, que, por sua vez, devem estar alinhadas em limitar o aquecimento global em 1,5°C. Sem essa aliança entre governos e a iniciativa privada, há o risco de as NDCs permanecerem como metas pretensamente ambiciosas, mas que não podem ser financiadas nem implementadas.
O Brasil se destacou pelas consultas que liderou com o setor privado para desenvolver sua nova NDC, lançada na COP-29. A trilha para Belém (COP-30) já começou e é hora de estabelecer as sinergias certas entre as esferas pública e privada. Formuladores de políticas públicas e financiadores precisam criar o arcabouço adequado para avançar com os planos de transição das empresas.
É inegável que o legado brasileiro na COP-30 estará associado ao impacto das novas NDCs e elas só serão realmente impactantes se resultarem em ações na economia real. É vital ajustar despesas de capital de baixo carbono das companhias à meta de 1,5°C, reduzir a produção de combustíveis fósseis – não só a demanda – e cortar laços com associações comerciais não alinhadas ao clima.
O Brasil já apresentou políticas para incentivar os planos de transição das empresas. Sua plataforma-país (BIP) busca catalisar o financiamento público e privado para avançar nesse processo. No entanto, ainda são necessários estímulos para acelerar o financiamento da transição, apoiar a ação do setor privado e dar suporte à ampliação da legislação net zero.
Nesse sentido, adotar planos de transição não deve ser visto como mera atividade de reporte ou obrigação. Se bem desenhados, podem ser um guia para que as companhias atinjam novos mercados de baixo carbono, reduzam riscos e acessem linhas de crédito.
O Brasil precisa começar já a exercer sua liderança nessa arena. A partir dos resultados de sua presidência do G-20 é possível trabalhar com outros governos estabelecendo a conexão entre planos de transição nacionais e privados. Só assim garantirá que não haja inconsistência entre as metas políticas nas NDCs e sua implementação pelas empresas.
Ao criar esse vínculo, é fundamental não apenas buscar financiamento internacional, mas explorar o financiamento doméstico, frequentemente subutilizado. O País estabeleceu um precedente ao publicar sua NDC na COP-29 e ao assumir a liderança na presidência do G-20. É hora de fortalecer esses compromissos, realizar os acordos políticos necessários e transformá-los em ação antes da COP-30. Traduzir as NDCs em mapas de investimentos, vinculando-os aos planos de transição do setor privado, é parte essencial da solução.
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SÃO, RESPECTIVAMENTE, ESPECIALISTA EM MUDANÇAS CLIMÁTICAS DO CEBRI, PESQUISADORA DA COPPE; LÍDER EM POLÍTICAS CLIMÁTICAS DA WORLD BENCHMARK ALLIANCE (WBA); GERENTE DE DESCARBONIZAÇÃO E TRANSIÇÃO JUSTA DA WBA; E ESPECIALISTA EM CLIMA E SUSTENTABILIDADE DO INSTITUTE FOR CLIMATE ECONOMICS (14CE)